Assembleia de Freguesia: Inelegibilidades, Incompatibilidades, Impedimentos.
Em referência ao ofício nº…, de …, da Junta de Freguesia …, foi solicitado a esta CCDR o seguinte:
Poderá um membro de uma Assembleia de Freguesia em efectividade de funções, ser concorrente a executar quaisquer obras da mesma Junta de Freguesia
Cumpre informar:
1. Dever-se-á analisar a questão formulada do ponto de vista das incompatibilidades, nos termos da Lei nº 29/87, de 30.06, com as alterações introduzidas pela Lei nº 52-A/2005, de 10.10.
As incompatibilidades são um corolário do princípio constitucional da imparcialidade – artigo 266º nº 2 da CRP – e significam a impossibilidade de acumular simultaneamente dois cargos ou funções por a lei considerar em abstracto, independentemente da pessoa em concreto que os acumula, que essa acumulação é susceptível de pôr em causa a isenção e imparcialidade exigida ao cargo.
A PGR, no parecer nº 100/82, de 27-07, refere que “as incompatibilidades visam proteger a independência das funções” e Vital Moreira e Gomes Canotilho1 referem que o sistema das incompatibilidades visa garantir não só o princípio da imparcialidade da administração mas também o princípio da eficiência (boa administração).
O exercício cumulativo de actividades públicas ou privadas deixou de ser considerado incompatível com o exercício de funções autárquicas, dado o estabelecido no art. 3º da Lei nº 29/87, de 30.06, alterado e republicado pela Lei nº 52-A/2005, de 10.10.
Cumpre esclarecer que com a entrada em vigor do referido art. 3º da Lei nº 52-A/2005, se deve considerar tacitamente revogado o art. 6º da Lei nº 64/93, de 26.08, dado a redacção deste último normativo ser igual à redacção do primeiro. Foi esta a conclusão saída da reunião de coordenação jurídica realizada em 18.10.2005 entre a DGAL, as CCDR, a DRAPL Madeira e a DROAP Açores, ao abrigo do Despacho nº 6695/2000, publicado no DR, II Série, nº 74, de 28.03.2000.
Efectivamente, o nº1 do art. 3º da Lei nº 29/87, de 30.06, estabelece que “ Os presidentes e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas ”.
Posto isto, resulta claro do nº 1 do art. 3º que os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas. Efectivamente e também com as devidas adaptações, dada a ressalva do nº1 do art. 4º da Lei nº 64/93, com as alterações introduzidas pela Lei nº 28/95, de 18 de Agosto e pela Lei nº 12/98, de 24 de Fevereiro, não ficam sujeitos os referidos eleitos locais ao regime de incompatibilidades previsto para os titulares de cargos políticos, ou seja, o de exercerem as suas funções em regime de exclusividade.
Permite assim a lei, no referido art. 3º, a acumulação dos cargos de eleitos, mesmo em regime de permanência, com o exercício de outras actividades, sejam públicas ou privadas, dado que não se faz qualquer distinção quanto à sua natureza.
O n º 2 do art. 3 º acrescenta, no entanto, que o disposto no seu n º 1 não revoga os regimes de incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais.
Ora, do ponto de vista do regime das incompatibilidades, poder-se-á assim concluir, por maioria de razão, que perante um membro da Assembleia de Freguesia que não exerce sequer o seu mandato em regime de permanência, não existe qualquer incompatibilidade no exercício cumulativo de funções.
2. Nesta análise, contudo, há que ter presente o dever que impende sobre os autarcas de, no exercício das suas funções e na prossecução do interesse público, não celebrar com a autarquia qualquer contrato, salvo de adesão ( al. b) – v) do art. 4º do Estatuto dos Eleitos Locais).
Ora, como decorre do atrás referido, a execução de uma obra consubstancia juridicamente um contrato de empreitada de obras públicas que é constituído por duas partes: o dono da obra, neste caso, a autarquia, através do órgão competente, e o adjudicado, a pessoa singular ou colectiva, que executa.
