Lei das Empresas Locais: Lei nº 50/2012, de 31/08
Data: terça, 27 novembro 2012
Número: DSAJAL 280/12
Responsáveis: Maria José Castanheira Neves (Directora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local)
Directora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local
Em referência às questões remetidas nos ofícios n º s …, de …, e …, de …, relativas a questões sobre a interpretação de normativos da lei n º 50/2012, de 31/08, regime jurídico da atividade empresarial local, temos a informar:
1. e 2. Questionam-nos nas perguntas 1 e 2 sobre quem constitui a assembleia geral no caso de uma sociedade unipessoal e quem pode ser membro do órgão executivo.
De acordo com o n º 2 do artigo 26 º da lei n º 50/2012 compete ao órgão executivo da entidade pública participante designar o representante desta na assembleia geral da empresa local, sendo os membros do órgão de gestão eleitos pela assembleia geral.
Sobre estas questões seguiremos a doutrina de Pedro Gonçalves1 que entende, bem, que no caso de sociedades unipessoais se trata mais de uma indicação ou designação do que de uma eleição.
Entende também que os gestores devem ser escolhidos de entre pessoas com comprovada idoneidade, mérito profissional, competências e experiência de gestão.
3. A terceira questão formulada respeita ao prazo de adaptação dos estatutos e à aplicação do novo valor máximo de remuneração dos membros dos órgãos de gestão imposto pelo n º 2 do artigo 30 º da lei n º 50/2012.
Ou seja, estipulando o n º 1 do artigo 70 º da lei n º 50/2012 que as entidades de natureza empresarial criadas ou constituídas ao abrigo de legislação anterior, assim como as sociedades comerciais participadas existentes, ficam obrigadas a adequar os seus estatutos em conformidade com a presente lei no prazo máximo de seis meses, tal implica que essa adaptação à nova lei deva incluir necessariamente a adaptação às novas normas respeitantes ao estatuto de gestor local.
Assim, será após essa mesma adaptação que será aplicável aos gestores o teto remuneratório atrás referido.
4. Quanto ao que se entende por remuneração dum eleito local, isto é, se a remuneração referida no n º 3 do artigo 30 º se deve cingir apenas à remuneração base do eleito local (como se sabe o teto remuneratório dos gestores das empresas locais é o valor da remuneração de vereador a tempo inteiro da Câmara Municipal respetiva) subscrevemos o entendimento deste conceito constante do Parecer da Procuradoria-Geral da República 10/2011, publicado no DR n º 187, de 28/09/2011.
Neste parecer questionava-se o que se deveria entender por remuneração dum eleito local, ou seja, se a remuneração implica apenas a remuneração base ou se, pelo contrário, implica qualquer tipo de remuneração acessória, certa ou acidental, designadamente despesas de representação.
Ora, as conclusões da PGR foram as seguintes:
2.ª A «remuneração correspondente ao cargo político desempenhado» é a remuneração de base legalmente prevista para o respetivo titular, podendo ainda abranger as prestações que, abonadas de forma regular, se fundam diretamente na prestação funcional e, por isso, se configuram como correspetivas das funções exercidas;
3. Os suplementos remuneratórios que não decorrem, direta e imediatamente, da prestação funcional do titular do cargo público, sendo, antes, devidos a circunstâncias e finalidades específicas, como sejam as que visam a compensação por despesas efetuadas por motivo de serviço (ajudas de custo e de transportes) ou que se destinam a fazer face a despesas acrescidas para salvaguarda da dignidade e prestígio do cargo (despesas de representação), não se integram no conceito de «remuneração correspondente ao cargo político desempenhado», (sublinhado nosso).
Assim, a nossa resposta à questão n º 4 é a de considerar que o limite máximo da remuneração base dos membros do órgão de gestão da empresa é o da remuneração base de vereador a tempo inteiro da Câmara Municipal de Cantanhede.
Tal significa que o gestor local não tem direito a despesas de representação, que acresceriam à sua remuneração base?
A lei das empresas locais determina no seu n º 4 do artigo 30 º que «sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o Estatuto do Gestor Público, aprovado pelo Decreto-lei n º 71/2007, de 27 de Março, alterado e republicado pelo Decreto-Lei
n º 8/2012, de 18/01, é subsidiariamente aplicável aos titulares dos órgãos de gestão ou de administração das empresas locais.»
