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Home Pareceres Jurídicos até 2017 Alienação de baldios

Alienação de baldios

 
 
 
 
 
 

Em resposta ao ofício nº 14/03, de 12/03/2002, da Junta de Freguesia de …e reportando-nos ao assunto mencionado em epígrafe, cumpre-nos informar o seguinte:

 

De acordo com a informação prestada por Vª Exª prende-se a questão em apreço com a venda de uma parcela de terreno baldio há cerca de 50 anos atrás. Tendo sido esta venda revestida de forma legal e titulada por alvará, questiona-nos essa Junta sobre a possibilidade de tal acto ser objecto de anulação. Visto tratar-se de um negócio jurídico realizado há cerca de 50 anos, importa, para o melhor esclarecimento da questão colocada, fazer uma breve abordagem sobre o regime jurídico dos baldios então aplicável. À data, o regime jurídico dos baldios era definido e regulado, no essencial, pelo Código Administrativo de 1940 que consagrava um capítulo único a esta matéria – arts. 388º a 403º. Nos termos do art. 388º deste Código, os baldios eram “terrenos não individualmente apropriados, dos quais só é permitido tirar proveito, guardados os regulamentos administrativos, aos indivíduos residentes em certa circunscrição ou parte dela”.

Os baldios eram assim no âmbito deste quadro legal entendidos como “domínio comum, categoria diferente do domínio público, caracterizada pela propriedade comunal dos vizinhos de certa circunscrição ou de parte dela, representados pela autarquia local a que pertencem, que exerceria meros direitos de administração e polícia” – Marcello Caetano in Manual de Direito Administrativo. O Código Administrativo nos seus arts. 389º e 390º distinguia entre baldios municipais (do concelho) e paroquiais (da freguesia) e classificava-os qunato à utilidade social e aptidão cultural em : – indispensáveis do logradouro comum – dispensáveis do logradouro comum e próprios para a cultura – dispensáveis do logradouro comum e impróprios para a cultura – arborizados ou destinados à arborização. Ora, também para efeitos de alienação dos baldios, o Código Administrativo distinguia entre baldios indispensáveis do logradouro comum e baldios dispensáveis do logradouro comum, proibindo a venda dos primeiros e permitindo a venda dos segundos.

Contudo, e muito embora a lei já tivesse previsto algumas normas restritivas no que respeita à apropriação de baldios, pode dizer-se grosso modo que a alienação de baldios era permitida e até incentivada, muitas vezes como forma de obter receitas para as câmaras e freguesias. No caso em análise não nos é dito a que categoria pertenceria a parcela do terreno baldio objecto de alienação, isto é, se se trata de um baldio disponível ou indisponível. Porém, como essa venda foi titulada e revestida de forma legal, tudo indicia que o negócio jurídico teve como objecto uma parcela de baldio classificada como disponível e, por isso, susceptível de alienação. É de notar que só com a publicação do Decreto-Lei nº 39/76, de 19 de Janeiro (diploma que revogou os arts. 388º a 400º do Código Administrativo e demais legislação aplicável aos baldios) é que os baldios passaram, genericamente, a ficar fora do comércio jurídico, não podendo ser objecto de relações de direito privado por qualquer forma ou título, incluída a usucapião (art. 2º). Em conformidade com este diploma, foi um outro publicado – Decreto-Lei nº 40/76, de 19 de Janeiro – que previa a anulabilidade a todo o tempo da apropriação de baldios realizada antes de 1976, ou seja, durante a vigência do Código Administrativo no que respeita a esta matéria. Refira-se também que a Lei nº 68/93, de 4 de Setembro, alterada pela Lei nº 89/97, de 30 de Julho (diploma que actualmente estabelece o regime jurídico dos baldios e que revoga os dois diplomas supra citados) restringe a alienação de baldios, permitindo-o apenas e excepcionalmente em casos por si previstos – arts. 4º e 31º.

Em todo o caso, não faz hoje sentido algum colocar-se a hipótese de anular um negócio de compra e venda celebrado há 50 anos, quer pela relevância do tempo decorrido, quer pelo facto de que a legalidade de um acto administrativo deve ser apreciada em face das circunstâncias factuais e da lei vigente à data em que o acto é praticado, não relevando as posteriores alterações, salvo quando a lei expressamente o preveja. Pelo exposto, somos de concluir que a venda da parcela do terreno baldio em causa é válida de acordo com a legislação em vigor à data da sua realização, não podendo o respectivo acto ser objecto de anulação.