Este impedimento foi posteriormente vertido no art. 44º do CPA como princípio geral válido para toda a Administração e que preceitua o seguinte:
“1 – Nenhum titular de órgão ou agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo ou em acto ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública nos seguintes casos:
a) Quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;
b) Quando, por si ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse o seu cônjuge, algum parente ou afim em linha recta ou até ao segundo grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum
Para tais casos, dispõe o nº 2 do art. 8º da Lei nº 27/96 que “ Incorrem, igualmente, em perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos que, no exercício das suas funções, ou por causa delas, intervenham em procedimento administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado relativamente ao qual se verifique impedimento legal, visando a obtenção de vantagem patrimonial para si e para outrem”.
A perda de mandato funda-se aqui na violação de um impedimento, por conflito de interesses, a qual, no entendimento da lei, é de tal modo grave que impossibilita definitivamente a manutenção do contrato.
Atente-se, todavia, à interpretação dada, pela PGR2, ao normativo da anterior Lei da Tutela, cujo conteúdo não difere substancialmente do actual:
“6.1 (…)
Assim, o texto legal em apreço (…) apenas impõe um dever de não intervenção em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado.
(…)
No que aos contratos respeita, tal significa que o membro do órgão autárquico deve abster-se de intervir em qualquer momento do iter negocial: negociações, celebração, execução.” E se esta é a solução que emerge do texto em análise, pensa-se que a razão de ser com ela se basta e contenta, não reclamando solução mais radical.
6.3 – Este também o entendimento expresso por Nuno da Silva Salgado:
Agora segundo a Lei da Tutela (Lei nº 87/89), os membros dos órgãos autárquicos podem ter interesse no processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado em que intervenha a autarquia de que fazem parte, mas desde que não intervenham, no exercício das suas funções ou por causa delas, em tais actos, contratos ou processos, não perdem o mandato nem tal acto é nulo ou anulável.
Quer dizer: quando tenham interesse em tais actos e desde que declarem ou requeiram o seu impedimento de neles intervir como membros de órgãos autárquicos, pode a autarquia livremente praticar tais actos ou celebrar contratos com o titular do órgão declarado impedido e este de neles intervir, até directamente, não nesta última qualidade, como é óbvio, mas sim como titular do interesse particular em conflito com o interesse público. O que não pode é intervir na qualidade de autarca (…)”
Ora, em conformidade, parece-nos que embora se trate de um contrato de empreitada celebrado entre um membro da Assembleia de Freguesia e a Junta de Freguesia, não tendo aquele, dadas as suas competências, intervenção no procedimento, se não verifica, nos termos do nº 2 do citado art. 8º, impedimento gerador da perda de mandato.
2. Vejamos, por último, se se verifica alguma inelegibilidade especial, nos termos previstos do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto.
Prevê a al. c) do nº 2 da referida lei orgânica que não são elegíveis para os órgãos das autarquias locais “Os membros dos corpos sociais e os gerentes de sociedades, bem como os proprietários de empresas que tenham contrato com a autarquia não integralmente cumprido ou de execução continuada”.
Ora, cabe assim aferir se, no caso vertente, o membro da assembleia de freguesia que pretende concorrer a um procedimento de contratação pública, o faz numa das qualidades mencionadas no citado normativo, ou seja, como membro dos corpos sociais ou gerente de uma sociedade ou como proprietário de uma empresa de construção civil.
Atente-se, nesta matéria, ao que proferiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 516/2001 – Proc. nº 739/2001, publicado no DR 2ª série, de 20.12.2001, a propósito do decidido no Acórdão nº 717/93, de 15.02.1994:
«De facto – como se escreveu no citado Acórdão 4/84 “os membros dos corpos sociais, assim como os proprietários de empresas que tenham contratos não integralmente cumpridos ou de execução continuada com a autarquia não oferecem, em princípio, as garantias impostas pelas regras de disciplina e perfectibilidade que devem ser apanágio dos órgãos de gestão autárquica”
Como está em causa o “exercício isento, desinteressado e imparcial dos cargos autárquicos”, o que, em direitas contas, então interessa é que, para os órgãos de determinada autarquia local, não seja eleito quem, ao iniciar o exercício do cargo, seja membro dos corpos sociais ou proprietário de uma empresa que tenha contratos pendentes com essa autarquia. E isso, tanto no caso de a subsistência do contrato, nesse momento, se dever ao facto de se tratar de negócio cuja execução se protrai no tempo, como naquele em que, sendo um contrato de outro tipo, as obrigações que dele decorrem ainda se acharem nessa altura por cumprir, ao menos em parte.»