Assim, poder-se-á argumentar que o n º 2 do artigo 30 º constitui norma especial apenas quanto à remuneração base do gestor de empresas locais, pelo que ter-se-ia que aplicar o estatuto do gestor público no que respeita às despesas de representação, pelo facto deste artigo 30 º nada dispor sobre as mesmas (aplicação subsidiária de acordo com o citado n º 4 do artigo 30 º).
No entanto, mesmo advogando esta tese nunca se poderia admitir que as despesas de representação a que o gestor eventualmente tivesse direito pudessem ser de percentagem superior às auferidas por um vereador a tempo inteiro.
Isto é, os gestores públicos auferem despesas de representação no valor de 40 % do respetivo vencimento ( n º 2 do artigo 28 º do decreto-lei n º 71/2007, de 27/03, na redação dada pelo decreto-lei n º 8/2012, de 18/01) por o teto da sua remuneração e suplementos remuneratórios serem os auferidos pelo Primeiro Ministro.
Ora, auferindo o Primeiro Ministro despesas de representação no montante de 40 % entende-se que seja também esta a percentagem das auferidas pelo gestor público.
Tal significa que no caso do estatuto do gestor local mesmo para quem defenda esta tese da possibilidade de os mesmos auferirem despesas de representação a percentagem das mesmas nunca poderia ultrapassar 20 % por ser essa a percentagem das despesas de representação dos vereadores a tempo inteiro.
Ou seja, dever-se-ia efetuar uma interpretação corretiva da percentagem indicada no estatuto do gestor público para as despesas de representação com base na interpretação sistemática dos dois diplomas.
No entanto, embora se possa formular esta hipótese interpretativa julgamos ser também defensável que o legislador tivesse querido diferenciar o estatuto remuneratório do gestor local relativamente ao gestor público, estabelecendo para o gestor local um teto remuneratório que implicasse não auferir de despesas de representação.
Esta questão deverá, em minha opinião, ser incluída numa próxima reunião de coordenação jurídica a realizar entre a DGAL e as CCDR.
5 e 6 – No que respeita à duração do mandato há que aplicar supletivamente o estatuto do gestor público, por força do n º 4 do artigo 30 º da lei n º 50/2012.
Assim, estabelece o do n º 1 do artigo 15 º do Estatuto do Gestor Público que o mandato é exercido, em regra, pelo prazo de três anos, sendo coincidentes os mandatos dos membros do mesmo órgão de administração.
Tal significa que esta norma de duração de mandatos é uma norma supletiva, pelo que os estatutos das empresas poderão adotá-la ou não.
Citamos a propósito desta questão o comentário de Pedro Gonçalves2, que adotamos:
«Tendo em consideração que o artigo 15, n º 1, do Estatuto do Gestor Público acolhe um a regra supletiva, os estatutos das empresas poderão segui-la, mas também podem fazer coincidir a duração dos mandatos com a duração dos mandatos autárquicos ou com a duração do mandato autárquico do próprio gestor.».
Quanto ao limite de mandatos, determinam os n º 2 e 3 do artigo 15 do Estatuto do Gestor Público que os estatutos podem fixar o número de renovações consecutivas dos mandatos na mesma empresa pública, até um limite de três.
Esta regra do número limite de mandatos é aplicável aos gestores das empresas locais, considerando nós que não tem aplicação retroativa esta contagem. Isto é, dever-se-á aplicar a regra geral da não retroatividade, por ser essa a regra geral de direito, exceto quando a própria lei dispuser em contrário.
7- No que respeita á possibilidade de um aposentado ser eleito gestor local, teremos que o mesmo se encontra sujeito ao artigo 78 º do Estatuto da Aposentação, Os aposentados não podem exercer funções públicas remuneradas para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública (redação do Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro, com entrada em vigor em 29 de Dezembro)
Esta incompatibilidade abrange todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços.
Ora, os gestores locais devem celebrar contratos de gestão, artigo 37 º, n º 4, da lei n º 50/2012, para além de que a celebração destes contratos de gestão sempre resultaria do estatuto do Gestor Público.
8- Por último questionam-nos se um contrato por tempo indeterminado poderá exercer funções não remuneradas num órgão de gestão duma empresa local?
