PMDFCI; Eficácia.
Data: quarta, 15 julho 2015
Número: DAJ 190/15
Responsáveis: António Manuel Baptista Ramos Cruz
A Câmara Municipal de …, em mensagem de correio eletrónico recebido nesta CCDRC em …, solicita parecer jurídico que esclareça, em suma, se é diretamente aplicável aos particulares, e em que circunstâncias, o seu Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI), aprovado por despacho de 27.05.2015.
Mais concretamente, para enquadrar de forma mais rigorosa a questão, considerando que está em revisão o seu PDM, e estando a sua eficácia dependente de publicação em DR, pergunta o órgão se, enquanto tal não acontece, (…) as regras do novo PMDFCI têm eficácia direta sobre os particulares ou se apenas será aplicável o previsto no Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 17/2009, de 14 de janeiro”
Respondendo ao solicitado, começaremos por dizer que sobre esta matéria, como é sabido, estabelece o D.L. 124/2006, de 28.6 (com a última alteração introduzida pelo DL n.º 83/2014, de 23/05), no seu artigo 10º – Planeamento municipal de defesa da floresta contra incêndios – nº5, que “A cartografia da rede regional de defesa da floresta contra incêndios e de risco de incêndio, constante dos PMDFCI, deve ser delimitada e regulamentada nos respetivos planos municipais de ordenamento do território.”
Interpretando e clarificando o sentido da norma, no sentido de se saber se os PMDFCI vinculam diretamente os particulares ou, pelo contrário, devem as suas regras ser transpostas para os planos municipais de ordenamento do território, vejamos agora o que é dito pelo Provedor de Justiça, na sua Recomendação nº 6/A/2009, que mantém toda a pertinência, ainda que tomando ainda como referência o anterior Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), constante do D.L. 380/99, de 22.09, entretanto revogado pelo D.L. 80/2015, de 13.05, já em vigor, que aprova o novo RJIGT, por destacar alguns princípios fundamentais da publicidade e da participação dos cidadãos:
“1 – Os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios não se enquadram no elenco fechado de instrumentos de gestão territorial criado pela Lei de Bases da Politica do Ordenamento do Território e de Urbanismo e desenvolvido pelo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, embora a instituição de condicionalismos à edificação não possa ocorrer à margem destes diplomas.
2. A cartografia da rede regional de defesa da floresta contra incêndios e de risco de incêndio, constante dos planos municipais de defesa da floresta contra incêndios, deve ser delimitada e regulamentada nos planos municipais de ordenamento do território, sob pena de omissão ilegal, por violação dos artigos 10º, nº5, e 16º, nº1, do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho, na sua redação atual.
3. A referida obrigação de transposição do conteúdo dos planos municipais de defesa da floresta contra incêndios evidencia a sua função instrumental, visto que apenas através da adaptação dos instrumentos de gestão territorial direta e imediatamente vinculativos dos particulares se pode condicionar as pretensões edificatórias concretamente apresentadas. Essa adaptação, porém, obedece ao procedimento exaustivamente regulado pelo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial”.
Salientava o Provedor de Justiça, de seguida, que, no âmbito dos procedimentos de elaboração e aprovação dos planos, tanto o requisito que é garante da cognoscibilidade e a segurança jurídica constitucionalmente exigíveis em sede de gestão territorial, o da publicidade, como o princípio nuclear da participação democrática dos cidadãos, são comuns aos planos municipais de ordenamento do território, mas alheios aos PMDFCI.
É por essa mesma razão que o anterior RJIGT, estabelecia, no nº2 do artigo 2º, que apenas os planos municipais e especiais de ordenamento do território vinculavam direta e imediatamente os particulares, para além das entidades públicas.
Antes de passarmos a analisar o que sobre esta matéria dispõe o novo RJIGT, devemos examinar o que dispõe a nova Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo (Lei n º 31/2014, de 30/05) sobre a matéria.
Assim, prescreve o n º 2 do artigo 46 º deste diploma que os planos territoriais de âmbito intermunicipal e municipal vinculam as entidades públicas e ainda, direta e imediatamente os particulares (os planos especiais vão deixar de vincular diretamente os particulares no prazo máximo de três anos a contar da entrada em vigor da lei de bases, nos termos do seu artigo 78 º), acrescentando todavia o seu número 3 que embora os programas territoriais vinculem diretamente as entidades públicas tal não prejudica a vinculação direta e imediata dos particulares relativamente a normas legais ou regulamentares em matéria de recursos florestais.