Entende pois este Tribunal, que a existência de contratos ainda não cumpridos ou de execução continuada entre a autarquia e um eleito local, põe em causa os princípios de isenção e imparcialidade pelos quais se deve pautar a actuação da Administração Pública.
As inelegibilidades são, pois, uma forma necessária de garantir a isenção e independência do exercício das funções autárquicas.
Desta forma, se na presente situação o membro da Assembleia de Freguesia for gerente ou proprietário de uma empresa concorrente ao referido procedimento, dever-se-á concluir, ao abrigo da al. c) do nº 2 do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, pela existência de uma inelegibilidade especial, no caso, superveniente, dado que o cidadão em causa já foi eleito.
Em suma, ainda que se considere que não existe qualquer incompatibilidade na acumulação de funções públicas com funções privadas, nem que o referido contrato de empreitada constitui um impedimento legal gerador de perda de mandato, nos termos do nº 2 do art. 8º da Lei nº 27/96, dever-se-á concluir, na hipótese do membro da Assembleia Freguesia ser gerente ou proprietário de uma empresa concorrente ao procedimento em causa, pela existência de uma inelegibilidade especial superveniente, nos termos da al. c) do nº 2 do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001.
1. J.J Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, anotada, 3ª edição, Coimbra, 1993, pág. 948
2. Parecer do CC da PGR nº 45/90 (publicado no DR, II, nº 218, de 21.09.92)
A Divisão de Apoio Jurídico
(Elisabete Maria Viegas frutuoso)
Assembleia de Freguesia: Inelegibilidades, Incompatibilidades, Impedimentos.
Assembleia de Freguesia: Inelegibilidades, Incompatibilidades, Impedimentos.
Em referência ao ofício nº…, de …, da Junta de Freguesia …, foi solicitado a esta CCDR o seguinte:
Poderá um membro de uma Assembleia de Freguesia em efectividade de funções, ser concorrente a executar quaisquer obras da mesma Junta de Freguesia
Cumpre informar:
1. Dever-se-á analisar a questão formulada do ponto de vista das incompatibilidades, nos termos da Lei nº 29/87, de 30.06, com as alterações introduzidas pela Lei nº 52-A/2005, de 10.10.
As incompatibilidades são um corolário do princípio constitucional da imparcialidade – artigo 266º nº 2 da CRP – e significam a impossibilidade de acumular simultaneamente dois cargos ou funções por a lei considerar em abstracto, independentemente da pessoa em concreto que os acumula, que essa acumulação é susceptível de pôr em causa a isenção e imparcialidade exigida ao cargo.
A PGR, no parecer nº 100/82, de 27-07, refere que “as incompatibilidades visam proteger a independência das funções” e Vital Moreira e Gomes Canotilho1 referem que o sistema das incompatibilidades visa garantir não só o princípio da imparcialidade da administração mas também o princípio da eficiência (boa administração).
O exercício cumulativo de actividades públicas ou privadas deixou de ser considerado incompatível com o exercício de funções autárquicas, dado o estabelecido no art. 3º da Lei nº 29/87, de 30.06, alterado e republicado pela Lei nº 52-A/2005, de 10.10.
Cumpre esclarecer que com a entrada em vigor do referido art. 3º da Lei nº 52-A/2005, se deve considerar tacitamente revogado o art. 6º da Lei nº 64/93, de 26.08, dado a redacção deste último normativo ser igual à redacção do primeiro. Foi esta a conclusão saída da reunião de coordenação jurídica realizada em 18.10.2005 entre a DGAL, as CCDR, a DRAPL Madeira e a DROAP Açores, ao abrigo do Despacho nº 6695/2000, publicado no DR, II Série, nº 74, de 28.03.2000.