A questão existe por o n º 1 do artigo 30 º da lei n º 50/2012 abrir a possibilidade de exercício simultâneo de funções nas entidades públicas participantes e em funções não remuneradas de gestor local, enquanto que no diploma revogado do setor empresarial local essa possibilidade de acumulação se restringia aos membros da própria Câmara Municipal.
No entanto, esta norma não pode ser interpretada isoladamente, devendo interpretar-se sistematicamente com as normas que regem as incompatibilidades do emprego público, dado a situação em análise respeitar à possível acumulação de um contratado por tempo indeterminado duma Câmara Municipal participante na empresa local e funções de gestor nessa mesma empresa.
A incompatibilidade aparece ligada a uma ideia de impossibilidade de exercício simultâneo de dois cargos ou funções.
O que está em causa em causa na incompatibilidade é a garantia da imparcialidade da atuação administrativa como valor abstrato. É a própria lei que exclui a possibilidade de acumulação (ou a sujeita a autorização prévia) por suspeitar, em abstrato, dos desvios em favor de outras atividades privadas ou públicas dos fins por que se deve pautar o exercício das atividades públicas, independentemente da pessoa que se trata e do interesse que ele tem ou deixe de ter em qualquer decisão. A incompatibilidade não tem, pois, a ver com casos concretos, com
procedimentos determinados (sobre incompatibilidades e impedimentos vide Mário Esteves de Oliveira…., Código do Procedimento Administrativo, vol. I, pág. 299 e ss).
Ora, após estabelecer no n.º 1 do artigo 25.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que “a existência de incompatibilidades e de impedimentos contribui para garantir a imparcialidade no exercício de funções públicas” e, no seu art.º 26.º, que “as funções públicas são, em regra, exercidas em regime de exclusividade”, prescreve o n.º 1 do art.º 28.º, também, deste diploma, que “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o exercício de funções não pode ser acumulado com o de funções ou atividades privadas” (salientado nosso).
A primeira questão que deveríamos esclarecer é se as funções de gestor público se enquadram ou não com o conceito de funções públicas constante do artigo 27 º da lei n º 12-A/2010.
Ora, muito embora gestor público seja em sentido amplo também «função pública», o que é certo é que a lei n º 12-A/2010 não abrange no seu âmbito objetivo qualquer tipo de empresas públicas.
A considerar-se integrado a atividade de gestor neste amplo conceito de emprego público, que temos dificuldade em subscrever por teoricamente ser pouco defensável esta inclusão, dado o âmbito objetivo da lei n º 12-A/2010, não sendo essa funções remuneradas poderia haver acumulação por razões de manifesto interesse público.
Para quem enquadre esta atividade como privada, haverá que analisar se essas funções ou atividades privadas não são concorrentes ou similares com as funções públicas desempenhadas e que com estas não sejam conflituantes (n.º 2 do art.º 28.º), designadamente, quando, “tendo conteúdo idêntico ao das funções públicas desempenhadas, sejam desenvolvidas de forma permanente ou habitual e se dirijam ao mesmo círculo de destinatários” (n.º 3 do art.º 28.º).
Assim, para se verificar esta exceção e ser possível a acumulação equacionada deverá o Presidente da Câmara, ou quem detenha poderes delegados para o efeito (cfr. o n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-lei n.º 209/2009, de 3 de Setembro, diploma que aplicou a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, à administração local) decidir, com base na informação interna dos serviços municipais competentes se as funções de gestor em causa têm ou não conteúdo idêntico às funções públicas desempenhadas e se se dirigem ao mesmo círculo de destinatários.
Se tal ocorrer existe incompatibilidade e não deverá ser autorizada a acumulação.
No entanto, quer se considere a atividade de gestor como atividade pública ou privada, ou seja, em qualquer dos casos, mesmo considerando possível a acumulação, julgamos existir uma impossibilidade prática nessa acumulação no que respeita ao gestor executivo, pelo facto de nesse caso se verificarem horários sobrepostos, pelo que só restará a hipótese de exercício de funções de gestor como gestor não executivo.