Consideramos, no entanto, que esta nova norma não tem exequibilidade direta, dado não definir nem o âmbito desta aplicação direta das normas em matéria de recursos florestais, nem os procedimentos essenciais a essa mesma exequibilidade, entre os quais nos permitimos destacar a necessária publicidade dos mesmos.
Uma dúvida legitima sobre esta matéria tem-se colocado, no entanto, com o novo RJIGT, o qual, reproduzindo, não literalmente, mas no essencial, o que nessa parte estabelece já o nº3 do artigo 46º da Lei nº 31/2014, de 30/05, atrás referido, prescreve no artigo 3º, o seguinte:
Artigo 3.º
Vinculação jurídica
1 — Os programas territoriais vinculam as entidades públicas.
2 — Os planos territoriais vinculam as entidades públicas e, direta e imediatamente, os particulares.
3 — O disposto nos números anteriores não prejudica a vinculação direta e imediata dos particulares relativamente às normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais.
(sublinhado nosso)
Sobre este artigo, no entanto, particularmente sobre o nº3, remetemos para o comentário feito pela autora Fernanda Paula Oliveira 1,quando, começando por questionar-se se os PMDFCI são abrangidos pela regra enunciada, responde, de seguida, que de acordo com o seu entendimento, faltando-lhes as exigências de publicidade, essencial para a produção de efeitos de qualquer ato normativo (invocando o artigo 119, nº2, da CRP) e a participação dos interessados (nº5 do artigo 65º da CRP), não podem os PMDFCI integrar o conceito de normas de intervenção sobre a ocupação e utilização de espaços florestais para efeitos da norma.
Em consequência, continua a autora,
“De forma a dar a esta norma um sentido útil e com vista a garantir a unidade do sistema de gestão territorial, consideramos que o nº3 do artigo 3º do RJIGT apenas poderá ter aplicação quando for aprovado um regime legal específico que venha determinar e concretizar que normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais (e em que circunstâncias) tiram partido deste regime, sendo certo, enquanto tal não acontecer, que apenas poderão ter aplicação imediata em relação aos particulares normas com o conteúdo referido que decorram diretamente (ou estejam integradas) da lei, como é o caso do disposto no nº3 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho (na versão do Decreto-Lei nº 17/2009, de 14 de janeiro”.
Face ao exposto, quanto a esta questão, devemos concluir que, face ao novo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, aprovado pelo D.L. 80/2015, de 13.05 (revoga o D.L. 380/99, de 16.12), e em consonância com os princípios constitucionais da publicidade e participação dos interessados na elaboração dos instrumentos de planeamento urbanístico e de quaisquer outros instrumentos de planeamento físico do território, deve interpretar-se o nº3 do seu artigo 3º, no sentido de que o mesmo apenas poderá ter aplicação, e voltamos a citar a autora Fernanda Paula Oliveira, “(…) quando for aprovado um regime legal específico que venha determinar e concretizar que normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais (e em que circunstâncias) tiram partido deste regime.”
Ainda tomando como referência a aprovação do novo PMDFCI, pergunta de seguida a Câmara Municipal, e citamos, “(…) se nos processos com informação prévia favorável, se mantém válida a decisão favorável no prazo de um ano até á apresentação do pedido de licenciamento ou comunicação prévia, ainda que entre em vigor nesse período novo PMDFCI”.
Sobre esta matéria, deverá, antes de mais, considerar-se a resposta dada atrás sobre a eficácia dos PDMFCI.
Apenas nos resta acrescentar que, em termos gerais, devem ter-se em atenção as regras sobre os efeitos da informação prévia favorável, no artigo 17º do RJUE, do qual claramente decorre, conjugados os seus números 1 e 3, que a informação prévia favorável vincula as entidades competentes na decisão sobre eventual pedido de licenciamento e no controlo sucessivo de operações urbanísticas sujeitas a comunicação prévia, se estes forem apresentados no prazo de um ano após a decisão favorável do pedido de informação prévia.
Divisão de Apoio Jurídico
(António Ramos)
1. Fernanda Paula Oliveira “Notas e Comentários à Revisão do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial de 2015”, 2015, Almedina, pag. 8 e ss.