A Divisão de Apoio Jurídico ( Dra. Elisabete Maria Viegas Frutuoso )

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Em resposta ao ofício nº 14/03, de 12/03/2002, da Junta de Freguesia de …e reportando-nos ao assunto mencionado em epígrafe, cumpre-nos informar o seguinte:

 

De acordo com a informação prestada por Vª Exª prende-se a questão em apreço com a venda de uma parcela de terreno baldio há cerca de 50 anos atrás. Tendo sido esta venda revestida de forma legal e titulada por alvará, questiona-nos essa Junta sobre a possibilidade de tal acto ser objecto de anulação. Visto tratar-se de um negócio jurídico realizado há cerca de 50 anos, importa, para o melhor esclarecimento da questão colocada, fazer uma breve abordagem sobre o regime jurídico dos baldios então aplicável. À data, o regime jurídico dos baldios era definido e regulado, no essencial, pelo Código Administrativo de 1940 que consagrava um capítulo único a esta matéria – arts. 388º a 403º. Nos termos do art. 388º deste Código, os baldios eram “terrenos não individualmente apropriados, dos quais só é permitido tirar proveito, guardados os regulamentos administrativos, aos indivíduos residentes em certa circunscrição ou parte dela”.

Os baldios eram assim no âmbito deste quadro legal entendidos como “domínio comum, categoria diferente do domínio público, caracterizada pela propriedade comunal dos vizinhos de certa circunscrição ou de parte dela, representados pela autarquia local a que pertencem, que exerceria meros direitos de administração e polícia” – Marcello Caetano in Manual de Direito Administrativo. O Código Administrativo nos seus arts. 389º e 390º distinguia entre baldios municipais (do concelho) e paroquiais (da freguesia) e classificava-os qunato à utilidade social e aptidão cultural em : – indispensáveis do logradouro comum – dispensáveis do logradouro comum e próprios para a cultura – dispensáveis do logradouro comum e impróprios para a cultura – arborizados ou destinados à arborização. Ora, também para efeitos de alienação dos baldios, o Código Administrativo distinguia entre baldios indispensáveis do logradouro comum e baldios dispensáveis do logradouro comum, proibindo a venda dos primeiros e permitindo a venda dos segundos.

Contudo, e muito embora a lei já tivesse previsto algumas normas restritivas no que respeita à apropriação de baldios, pode dizer-se grosso modo que a alienação de baldios era permitida e até incentivada, muitas vezes como forma de obter receitas para as câmaras e freguesias. No caso em análise não nos é dito a que categoria pertenceria a parcela do terreno baldio objecto de alienação, isto é, se se trata de um baldio disponível ou indisponível. Porém, como essa venda foi titulada e revestida de forma legal, tudo indicia que o negócio jurídico teve como objecto uma parcela de baldio classificada como disponível e, por isso, susceptível de alienação. É de notar que só com a publicação do Decreto-Lei nº 39/76, de 19 de Janeiro (diploma que revogou os arts. 388º a 400º do Código Administrativo e demais legislação aplicável aos baldios) é que os baldios passaram, genericamente, a ficar fora do comércio jurídico, não podendo ser objecto de relações de direito privado por qualquer forma ou título, incluída a usucapião (art. 2º). Em conformidade com este diploma, foi um outro publicado – Decreto-Lei nº 40/76, de 19 de Janeiro – que previa a anulabilidade a todo o tempo da apropriação de baldios realizada antes de 1976, ou seja, durante a vigência do Código Administrativo no que respeita a esta matéria. Refira-se também que a Lei nº 68/93, de 4 de Setembro, alterada pela Lei nº 89/97, de 30 de Julho (diploma que actualmente estabelece o regime jurídico dos baldios e que revoga os dois diplomas supra citados) restringe a alienação de baldios, permitindo-o apenas e excepcionalmente em casos por si previstos – arts. 4º e 31º.

Em todo o caso, não faz hoje sentido algum colocar-se a hipótese de anular um negócio de compra e venda celebrado há 50 anos, quer pela relevância do tempo decorrido, quer pelo facto de que a legalidade de um acto administrativo deve ser apreciada em face das circunstâncias factuais e da lei vigente à data em que o acto é praticado, não relevando as posteriores alterações, salvo quando a lei expressamente o preveja. Pelo exposto, somos de concluir que a venda da parcela do terreno baldio em causa é válida de acordo com a legislação em vigor à data da sua realização, não podendo o respectivo acto ser objecto de anulação.

A Divisão de Apoio Jurídico ( Dra. Elisabete Maria Viegas Frutuoso )