Maria José L. Castanheira Neves
(Diretora de Serviços de Apoio Jurídico e á Administração Local)
1. Pedro Gonçalves, Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local, Almedina, 2012, pag. 145 e sgt e 156.
2. Pedro Gonçalves, ob cit., pag. 158
Lei das Empresas Locais: Lei nº 50/2012, de 31/08
Lei das Empresas Locais: Lei nº 50/2012, de 31/08
Data: terça, 27 novembro 2012
Número: DSAJAL 280/12
Responsáveis: Maria José Castanheira Neves (Directora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local)
Directora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local
Em referência às questões remetidas nos ofícios n º s …, de …, e …, de …, relativas a questões sobre a interpretação de normativos da lei n º 50/2012, de 31/08, regime jurídico da atividade empresarial local, temos a informar:
1. e 2. Questionam-nos nas perguntas 1 e 2 sobre quem constitui a assembleia geral no caso de uma sociedade unipessoal e quem pode ser membro do órgão executivo.
De acordo com o n º 2 do artigo 26 º da lei n º 50/2012 compete ao órgão executivo da entidade pública participante designar o representante desta na assembleia geral da empresa local, sendo os membros do órgão de gestão eleitos pela assembleia geral.
Sobre estas questões seguiremos a doutrina de Pedro Gonçalves1 que entende, bem, que no caso de sociedades unipessoais se trata mais de uma indicação ou designação do que de uma eleição.
Entende também que os gestores devem ser escolhidos de entre pessoas com comprovada idoneidade, mérito profissional, competências e experiência de gestão.
3. A terceira questão formulada respeita ao prazo de adaptação dos estatutos e à aplicação do novo valor máximo de remuneração dos membros dos órgãos de gestão imposto pelo n º 2 do artigo 30 º da lei n º 50/2012.
Ou seja, estipulando o n º 1 do artigo 70 º da lei n º 50/2012 que as entidades de natureza empresarial criadas ou constituídas ao abrigo de legislação anterior, assim como as sociedades comerciais participadas existentes, ficam obrigadas a adequar os seus estatutos em conformidade com a presente lei no prazo máximo de seis meses, tal implica que essa adaptação à nova lei deva incluir necessariamente a adaptação às novas normas respeitantes ao estatuto de gestor local.
Assim, será após essa mesma adaptação que será aplicável aos gestores o teto remuneratório atrás referido.
4. Quanto ao que se entende por remuneração dum eleito local, isto é, se a remuneração referida no n º 3 do artigo 30 º se deve cingir apenas à remuneração base do eleito local (como se sabe o teto remuneratório dos gestores das empresas locais é o valor da remuneração de vereador a tempo inteiro da Câmara Municipal respetiva) subscrevemos o entendimento deste conceito constante do Parecer da Procuradoria-Geral da República 10/2011, publicado no DR n º 187, de 28/09/2011.
Neste parecer questionava-se o que se deveria entender por remuneração dum eleito local, ou seja, se a remuneração implica apenas a remuneração base ou se, pelo contrário, implica qualquer tipo de remuneração acessória, certa ou acidental, designadamente despesas de representação.
Ora, as conclusões da PGR foram as seguintes:
2.ª A «remuneração correspondente ao cargo político desempenhado» é a remuneração de base legalmente prevista para o respetivo titular, podendo ainda abranger as prestações que, abonadas de forma regular, se fundam diretamente na prestação funcional e, por isso, se configuram como correspetivas das funções exercidas;
3. Os suplementos remuneratórios que não decorrem, direta e imediatamente, da prestação funcional do titular do cargo público, sendo, antes, devidos a circunstâncias e finalidades específicas, como sejam as que visam a compensação por despesas efetuadas por motivo de serviço (ajudas de custo e de transportes) ou que se destinam a fazer face a despesas acrescidas para salvaguarda da dignidade e prestígio do cargo (despesas de representação), não se integram no conceito de «remuneração correspondente ao cargo político desempenhado», (sublinhado nosso).
Assim, a nossa resposta à questão n º 4 é a de considerar que o limite máximo da remuneração base dos membros do órgão de gestão da empresa é o da remuneração base de vereador a tempo inteiro da Câmara Municipal de Cantanhede.
Tal significa que o gestor local não tem direito a despesas de representação, que acresceriam à sua remuneração base?
A lei das empresas locais determina no seu n º 4 do artigo 30 º que «sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o Estatuto do Gestor Público, aprovado pelo Decreto-lei n º 71/2007, de 27 de Março, alterado e republicado pelo Decreto-Lei
n º 8/2012, de 18/01, é subsidiariamente aplicável aos titulares dos órgãos de gestão ou de administração das empresas locais.»