PMDFCI; Eficácia.
PMDFCI; Eficácia.
Data: quarta, 15 julho 2015
Número: DAJ 190/15
Responsáveis: António Manuel Baptista Ramos Cruz
A Câmara Municipal de …, em mensagem de correio eletrónico recebido nesta CCDRC em …, solicita parecer jurídico que esclareça, em suma, se é diretamente aplicável aos particulares, e em que circunstâncias, o seu Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI), aprovado por despacho de 27.05.2015.
Mais concretamente, para enquadrar de forma mais rigorosa a questão, considerando que está em revisão o seu PDM, e estando a sua eficácia dependente de publicação em DR, pergunta o órgão se, enquanto tal não acontece, (…) as regras do novo PMDFCI têm eficácia direta sobre os particulares ou se apenas será aplicável o previsto no Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 17/2009, de 14 de janeiro”
Respondendo ao solicitado, começaremos por dizer que sobre esta matéria, como é sabido, estabelece o D.L. 124/2006, de 28.6 (com a última alteração introduzida pelo DL n.º 83/2014, de 23/05), no seu artigo 10º – Planeamento municipal de defesa da floresta contra incêndios – nº5, que “A cartografia da rede regional de defesa da floresta contra incêndios e de risco de incêndio, constante dos PMDFCI, deve ser delimitada e regulamentada nos respetivos planos municipais de ordenamento do território.”
Interpretando e clarificando o sentido da norma, no sentido de se saber se os PMDFCI vinculam diretamente os particulares ou, pelo contrário, devem as suas regras ser transpostas para os planos municipais de ordenamento do território, vejamos agora o que é dito pelo Provedor de Justiça, na sua Recomendação nº 6/A/2009, que mantém toda a pertinência, ainda que tomando ainda como referência o anterior Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), constante do D.L. 380/99, de 22.09, entretanto revogado pelo D.L. 80/2015, de 13.05, já em vigor, que aprova o novo RJIGT, por destacar alguns princípios fundamentais da publicidade e da participação dos cidadãos:
“1 – Os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios não se enquadram no elenco fechado de instrumentos de gestão territorial criado pela Lei de Bases da Politica do Ordenamento do Território e de Urbanismo e desenvolvido pelo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, embora a instituição de condicionalismos à edificação não possa ocorrer à margem destes diplomas.
2. A cartografia da rede regional de defesa da floresta contra incêndios e de risco de incêndio, constante dos planos municipais de defesa da floresta contra incêndios, deve ser delimitada e regulamentada nos planos municipais de ordenamento do território, sob pena de omissão ilegal, por violação dos artigos 10º, nº5, e 16º, nº1, do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho, na sua redação atual.
3. A referida obrigação de transposição do conteúdo dos planos municipais de defesa da floresta contra incêndios evidencia a sua função instrumental, visto que apenas através da adaptação dos instrumentos de gestão territorial direta e imediatamente vinculativos dos particulares se pode condicionar as pretensões edificatórias concretamente apresentadas. Essa adaptação, porém, obedece ao procedimento exaustivamente regulado pelo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial”.
Salientava o Provedor de Justiça, de seguida, que, no âmbito dos procedimentos de elaboração e aprovação dos planos, tanto o requisito que é garante da cognoscibilidade e a segurança jurídica constitucionalmente exigíveis em sede de gestão territorial, o da publicidade, como o princípio nuclear da participação democrática dos cidadãos, são comuns aos planos municipais de ordenamento do território, mas alheios aos PMDFCI.
É por essa mesma razão que o anterior RJIGT, estabelecia, no nº2 do artigo 2º, que apenas os planos municipais e especiais de ordenamento do território vinculavam direta e imediatamente os particulares, para além das entidades públicas.
Antes de passarmos a analisar o que sobre esta matéria dispõe o novo RJIGT, devemos examinar o que dispõe a nova Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo (Lei n º 31/2014, de 30/05) sobre a matéria.
Assim, prescreve o n º 2 do artigo 46 º deste diploma que os planos territoriais de âmbito intermunicipal e municipal vinculam as entidades públicas e ainda, direta e imediatamente os particulares (os planos especiais vão deixar de vincular diretamente os particulares no prazo máximo de três anos a contar da entrada em vigor da lei de bases, nos termos do seu artigo 78 º), acrescentando todavia o seu número 3 que embora os programas territoriais vinculem diretamente as entidades públicas tal não prejudica a vinculação direta e imediata dos particulares relativamente a normas legais ou regulamentares em matéria de recursos florestais.
