A Câmara Municipal de …, pelo ofício n.º …, de …, solicita a análise de algumas questões relacionadas com um aposentado que, tendo sido considerado excluído do âmbito de aplicação do art.º 78.º do Estatuto da Aposentação, pelos competentes serviços da Presidência do Conselho de Ministros, se encontra a desempenhar funções de adjunto do Gabinete de Apoio Pessoal do Presidente da Câmara, desde 3 de Novembro de 2005.
Respeitando a ordem por que se encontram formuladas, as referidas questões suscitam-nos as seguintes considerações:
1. Tendo desempenhado funções desde 3 de Novembro de 2005, sem que a respectiva publicação em Diário da República tenha ocorrido e sem que, até ao presente, lhe tenha sido abonada qualquer remuneração, poderão, agora, ser-lhe abonados os vencimentos devidos desde aquela data?
Não deixando de nos revelarmos sensíveis às cautelas com que os serviços agiram nesta matéria – eventualmente excessivas – certo é que a prestação de trabalho sem a correspondente contrapartida financeira pode consubstanciar violação dos mais elementares princípios gerais de direito constitucional (cfr. art.ºs 58.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa) e da legalidade administrativa (vide, entre outros, o art.º 74.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na actual redacção,) para além de propiciar que a autarquia tenha incorrido, ainda que involuntariamente, em enriquecimento sem causa (cfr. art.ºs 473.º e seguintes do Código Civil).
Claro está, embora sem prescindir, que, resultando a ausência de qualquer pagamento de vencimento de acordo entre as partes – cuja relevância ou eficácia jurídica não serão, nesta sede, questionadas – será este mesmo acordo que, a ser legalmente possível, irá propiciar o reembolso das remunerações em dívida, afigurando-se-nos, assim, descabido chamar à colação o que a jurisprudência e a doutrina têm expendido sobre a qualificação de cada acto de pagamento de vencimentos como acto administrativo e respectivas consequências (cfr, a propósito, o Parecer da Procuradoria-Geral da República, publicado a páginas 15 562, 2.ª série, do Diário da República de 7 de Novembro de 1996 e os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 22/12/86, 20/4/87, 26/4/90, 30/4/91, 3/12/91 e 26/3/92).
Posto isto, e como é óbvio, será da mais elementar justiça que o reembolso das remunerações em dívida seja efectuado, assim se repondo a legalidade, procedendo-se, também, à publicação da nomeação em Diário da República, com referência expressa à data de início de funções, publicação esta que, visando, por definição, assegurar, apenas, a eficácia externa da nomeação, em nada obvia ao referido reembolso, o que nos leva à questão seguinte.
2. Em face da actual redacção do art.º 79.º do Estatuto da Aposentação, deve ser paga a remuneração por inteiro ou, apenas 1/3?
No âmbito temporal de aplicação do art.º 79.º do Estatuto da Aposentação, na redacção anterior à alteração produzida pelo Decreto-lei n.º 179/2005, de 2 de Novembro, para além das limitações de natureza remuneratória contempladas no preceito, os aposentados só podiam exercer “funções públicas” desde que previamente autorizados pelo Primeiro-Ministro, sob proposta do Ministro competente, entendidas aquelas como desempenho de funções ao serviço das entidades públicas referidas no n.º 1 do art.º 78.º do mesmo estatuto, ou seja, ao serviço de uma pessoa colectiva de direito público, de que as autarquias locais são exemplo (cfr. a propósito, os Pareceres n.º 98/87, de 19 de Fevereiro, e n.º 103/99, de 9 de Fevereiro, da Procuradoria-Geral da República).
Atenta a nova redacção dos art.ºs 78.º e 79.º, introduzida por aquele diploma, a alteração que maior relevância assume, neste contexto, consubstancia-se na extensão do âmbito material de aplicação aos prestadores de serviço em regime de contrato de tarefa ou de avença, sendo a concessão da autorização da competência do Primeiro-Ministro, sob proposta do membro do Governo competente.
Ora, se foram os próprios e competentes serviços da Presidência do Conselho de Ministros que subtraíram o adjunto de gabinete em referência ao âmbito de aplicação material do art.º 78.º do Estatuto da Aposentação, não faria qualquer sentido submetê-lo ao regime do art.º 79.º do mesmo estatuto – remunerando-o com 1/3 do vencimento e não com a totalidade, como é devido – sob pena de assim se violar o princípio da unidade do sistema jurídico, do qual decorre que as normas não podem ser lidas e interpretadas isoladamente, antes devem ser consideradas como elementos de um conjunto ou sistema integrado de normas que garanta que a coerência e segurança jurídicas sejam salvaguardadas.