Assim, poder-se-á argumentar que o n º 2 do artigo 30 º constitui norma especial apenas quanto à remuneração base do gestor de empresas locais, pelo que ter-se-ia que aplicar o estatuto do gestor público no que respeita às despesas de representação, pelo facto deste artigo 30 º nada dispor sobre as mesmas (aplicação subsidiária de acordo com o citado n º 4 do artigo 30 º).
No entanto, mesmo advogando esta tese nunca se poderia admitir que as despesas de representação a que o gestor eventualmente tivesse direito pudessem ser de percentagem superior às auferidas por um vereador a tempo inteiro.
Isto é, os gestores públicos auferem despesas de representação no valor de 40 % do respetivo vencimento ( n º 2 do artigo 28 º do decreto-lei n º 71/2007, de 27/03, na redação dada pelo decreto-lei n º 8/2012, de 18/01) por o teto da sua remuneração e suplementos remuneratórios serem os auferidos pelo Primeiro Ministro.
Ora, auferindo o Primeiro Ministro despesas de representação no montante de 40 % entende-se que seja também esta a percentagem das auferidas pelo gestor público.
Tal significa que no caso do estatuto do gestor local mesmo para quem defenda esta tese da possibilidade de os mesmos auferirem despesas de representação a percentagem das mesmas nunca poderia ultrapassar 20 % por ser essa a percentagem das despesas de representação dos vereadores a tempo inteiro.
Ou seja, dever-se-ia efetuar uma interpretação corretiva da percentagem indicada no estatuto do gestor público para as despesas de representação com base na interpretação sistemática dos dois diplomas.
No entanto, embora se possa formular esta hipótese interpretativa julgamos ser também defensável que o legislador tivesse querido diferenciar o estatuto remuneratório do gestor local relativamente ao gestor público, estabelecendo para o gestor local um teto remuneratório que implicasse não auferir de despesas de representação.
Esta questão deverá, em minha opinião, ser incluída numa próxima reunião de coordenação jurídica a realizar entre a DGAL e as CCDR.
5 e 6 – No que respeita à duração do mandato há que aplicar supletivamente o estatuto do gestor público, por força do n º 4 do artigo 30 º da lei n º 50/2012.
Assim, estabelece o do n º 1 do artigo 15 º do Estatuto do Gestor Público que o mandato é exercido, em regra, pelo prazo de três anos, sendo coincidentes os mandatos dos membros do mesmo órgão de administração.
Tal significa que esta norma de duração de mandatos é uma norma supletiva, pelo que os estatutos das empresas poderão adotá-la ou não.
Citamos a propósito desta questão o comentário de Pedro Gonçalves2, que adotamos:
«Tendo em consideração que o artigo 15, n º 1, do Estatuto do Gestor Público acolhe um a regra supletiva, os estatutos das empresas poderão segui-la, mas também podem fazer coincidir a duração dos mandatos com a duração dos mandatos autárquicos ou com a duração do mandato autárquico do próprio gestor.».
Quanto ao limite de mandatos, determinam os n º 2 e 3 do artigo 15 do Estatuto do Gestor Público que os estatutos podem fixar o número de renovações consecutivas dos mandatos na mesma empresa pública, até um limite de três.
Esta regra do número limite de mandatos é aplicável aos gestores das empresas locais, considerando nós que não tem aplicação retroativa esta contagem. Isto é, dever-se-á aplicar a regra geral da não retroatividade, por ser essa a regra geral de direito, exceto quando a própria lei dispuser em contrário.
7- No que respeita á possibilidade de um aposentado ser eleito gestor local, teremos que o mesmo se encontra sujeito ao artigo 78 º do Estatuto da Aposentação, Os aposentados não podem exercer funções públicas remuneradas para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública (redação do Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro, com entrada em vigor em 29 de Dezembro)
Esta incompatibilidade abrange todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços.
Ora, os gestores locais devem celebrar contratos de gestão, artigo 37 º, n º 4, da lei n º 50/2012, para além de que a celebração destes contratos de gestão sempre resultaria do estatuto do Gestor Público.
8- Por último questionam-nos se um contrato por tempo indeterminado poderá exercer funções não remuneradas num órgão de gestão duma empresa local?