Efectivamente, o nº1 do art. 3º da Lei nº 29/87, de 30.06, estabelece que “ Os presidentes e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas ”.
Posto isto, resulta claro do nº 1 do art. 3º que os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas. Efectivamente e também com as devidas adaptações, dada a ressalva do nº1 do art. 4º da Lei nº 64/93, com as alterações introduzidas pela Lei nº 28/95, de 18 de Agosto e pela Lei nº 12/98, de 24 de Fevereiro, não ficam sujeitos os referidos eleitos locais ao regime de incompatibilidades previsto para os titulares de cargos políticos, ou seja, o de exercerem as suas funções em regime de exclusividade.
Permite assim a lei, no referido art. 3º, a acumulação dos cargos de eleitos, mesmo em regime de permanência, com o exercício de outras actividades, sejam públicas ou privadas, dado que não se faz qualquer distinção quanto à sua natureza.
O n º 2 do art. 3 º acrescenta, no entanto, que o disposto no seu n º 1 não revoga os regimes de incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais.
Ora, do ponto de vista do regime das incompatibilidades, poder-se-á assim concluir, por maioria de razão, que perante um membro da Assembleia de Freguesia que não exerce sequer o seu mandato em regime de permanência, não existe qualquer incompatibilidade no exercício cumulativo de funções.
2. Nesta análise, contudo, há que ter presente o dever que impende sobre os autarcas de, no exercício das suas funções e na prossecução do interesse público, não celebrar com a autarquia qualquer contrato, salvo de adesão ( al. b) – v) do art. 4º do Estatuto dos Eleitos Locais).
Ora, como decorre do atrás referido, a execução de uma obra consubstancia juridicamente um contrato de empreitada de obras públicas que é constituído por duas partes: o dono da obra, neste caso, a autarquia, através do órgão competente, e o adjudicado, a pessoa singular ou colectiva, que executa.
Este impedimento foi posteriormente vertido no art. 44º do CPA como princípio geral válido para toda a Administração e que preceitua o seguinte:
“1 – Nenhum titular de órgão ou agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo ou em acto ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública nos seguintes casos:
a) Quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;
b) Quando, por si ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse o seu cônjuge, algum parente ou afim em linha recta ou até ao segundo grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum
Para tais casos, dispõe o nº 2 do art. 8º da Lei nº 27/96 que “ Incorrem, igualmente, em perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos que, no exercício das suas funções, ou por causa delas, intervenham em procedimento administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado relativamente ao qual se verifique impedimento legal, visando a obtenção de vantagem patrimonial para si e para outrem”.
A perda de mandato funda-se aqui na violação de um impedimento, por conflito de interesses, a qual, no entendimento da lei, é de tal modo grave que impossibilita definitivamente a manutenção do contrato.
Atente-se, todavia, à interpretação dada, pela PGR2, ao normativo da anterior Lei da Tutela, cujo conteúdo não difere substancialmente do actual:
“6.1 (…)
Assim, o texto legal em apreço (…) apenas impõe um dever de não intervenção em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado.
(…)
No que aos contratos respeita, tal significa que o membro do órgão autárquico deve abster-se de intervir em qualquer momento do iter negocial: negociações, celebração, execução.” E se esta é a solução que emerge do texto em análise, pensa-se que a razão de ser com ela se basta e contenta, não reclamando solução mais radical.
6.3 – Este também o entendimento expresso por Nuno da Silva Salgado:
Agora segundo a Lei da Tutela (Lei nº 87/89), os membros dos órgãos autárquicos podem ter interesse no processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado em que intervenha a autarquia de que fazem parte, mas desde que não intervenham, no exercício das suas funções ou por causa delas, em tais actos, contratos ou processos, não perdem o mandato nem tal acto é nulo ou anulável.
