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Home Pareceres Jurídicos até 2017 Sector empresarial local, membro da assembleia municipal, funções de direcção.

Sector empresarial local, membro da assembleia municipal, funções de direcção.

Solicitou-nos a Câmara Municipal de …, através do seu ofício n º …, de …, um parecer jurídico sobre a questão mencionada em epígrafe, ou seja, se as funções de direcção (cargo de director-geral) que se pretendem atribuir a um membro da assembleia municipal de Ansião, município maioritário numa empresa do sector empresarial local, são ou não funções executivas nessa mesma empresa e, se a resposta for positiva, se se enquadram numa situação de incompatibilidade.

Sobre a questão formulada teremos de abordar sobre duas perspectivas, isto é, se o caso apresentado se configura ou não como incompatibilidade ou como inelegibilidade (hipótese não equacionada pelo município de Ansião mas que deve ser suscitada).
No entanto, previamente, teremos que mencionar o regime jurídico do exercício do cargo dos membros das assembleias municipais.

I
Os membros das assembleias municipais são eleitos locais em regime de não permanência, de acordo com o Estatuto dos Eleitos Locais.
Os Eleitos Locais são, de acordo com o artigo 1º do estatuto dos eleitos,1 os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias.
Estes eleitos podem desempenhar funções em regime de permanência, em regime de meio tempo e em regime de não permanência.
Os presidentes das Câmaras Municipais, os presidentes das Juntas de Freguesia , em regime de tempo inteiro, e os vereadores a tempo inteiro são classificados inequivocamente em regime de permanência ( artigo 2º do referido estatuto ).
Os membros das assembleias deliberativas quer dos municípios quer das freguesias bem como os vereadores e os vogais das juntas que não estejam nem em regime de tempo inteiro nem em regime de meio tempo são considerados em regime de não permanência.
 
No que respeita ao regime de incompatibilidades o exercício cumulativo de actividades públicas ou privadas deixou de ser considerado incompatível com o exercício de funções autárquicas, dado o que  estabelecia o artigo 6 º  da Lei nº 64/93, de 26/08.
As incompatibilidades são um corolário do princípio constitucional da imparcialidade – artigo 266º nº 2 da CRP – e significam a impossibilidade de acumular simultaneamente dois cargos ou funções por a lei considerar em abstracto, independentemente da pessoa em concreto que os acumula, que essa acumulação é susceptível de pôr em causa a isenção e imparcialidade exigida ao cargo.

A PGR , no parecer nº 100/82, de 27/07/82, menciona que « as incompatibilidades visam proteger a independência das funções » e  Vital  Moreira e Gomes Canotilho2 referem que o sistema das incompatibilidades visa garantir não só o princípio da imparcialidade da Administração mas também o princípio da eficiência ( boa administração ).
Efectivamente, o nº1 do art. 6º da Lei nº 64/93, de 26 de Agosto, repristinado na sua redacção originária pela Lei nº 12/98, de 24 de Fevereiro, estabelecia que “ Os presidentes e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas ”.
A norma deste artigo deve, presentemente, ser lida à luz do que ora se dispõe, sobre a matéria, no Estatuto dos Eleitos Locais, após as alterações nele introduzidas pela Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro. Em reunião de coordenação jurídica realizada em 18/10/2005, entre a DGAL, as CCDR , a DRAPL Madeira e a DROAP Açores, ao abrigo do despacho n º 6695/2000, publicado no DR,  II série, n º  74, de 28/03/2000, concluiu-se o seguinte:
« Os números 1 e 2 do artigo  3 º da lei n º 29/87, de 30/06, alterada pela lei n º 52-A/2005, de 10/10, revogaram tacitamente os n ºs 1 e 2 do artigo 6 º da lei n º 64/93, de 26/08, dado que contêm a mesma redacção, com excepção da expressão « a tempo inteiro ou parcial » expressa no revogado n º 1».
É o seguinte o texto dos números 1 e 2 deste artigo 3 º:
«1-Os presidente e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas.
2- O disposto no número anterior não revoga os regimes de incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais.»