Consideramos, no entanto, que esta nova norma não tem exequibilidade direta, dado não definir nem o âmbito desta aplicação direta das normas em matéria de recursos florestais, nem os procedimentos essenciais a essa mesma exequibilidade, entre os quais nos permitimos destacar a necessária publicidade dos mesmos.
Uma dúvida legitima sobre esta matéria tem-se colocado, no entanto, com o novo RJIGT, o qual, reproduzindo, não literalmente, mas no essencial, o que nessa parte estabelece já o nº3 do artigo 46º da Lei nº 31/2014, de 30/05, atrás referido, prescreve no artigo 3º, o seguinte:
Artigo 3.º
Vinculação jurídica
1 — Os programas territoriais vinculam as entidades públicas.
2 — Os planos territoriais vinculam as entidades públicas e, direta e imediatamente, os particulares.
3 — O disposto nos números anteriores não prejudica a vinculação direta e imediata dos particulares relativamente às normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais.
(sublinhado nosso)
Sobre este artigo, no entanto, particularmente sobre o nº3, remetemos para o comentário feito pela autora Fernanda Paula Oliveira 1,quando, começando por questionar-se se os PMDFCI são abrangidos pela regra enunciada, responde, de seguida, que de acordo com o seu entendimento, faltando-lhes as exigências de publicidade, essencial para a produção de efeitos de qualquer ato normativo (invocando o artigo 119, nº2, da CRP) e a participação dos interessados (nº5 do artigo 65º da CRP), não podem os PMDFCI integrar o conceito de normas de intervenção sobre a ocupação e utilização de espaços florestais para efeitos da norma.
Em consequência, continua a autora,
“De forma a dar a esta norma um sentido útil e com vista a garantir a unidade do sistema de gestão territorial, consideramos que o nº3 do artigo 3º do RJIGT apenas poderá ter aplicação quando for aprovado um regime legal específico que venha determinar e concretizar que normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais (e em que circunstâncias) tiram partido deste regime, sendo certo, enquanto tal não acontecer, que apenas poderão ter aplicação imediata em relação aos particulares normas com o conteúdo referido que decorram diretamente (ou estejam integradas) da lei, como é o caso do disposto no nº3 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho (na versão do Decreto-Lei nº 17/2009, de 14 de janeiro”.
Face ao exposto, quanto a esta questão, devemos concluir que, face ao novo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, aprovado pelo D.L. 80/2015, de 13.05 (revoga o D.L. 380/99, de 16.12), e em consonância com os princípios constitucionais da publicidade e participação dos interessados na elaboração dos instrumentos de planeamento urbanístico e de quaisquer outros instrumentos de planeamento físico do território, deve interpretar-se o nº3 do seu artigo 3º, no sentido de que o mesmo apenas poderá ter aplicação, e voltamos a citar a autora Fernanda Paula Oliveira, “(…) quando for aprovado um regime legal específico que venha determinar e concretizar que normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais (e em que circunstâncias) tiram partido deste regime.”
Ainda tomando como referência a aprovação do novo PMDFCI, pergunta de seguida a Câmara Municipal, e citamos, “(…) se nos processos com informação prévia favorável, se mantém válida a decisão favorável no prazo de um ano até á apresentação do pedido de licenciamento ou comunicação prévia, ainda que entre em vigor nesse período novo PMDFCI”.
Sobre esta matéria, deverá, antes de mais, considerar-se a resposta dada atrás sobre a eficácia dos PDMFCI.
Apenas nos resta acrescentar que, em termos gerais, devem ter-se em atenção as regras sobre os efeitos da informação prévia favorável, no artigo 17º do RJUE, do qual claramente decorre, conjugados os seus números 1 e 3, que a informação prévia favorável vincula as entidades competentes na decisão sobre eventual pedido de licenciamento e no controlo sucessivo de operações urbanísticas sujeitas a comunicação prévia, se estes forem apresentados no prazo de um ano após a decisão favorável do pedido de informação prévia.
Divisão de Apoio Jurídico
(António Ramos)
1. Fernanda Paula Oliveira “Notas e Comentários à Revisão do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial de 2015”, 2015, Almedina, pag. 8 e ss.
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