Carreiras, vínculos, tempo de serviço.
A Câmara Municipal de …, pelo ofício n.º …, de …, coloca a questão de saber se a avaliação de desempenho atribuída a um trabalhador contratado a termo certo, em 2005 e 2006, é passível de ser considerada relevante na carreira em que, em 23/03/2007, acabaria por ingressar na sequência de concurso, a qual foi determinante na sua transição para o novo sistema de carreiras, vínculos e remunerações, aprovado pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
Sobre o assunto cumpre-nos tecer as seguintes considerações;
A questão controvertida não deixa, salvo melhor opinião, de suscitar a análise de uma questão prévia e incindível daquela, qual seja a de saber se o tempo de serviço prestado como contratado a termo certo era legalmente passível de ser considerado relevante na carreira em que o trabalhador acabaria por ingressar na sequência de concurso.
Prescrevia o art.º 3.º do Decreto-lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, na redacção, ao tempo, vigente, (e revogado a partir da entrada em vigor do RCTFP, pela Lei n.º 12-A/2008 de 27 de Fevereiro – abreviadamente, LVCR), aplicado à Administração Local pelo Decreto-lei n.º 409/91, de 17 de Outubro, que a relação jurídica de emprego na Administração Pública se constituía por nomeação e contrato de pessoal.
De acordo com o disposto no art.º 4.º do mesmo diploma, deviam atribuir-se à nomeação as seguintes características:
a) Acto unilateral da administração cuja eficácia dependia da aceitação do nomeado (n.º 4);
b) Preenchimento de um lugar do quadro de pessoal;
c) Objectivo, de modo profissionalizado, de visar a satisfação de necessidades permanentes do serviço público;
d) Concessão, ao nomeado, do estatuto de funcionário, passando, consequentemente, a desempenhar funções públicas em regime de carreira.
Por outro lado, compulsando o disposto no n.º 3 do art.º 14.º e o n.º 1 do art.º 18.º do Decreto-lei n.º 427/89, acima referido, deviam atribuir-se ao contrato de trabalho a termo certo (única modalidade de contrato de pessoal a merecer aqui atenção) as seguintes características:
a) Acordo bilateral pressupondo uma convergência de vontades entre contratante e contratado;
b) Não preenchimento de qualquer lugar do quadro de pessoal por parte do contratado;
c) Objectivo, de modo não profissionalizado, de visar a satisfação de necessidades transitórias do serviço público;
d) Denegação da concessão, ao particular outorgante, da qualidade de agente administrativo, passando a desempenhar funções em regime de emprego.
No que à figura da nomeação diz respeito, importa, ainda, referir que, nos termos do n.º 2 do art.º 9.º do Decreto-lei n.º 427/89, nos casos de primeira nomeação, a qualquer título, a aceitação revestia a forma de posse, acto pessoal e solene a que o trabalhador em apreço teve que se sujeitar para iniciar funções de técnico-profissional de 2.ª classe nessa autarquia, passando, só a partir de então, a ser detentor de um vínculo jurídico-administrativo.
Ora, estabelecia o n.º 1 do art.º 12.º do mesmo diploma que a aceitação determinava o início de funções para todos os efeitos legais, designadamente, abono de remunerações e contagem de tempo de serviço.
O mesmo é dizer que, no quadro jurídico-normativo existente ao tempo da passagem do trabalhador da situação de contratado a termo certo para a de funcionário administrativo, a relevância do tempo de serviço prestado na primeira situação só poderia relevar na carreira desde que houvesse norma que expressamente o previsse.
E, em tal quadro, e em momentos diferentes, diversas normas foram instituídas que se poderiam invocar como ilustrativas da asserção produzida.
Assim, e como meros exemplos, estabelecia o n.º 4 do art.º 6.º do Decreto-lei n.º 409/91, de 17 de Outubro diploma que aplicou à administração local, com adaptações, o regime do D.L. 427/89 que “o tempo de serviço prestado como contratado nos termos do artigo 44.º do Decreto-lei n.º 247/87, de 17 de Junho, no exercício de funções correspondentes às da categoria de ingresso releva para efeitos de progressão na categoria e promoção na carreira”, ou, do mesmo tipo, o n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-lei n.º 195/97, de 31 de Julho, prescrevia que “o tempo de serviço prestado em situação irregular pelo pessoal aprovado nos concursos a que respeita o diploma citado releva na categoria de integração para efeitos de promoção, aposentação e sobrevivência.”
Contudo, nenhuma norma se conhece que, em situações como a descrita no pedido de parecer, seja contemplada a possibilidade da contagem de tempo ou da produção de efeitos nos termos em que os mesmos são equacionados, razão por que apenas poderão relevar, no caso em apreço, as avaliações de desempenho obtidas após o ingresso no quadro de pessoal, sob pena de violação do princípio da legalidade estabelecido no art.º 3.º do Código do Procedimento Administrativo.