A questão existe por o n º 1 do artigo 30 º da lei n º 50/2012 abrir a possibilidade de exercício simultâneo de funções nas entidades públicas participantes e em funções não remuneradas de gestor local, enquanto que no diploma revogado do setor empresarial local essa possibilidade de acumulação se restringia aos membros da própria Câmara Municipal.
No entanto, esta norma não pode ser interpretada isoladamente, devendo interpretar-se sistematicamente com as normas que regem as incompatibilidades do emprego público, dado a situação em análise respeitar à possível acumulação de um contratado por tempo indeterminado duma Câmara Municipal participante na empresa local e funções de gestor nessa mesma empresa.
A incompatibilidade aparece ligada a uma ideia de impossibilidade de exercício simultâneo de dois cargos ou funções.
O que está em causa em causa na incompatibilidade é a garantia da imparcialidade da atuação administrativa como valor abstrato. É a própria lei que exclui a possibilidade de acumulação (ou a sujeita a autorização prévia) por suspeitar, em abstrato, dos desvios em favor de outras atividades privadas ou públicas dos fins por que se deve pautar o exercício das atividades públicas, independentemente da pessoa que se trata e do interesse que ele tem ou deixe de ter em qualquer decisão. A incompatibilidade não tem, pois, a ver com casos concretos, com
procedimentos determinados (sobre incompatibilidades e impedimentos vide Mário Esteves de Oliveira…., Código do Procedimento Administrativo, vol. I, pág. 299 e ss).
Ora, após estabelecer no n.º 1 do artigo 25.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que “a existência de incompatibilidades e de impedimentos contribui para garantir a imparcialidade no exercício de funções públicas” e, no seu art.º 26.º, que “as funções públicas são, em regra, exercidas em regime de exclusividade”, prescreve o n.º 1 do art.º 28.º, também, deste diploma, que “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o exercício de funções não pode ser acumulado com o de funções ou atividades privadas” (salientado nosso).
A primeira questão que deveríamos esclarecer é se as funções de gestor público se enquadram ou não com o conceito de funções públicas constante do artigo 27 º da lei n º 12-A/2010.
Ora, muito embora gestor público seja em sentido amplo também «função pública», o que é certo é que a lei n º 12-A/2010 não abrange no seu âmbito objetivo qualquer tipo de empresas públicas.
A considerar-se integrado a atividade de gestor neste amplo conceito de emprego público, que temos dificuldade em subscrever por teoricamente ser pouco defensável esta inclusão, dado o âmbito objetivo da lei n º 12-A/2010, não sendo essa funções remuneradas poderia haver acumulação por razões de manifesto interesse público.
Para quem enquadre esta atividade como privada, haverá que analisar se essas funções ou atividades privadas não são concorrentes ou similares com as funções públicas desempenhadas e que com estas não sejam conflituantes (n.º 2 do art.º 28.º), designadamente, quando, “tendo conteúdo idêntico ao das funções públicas desempenhadas, sejam desenvolvidas de forma permanente ou habitual e se dirijam ao mesmo círculo de destinatários” (n.º 3 do art.º 28.º).
Assim, para se verificar esta exceção e ser possível a acumulação equacionada deverá o Presidente da Câmara, ou quem detenha poderes delegados para o efeito (cfr. o n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-lei n.º 209/2009, de 3 de Setembro, diploma que aplicou a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, à administração local) decidir, com base na informação interna dos serviços municipais competentes se as funções de gestor em causa têm ou não conteúdo idêntico às funções públicas desempenhadas e se se dirigem ao mesmo círculo de destinatários.
Se tal ocorrer existe incompatibilidade e não deverá ser autorizada a acumulação.
No entanto, quer se considere a atividade de gestor como atividade pública ou privada, ou seja, em qualquer dos casos, mesmo considerando possível a acumulação, julgamos existir uma impossibilidade prática nessa acumulação no que respeita ao gestor executivo, pelo facto de nesse caso se verificarem horários sobrepostos, pelo que só restará a hipótese de exercício de funções de gestor como gestor não executivo.
Maria José L. Castanheira Neves
(Diretora de Serviços de Apoio Jurídico e á Administração Local)
1. Pedro Gonçalves, Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local, Almedina, 2012, pag. 145 e sgt e 156.
2. Pedro Gonçalves, ob cit., pag. 158
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