Data: 2006-02-08
Número: 50/2006
Responsáveis: Maria José Castanheira Neves
O regime de realização de despesas públicas e de contratação pública relativa à locação de bens e aquisição de bens e serviços e empreitadas de obras públicas encontra-se estatuído, respectivamente, no decreto-lei n º 197/99, de 8/06, e no decreto-lei n º 59/99, de 2/03.
A estes procedimentos adjudicatórios aplicam-se os princípios gerais do Código do Procedimento Administrativo, dado que o artigo 2º do CPA – artigo que define o âmbito de aplicação deste Código – prescreve que as suas disposições são aplicáveis a todos os órgãos da administração pública que, no desempenho da actividade administrativa de gestão pública, estabeleçam relações com os particulares, e, em seguida, integra na lista enumerativa destes órgãos, os órgãos das autarquias locais e suas associações e federações.
Sendo, assim, inequívoco que o capítulo do CPA que trata dos princípios gerais se aplica também aos procedimentos adjudicatórios das autarquias locais não, é menos certo que alguns deles assumem, no entanto, uma posição qualificada dado que se trata de princípios estruturantes da relação jurídica procedimental. (1)
A actual lei que regula o regime de despesas e de aquisição de bens e serviços – transpõe esses princípios estruturantes para o seu articulado, adaptando-os aos procedimentos contratuais e à execução contratual, e acrescenta outros princípios que lhes são consequentes e que com eles estão intrinsecamente conexionados. O mesmo diploma torna extensiva a aplicação destes princípios ao regime da contratação de empreitadas de obras públicas.
Ora, um desses princípios é o princípio da legalidade que se encontra simultaneamente estabelecido no artigo 3 º do CPA e adaptado aos procedimentos contratuais pelo artigo 7º do decreto-lei nº 197/99, de 8/06.
É a seguinte a redacção deste artigo 7 º do decreto-lei n º 197/99, de 8/06:
« Na formação e execução dos contratos, as entidades públicas e privadas devem observar as regras e princípios previstos no presente diploma, não podendo, designadamente, ser adoptados procedimentos diferentes dos nele tipificados, excepto quando previstos na lei. »
Exige-se, assim, uma conformidade e não apenas uma mera compatibilidade na actuação da administração pública perante as normas contidas neste diploma.
« Reforçam-se, neste domínio, as teses doutrinárias que entendem que o conceito do princípio da legalidade constante do CPA aponta para o sentido de se entender este princípio « nos quadros da conformidade » e não nos da compatibilidade. (2)
A corrente doutrinária que defende a tese da conformidade baseia-se no artigo 3º do CPA, dado estar lá referido que « por um lado essa actuação se realiza em obediência à lei e , sobretudo, está lá dito claramente que ela se confina nos limites dos poderes que lhe são atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos», (3) ou seja, segundo os autores citados, não só haverá uma conformidade da actuação administrativa em relação ás normas de competência e de fins mas também quanto à forma e conteúdo dos poderes atribuídos.
Esta concepção do princípio da legalidade na sua vertente de conformidade está reforçada em matéria de procedimentos adjudicatórios, dado a lei prescrever que não podem ser adoptados procedimentos diversos dos tipificados na lei, excepto quando ela própria o admita. » (4)
Assim sendo, tendo que existir conformidade na actuação dos órgãos autárquicos no que respeita às normas de competências, fins, forma e conteúdo dos poderes atribuídos, e dado que o pedido de parecer respeita às normas de competência dos órgãos autárquicos em matéria de procedimentos adjudicatórios, há que mencionar quais são e informar que, de acordo com este princípio da legalidade, os órgãos autárquicos não têm qualquer liberdade neste domínio mas, muito pelo contrário, estão obrigados a agir na estrita conformidade da lei.
O artigo 64 º, n º 1, alínea q) prescreve que compete à Câmara Municipal aprovar os projectos, programas de concursos, cadernos de encargos e a adjudicação relativamente a obras e aquisição de serviços; o artigo 68 º, n º 1, alínea f) estabelece que compete ao presidente da câmara aprovar projectos, programas de concursos e adjudicação e a alínea g) do mesmo preceito autorizar a realização de despesas orçamentadas até ao limite estipulado por lei ou por delegação da câmara municipal.
Ora, as normas que estabelecem a competência dos órgãos autárquicos em matéria de autorização de despesas são, por sua vez, as que determinam a competência para escolher previamente o tipo de procedimento ( n 1 do artigo 79 º do decreto-lei n º 179/97- aplicável às empreitadas de obras públicas, dado o disposto na alínea a), do n º 1 do artigo 4 º do decreto-lei n º 197/99, de 8 de Junho ) e para adjudicar, artigo 54 º do decreto-lei n º 197/99, aplicável às empreitadas de obras públicas pelo artigo 273 º do decreto-lei n º 59/99, de 2 de Março.
São competentes para autorizar despesas com locação e aquisição de bens e serviços e com empreitadas de obras públicas as seguintes entidades:
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Até 149.639,37 €, os presidentes de câmara ( e os conselhos de administração dos serviços municipalizados );
-
Sem limite, as câmaras municipais, as juntas de freguesia, o conselho de administração das associações de autarquias locais e o órgão executivo de entidades equiparadas a autarquias locais.
As câmaras municipais e as juntas de freguesia podem autorizar a realização de obras ou reparações por administração directa até, respectivamente, 149.639,37 € e 49.879,79 € , podendo estes valores ser aumentados pelas respectivas assembleias deliberativas.
As competências atribuídas às câmaras municipais podem ser delegadas nos conselhos de administração dos serviços municipalizados, no âmbito das respectivas atribuições.
As competências atribuídas às câmaras municipais, às juntas de freguesia e aos conselhos de administração dos serviços municipalizados podem ser delegadas nos seus presidentes até 748.196,85 €, 99.759,58 € e 249 398,95 ( esta última delegação no presidente dos serviços municipalizados é um manifesto lapso, visto que é inferior a delegação que a câmara pode efectuar no próprio conselho de administração destes serviços ) respectivamente.
Pode, também, ser delegada nos dirigentes municipais a competência para autorizar despesas até 49.879,79 €.
Em conclusão, a competência para a abertura dos procedimentos e para a sua adjudicação pertence ao órgão que tem competência para autorizar a respectiva despesa, de acordo com os artigos 18 º e artigo 29 º do decreto-lei n º 197/99, de 8 de Junho.
A Câmara Municipal é incompetente para abertura dos procedimentos e para a sua adjudicação com a locação e aquisição de bens e serviços e com empreitadas de obras públicas até 149.639,37 €, pertencendo essa competência originária ao Presidente da Câmara.
(1) Mário Esteves de Oliveira, Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e Outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa- das fontes às garantias, Coimbra, Almedina, 1998. (2) Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2001. (3) Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, ob. cit. , pag. 89. (4) Maria José L. Castanheira Neves, Governo e Administração Local, Coimbra Editora, 2004, pag. 245 e sgts.
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