Em reforço do aduzido, e sem prescindir, poderão referir-se, ainda dois aspectos:
– Em primeiro lugar, e cingindo-nos à matéria da avaliação de desempenho não será despiciendo salientar o disposto no art.º 7.º da Lei n.º 10/2004, de 22 de Março (entretanto, revogada) quando, elencando as finalidades visadas pela mesma, autonomizava, no n.º 1, três situações bem distintas:
a) Promoção e progressão nas carreiras e categorias;
b) Conversão da nomeação provisória em definitiva;
c) Renovação de contratos.”
– Em segundo lugar, a conhecida diferença de regimes em matéria de contratos a termo certo, na perspectiva da possibilidade de, no sector privado, os contratos a prazo se poderem converter em contratos sem prazo (nas situações legalmente previstas no Código do Trabalho), situações em que, como é sabido, a antiguidade do trabalhador retroagia à data do início do primeiro contrato, conversão essa que, no sector da administração pública, em geral, e da administração local, em particular, nunca foi juridicamente possível (vide, a propósito, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 409/2007, publicado na 2.ª série do Diário da República de 28 de Agosto de 2007).
Acresce uma terceira circunstância que, sendo bem mais do que meramente conceptual, contribui grandemente para a sustentação do entendimento perfilhado.
É que, e como não se ignora, enquanto que alguém provido num lugar do quadro, passava a ser detentor de uma categoria e carreira correspondentes, um trabalhador contratado era-o para o desempenho de uma função ou de uma actividade que podia corresponder ou não ao conteúdo funcional correspondente a uma carreira (cfr., a título exemplificativo, o n.º 1 do art.º 19.º do DL n.º 427/89 ou o n.º 2 do art.º 8.º da Lei 23/2004).
Em conclusão:
a) A aceitação determinava, em 2007, o início de funções para todos os efeitos legais, designadamente, abono de remunerações e contagem de tempo de serviço;
b) Para que a um funcionário pudesse ser considerado, então, o tempo de serviço prestado em regime de contrato a termo certo, para efeitos de promoção e progressão na carreira, tornava-se necessária a existência de norma que tal prescrevesse;
c) Porque nenhuma norma se conhece que, em situações como a descrita no pedido de parecer, fosse ou seja contemplada a possibilidade da contagem de tempo ou da produção de efeitos nos termos em que os mesmos são equacionados, apenas poderão relevar, no caso em apreço, as avaliações de desempenho obtidas após o ingresso no quadro de pessoal, em 2007, sob pena de violação do princípio da legalidade estabelecido no art.º 3.º do Código do Procedimento Administrativo.
Pel’ A Divisão de Apoio Jurídico
(José Manuel Martins de Lima)
Carreiras, vínculos, tempo de serviço.
Carreiras, vínculos, tempo de serviço.
A Câmara Municipal de …, pelo ofício n.º …, de …, coloca a questão de saber se a avaliação de desempenho atribuída a um trabalhador contratado a termo certo, em 2005 e 2006, é passível de ser considerada relevante na carreira em que, em 23/03/2007, acabaria por ingressar na sequência de concurso, a qual foi determinante na sua transição para o novo sistema de carreiras, vínculos e remunerações, aprovado pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
Sobre o assunto cumpre-nos tecer as seguintes considerações;
A questão controvertida não deixa, salvo melhor opinião, de suscitar a análise de uma questão prévia e incindível daquela, qual seja a de saber se o tempo de serviço prestado como contratado a termo certo era legalmente passível de ser considerado relevante na carreira em que o trabalhador acabaria por ingressar na sequência de concurso.
Prescrevia o art.º 3.º do Decreto-lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, na redacção, ao tempo, vigente, (e revogado a partir da entrada em vigor do RCTFP, pela Lei n.º 12-A/2008 de 27 de Fevereiro – abreviadamente, LVCR), aplicado à Administração Local pelo Decreto-lei n.º 409/91, de 17 de Outubro, que a relação jurídica de emprego na Administração Pública se constituía por nomeação e contrato de pessoal.
De acordo com o disposto no art.º 4.º do mesmo diploma, deviam atribuir-se à nomeação as seguintes características:
a) Acto unilateral da administração cuja eficácia dependia da aceitação do nomeado (n.º 4);
b) Preenchimento de um lugar do quadro de pessoal;
c) Objectivo, de modo profissionalizado, de visar a satisfação de necessidades permanentes do serviço público;
d) Concessão, ao nomeado, do estatuto de funcionário, passando, consequentemente, a desempenhar funções públicas em regime de carreira.
Por outro lado, compulsando o disposto no n.º 3 do art.º 14.º e o n.º 1 do art.º 18.º do Decreto-lei n.º 427/89, acima referido, deviam atribuir-se ao contrato de trabalho a termo certo (única modalidade de contrato de pessoal a merecer aqui atenção) as seguintes características:
a) Acordo bilateral pressupondo uma convergência de vontades entre contratante e contratado;
b) Não preenchimento de qualquer lugar do quadro de pessoal por parte do contratado;
c) Objectivo, de modo não profissionalizado, de visar a satisfação de necessidades transitórias do serviço público;
d) Denegação da concessão, ao particular outorgante, da qualidade de agente administrativo, passando a desempenhar funções em regime de emprego.