Pel’ A Divisão de Apoio Jurídico
(Dr. José Manuel Martins de Lima)
A Câmara Municipal de …, pelo ofício n.º …, de …, solicita a análise de algumas questões relacionadas com um aposentado que, tendo sido considerado excluído do âmbito de aplicação do art.º 78.º do Estatuto da Aposentação, pelos competentes serviços da Presidência do Conselho de Ministros, se encontra a desempenhar funções de adjunto do Gabinete de Apoio Pessoal do Presidente da Câmara, desde 3 de Novembro de 2005.
Respeitando a ordem por que se encontram formuladas, as referidas questões suscitam-nos as seguintes considerações:
1. Tendo desempenhado funções desde 3 de Novembro de 2005, sem que a respectiva publicação em Diário da República tenha ocorrido e sem que, até ao presente, lhe tenha sido abonada qualquer remuneração, poderão, agora, ser-lhe abonados os vencimentos devidos desde aquela data?
Não deixando de nos revelarmos sensíveis às cautelas com que os serviços agiram nesta matéria – eventualmente excessivas – certo é que a prestação de trabalho sem a correspondente contrapartida financeira pode consubstanciar violação dos mais elementares princípios gerais de direito constitucional (cfr. art.ºs 58.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa) e da legalidade administrativa (vide, entre outros, o art.º 74.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na actual redacção,) para além de propiciar que a autarquia tenha incorrido, ainda que involuntariamente, em enriquecimento sem causa (cfr. art.ºs 473.º e seguintes do Código Civil).
Claro está, embora sem prescindir, que, resultando a ausência de qualquer pagamento de vencimento de acordo entre as partes – cuja relevância ou eficácia jurídica não serão, nesta sede, questionadas – será este mesmo acordo que, a ser legalmente possível, irá propiciar o reembolso das remunerações em dívida, afigurando-se-nos, assim, descabido chamar à colação o que a jurisprudência e a doutrina têm expendido sobre a qualificação de cada acto de pagamento de vencimentos como acto administrativo e respectivas consequências (cfr, a propósito, o Parecer da Procuradoria-Geral da República, publicado a páginas 15 562, 2.ª série, do Diário da República de 7 de Novembro de 1996 e os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 22/12/86, 20/4/87, 26/4/90, 30/4/91, 3/12/91 e 26/3/92).
Posto isto, e como é óbvio, será da mais elementar justiça que o reembolso das remunerações em dívida seja efectuado, assim se repondo a legalidade, procedendo-se, também, à publicação da nomeação em Diário da República, com referência expressa à data de início de funções, publicação esta que, visando, por definição, assegurar, apenas, a eficácia externa da nomeação, em nada obvia ao referido reembolso, o que nos leva à questão seguinte.
2. Em face da actual redacção do art.º 79.º do Estatuto da Aposentação, deve ser paga a remuneração por inteiro ou, apenas 1/3?
No âmbito temporal de aplicação do art.º 79.º do Estatuto da Aposentação, na redacção anterior à alteração produzida pelo Decreto-lei n.º 179/2005, de 2 de Novembro, para além das limitações de natureza remuneratória contempladas no preceito, os aposentados só podiam exercer “funções públicas” desde que previamente autorizados pelo Primeiro-Ministro, sob proposta do Ministro competente, entendidas aquelas como desempenho de funções ao serviço das entidades públicas referidas no n.º 1 do art.º 78.º do mesmo estatuto, ou seja, ao serviço de uma pessoa colectiva de direito público, de que as autarquias locais são exemplo (cfr. a propósito, os Pareceres n.º 98/87, de 19 de Fevereiro, e n.º 103/99, de 9 de Fevereiro, da Procuradoria-Geral da República).
Atenta a nova redacção dos art.ºs 78.º e 79.º, introduzida por aquele diploma, a alteração que maior relevância assume, neste contexto, consubstancia-se na extensão do âmbito material de aplicação aos prestadores de serviço em regime de contrato de tarefa ou de avença, sendo a concessão da autorização da competência do Primeiro-Ministro, sob proposta do membro do Governo competente.
Ora, se foram os próprios e competentes serviços da Presidência do Conselho de Ministros que subtraíram o adjunto de gabinete em referência ao âmbito de aplicação material do art.º 78.º do Estatuto da Aposentação, não faria qualquer sentido submetê-lo ao regime do art.º 79.º do mesmo estatuto – remunerando-o com 1/3 do vencimento e não com a totalidade, como é devido – sob pena de assim se violar o princípio da unidade do sistema jurídico, do qual decorre que as normas não podem ser lidas e interpretadas isoladamente, antes devem ser consideradas como elementos de um conjunto ou sistema integrado de normas que garanta que a coerência e segurança jurídicas sejam salvaguardadas.
Pel’ A Divisão de Apoio Jurídico
(Dr. José Manuel Martins de Lima)
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