Quer dizer: quando tenham interesse em tais actos e desde que declarem ou requeiram o seu impedimento de neles intervir como membros de órgãos autárquicos, pode a autarquia livremente praticar tais actos ou celebrar contratos com o titular do órgão declarado impedido e este de neles intervir, até directamente, não nesta última qualidade, como é óbvio, mas sim como titular do interesse particular em conflito com o interesse público. O que não pode é intervir na qualidade de autarca (…)”
Ora, em conformidade, parece-nos que embora se trate de um contrato de empreitada celebrado entre um membro da Assembleia de Freguesia e a Junta de Freguesia, não tendo aquele, dadas as suas competências, intervenção no procedimento, se não verifica, nos termos do nº 2 do citado art. 8º, impedimento gerador da perda de mandato.
2. Vejamos, por último, se se verifica alguma inelegibilidade especial, nos termos previstos do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto.
Prevê a al. c) do nº 2 da referida lei orgânica que não são elegíveis para os órgãos das autarquias locais “Os membros dos corpos sociais e os gerentes de sociedades, bem como os proprietários de empresas que tenham contrato com a autarquia não integralmente cumprido ou de execução continuada”.
Ora, cabe assim aferir se, no caso vertente, o membro da assembleia de freguesia que pretende concorrer a um procedimento de contratação pública, o faz numa das qualidades mencionadas no citado normativo, ou seja, como membro dos corpos sociais ou gerente de uma sociedade ou como proprietário de uma empresa de construção civil.
Atente-se, nesta matéria, ao que proferiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 516/2001 – Proc. nº 739/2001, publicado no DR 2ª série, de 20.12.2001, a propósito do decidido no Acórdão nº 717/93, de 15.02.1994:
«De facto – como se escreveu no citado Acórdão 4/84 “os membros dos corpos sociais, assim como os proprietários de empresas que tenham contratos não integralmente cumpridos ou de execução continuada com a autarquia não oferecem, em princípio, as garantias impostas pelas regras de disciplina e perfectibilidade que devem ser apanágio dos órgãos de gestão autárquica”
Como está em causa o “exercício isento, desinteressado e imparcial dos cargos autárquicos”, o que, em direitas contas, então interessa é que, para os órgãos de determinada autarquia local, não seja eleito quem, ao iniciar o exercício do cargo, seja membro dos corpos sociais ou proprietário de uma empresa que tenha contratos pendentes com essa autarquia. E isso, tanto no caso de a subsistência do contrato, nesse momento, se dever ao facto de se tratar de negócio cuja execução se protrai no tempo, como naquele em que, sendo um contrato de outro tipo, as obrigações que dele decorrem ainda se acharem nessa altura por cumprir, ao menos em parte.»
Entende pois este Tribunal, que a existência de contratos ainda não cumpridos ou de execução continuada entre a autarquia e um eleito local, põe em causa os princípios de isenção e imparcialidade pelos quais se deve pautar a actuação da Administração Pública.
As inelegibilidades são, pois, uma forma necessária de garantir a isenção e independência do exercício das funções autárquicas.
Desta forma, se na presente situação o membro da Assembleia de Freguesia for gerente ou proprietário de uma empresa concorrente ao referido procedimento, dever-se-á concluir, ao abrigo da al. c) do nº 2 do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, pela existência de uma inelegibilidade especial, no caso, superveniente, dado que o cidadão em causa já foi eleito.
Em suma, ainda que se considere que não existe qualquer incompatibilidade na acumulação de funções públicas com funções privadas, nem que o referido contrato de empreitada constitui um impedimento legal gerador de perda de mandato, nos termos do nº 2 do art. 8º da Lei nº 27/96, dever-se-á concluir, na hipótese do membro da Assembleia Freguesia ser gerente ou proprietário de uma empresa concorrente ao procedimento em causa, pela existência de uma inelegibilidade especial superveniente, nos termos da al. c) do nº 2 do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001.
1. J.J Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, anotada, 3ª edição, Coimbra, 1993, pág. 948
2. Parecer do CC da PGR nº 45/90 (publicado no DR, II, nº 218, de 21.09.92)
A Divisão de Apoio Jurídico
(Elisabete Maria Viegas frutuoso)
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