No que à figura da nomeação diz respeito, importa, ainda, referir que, nos termos do n.º 2 do art.º 9.º do Decreto-lei n.º 427/89, nos casos de primeira nomeação, a qualquer título, a aceitação revestia a forma de posse, acto pessoal e solene a que o trabalhador em apreço teve que se sujeitar para iniciar funções de técnico-profissional de 2.ª classe nessa autarquia, passando, só a partir de então, a ser detentor de um vínculo jurídico-administrativo.
Ora, estabelecia o n.º 1 do art.º 12.º do mesmo diploma que a aceitação determinava o início de funções para todos os efeitos legais, designadamente, abono de remunerações e contagem de tempo de serviço.
O mesmo é dizer que, no quadro jurídico-normativo existente ao tempo da passagem do trabalhador da situação de contratado a termo certo para a de funcionário administrativo, a relevância do tempo de serviço prestado na primeira situação só poderia relevar na carreira desde que houvesse norma que expressamente o previsse.
E, em tal quadro, e em momentos diferentes, diversas normas foram instituídas que se poderiam invocar como ilustrativas da asserção produzida.
Assim, e como meros exemplos, estabelecia o n.º 4 do art.º 6.º do Decreto-lei n.º 409/91, de 17 de Outubro diploma que aplicou à administração local, com adaptações, o regime do D.L. 427/89 que “o tempo de serviço prestado como contratado nos termos do artigo 44.º do Decreto-lei n.º 247/87, de 17 de Junho, no exercício de funções correspondentes às da categoria de ingresso releva para efeitos de progressão na categoria e promoção na carreira”, ou, do mesmo tipo, o n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-lei n.º 195/97, de 31 de Julho, prescrevia que “o tempo de serviço prestado em situação irregular pelo pessoal aprovado nos concursos a que respeita o diploma citado releva na categoria de integração para efeitos de promoção, aposentação e sobrevivência.”
Contudo, nenhuma norma se conhece que, em situações como a descrita no pedido de parecer, seja contemplada a possibilidade da contagem de tempo ou da produção de efeitos nos termos em que os mesmos são equacionados, razão por que apenas poderão relevar, no caso em apreço, as avaliações de desempenho obtidas após o ingresso no quadro de pessoal, sob pena de violação do princípio da legalidade estabelecido no art.º 3.º do Código do Procedimento Administrativo.
Em reforço do aduzido, e sem prescindir, poderão referir-se, ainda dois aspectos:
– Em primeiro lugar, e cingindo-nos à matéria da avaliação de desempenho não será despiciendo salientar o disposto no art.º 7.º da Lei n.º 10/2004, de 22 de Março (entretanto, revogada) quando, elencando as finalidades visadas pela mesma, autonomizava, no n.º 1, três situações bem distintas:
a) Promoção e progressão nas carreiras e categorias;
b) Conversão da nomeação provisória em definitiva;
c) Renovação de contratos.”
– Em segundo lugar, a conhecida diferença de regimes em matéria de contratos a termo certo, na perspectiva da possibilidade de, no sector privado, os contratos a prazo se poderem converter em contratos sem prazo (nas situações legalmente previstas no Código do Trabalho), situações em que, como é sabido, a antiguidade do trabalhador retroagia à data do início do primeiro contrato, conversão essa que, no sector da administração pública, em geral, e da administração local, em particular, nunca foi juridicamente possível (vide, a propósito, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 409/2007, publicado na 2.ª série do Diário da República de 28 de Agosto de 2007).
Acresce uma terceira circunstância que, sendo bem mais do que meramente conceptual, contribui grandemente para a sustentação do entendimento perfilhado.
É que, e como não se ignora, enquanto que alguém provido num lugar do quadro, passava a ser detentor de uma categoria e carreira correspondentes, um trabalhador contratado era-o para o desempenho de uma função ou de uma actividade que podia corresponder ou não ao conteúdo funcional correspondente a uma carreira (cfr., a título exemplificativo, o n.º 1 do art.º 19.º do DL n.º 427/89 ou o n.º 2 do art.º 8.º da Lei 23/2004).
Em conclusão:
a) A aceitação determinava, em 2007, o início de funções para todos os efeitos legais, designadamente, abono de remunerações e contagem de tempo de serviço;
b) Para que a um funcionário pudesse ser considerado, então, o tempo de serviço prestado em regime de contrato a termo certo, para efeitos de promoção e progressão na carreira, tornava-se necessária a existência de norma que tal prescrevesse;
c) Porque nenhuma norma se conhece que, em situações como a descrita no pedido de parecer, fosse ou seja contemplada a possibilidade da contagem de tempo ou da produção de efeitos nos termos em que os mesmos são equacionados, apenas poderão relevar, no caso em apreço, as avaliações de desempenho obtidas após o ingresso no quadro de pessoal, em 2007, sob pena de violação do princípio da legalidade estabelecido no art.º 3.º do Código do Procedimento Administrativo.
Pel’ A Divisão de Apoio Jurídico
(José Manuel Martins de Lima)
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