Posto isto, resulta claro do nº 1 deste  art. 3 º do Estatuto dos Eleitos Locais ( EEL )que os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas.
Permite assim a lei, neste artigo, a acumulação dos cargos de eleitos, mesmo em regime de permanência, com o exercício de outras actividades, sejam públicas ou privadas, dado que não se faz qualquer distinção quanto à sua natureza.
No entanto o sistema legal vigente excepciona duas situações sobre as quais não permite a referida acumulação:
Quando as funções públicas a acumular correspondam a titulares de órgãos de soberania, de cargos políticos ou de altos cargos públicos, uma vez que são cargos exercidos em regime de exclusividade (arts. 1º, 2º e 4º da Lei nº 64/93);

Quando as funções a exercer correspondam a cargos ou actividades profissionais relativamente aos quais outras leis estabeleçam regimes de incompatibilidades ou impedimentos de acumulação com as referidas funções autárquicas (art. nº2 do artigo 3 º do actual EEL).
Ora, o artigo 47 º, n º 2, da lei do sector empresarial local, lei n º 53-F/2006, de 29/12, estabelece uma incompatibilidade entre o exercício simultâneo de mandato em assembleia municipal e de funções executivas nas empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas detidas ou participadas pelo município no qual foi eleito.
Ora, quando esta norma se refere a funções executivas nas empresas municipais  está a referir-se  ao exercício de funções de gestor  público.
Há, assim, que determinar o estatuto o estatuto do gestor público, previsto no decreto-lei n º 71/2007, de 27/03, aplicável subsidiariamente por remissão do n º 4 do artigo 47 º lei n º 53-F/2006, de 29/12.
Gestor público é quem seja designado para órgão de gestão ou de administração das empresas públicas ( e por aplicação subsidiária do n º 4 do artigo 47 º lei n º 53-F/2006, de 29/12, quem seja designado para os órgãos de gestão ou de administração de empresas do sector empresarial local)
Ora, no caso concreto que nos foi apresentado não se equaciona a nomeação do membro da assembleia municipal para o órgão de administração da sociedade anónima em causa ( sociedade integrada no sector empresarial local ) mas sim a atribuição de  funções de director-geral, que nós interpretámos como funções de dirigente nessa empresa e não como a integração no órgão de administração da sociedade anónima.
Assim sendo, não se trata de um problema de  incompatibilidade, dado que não se pretende nomear o membro da assembleia municipal para o órgão de administração da empresa do sector empresarial local os eleitos locais mas sim atribuir-lhe funções dirigentes na empresa, funções essa que não estão abrangidas por qualquer incompatibilidade, dados os termos já citados do nº 1 deste  art. 3 º do Estatuto dos Eleitos Locais ( EEL ) ( os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas). Quanto à específica incompatibilidade dos membros das assembleias municipais relativamente a empresas do sector empresarial local, a lei só prevê essa incompatibilidade no que respeita aos gestores públicos e a funções executivas, não estando essa hipótese equacionada, de acordo com os dados que nos foram fornecidos pela Câmara Municipal.
II
Mas para além das incompatibilidades devemos, ainda, verificar, se as funções que pretendem atribuir  ao membro da assembleia municipal estão  ou não incluídas  nas inelegibilidades dos eleitos locais actualmente vigentes.
As inelegibilidades são, também, um corolário do princípio constitucional da imparcialidade – artigo 266º nº 2 da CRP – e determinam a impossibilidade de candidatura às eleições locais e a própria perda de mandato, se ocorrerem após a eleição, e constituem um obstáculo dirimente da regular eleição do atingido.3

Segundo a PGR, parecer nº19/87, publicado no DR nº 90, II série, de 18/04/88, a existência de um regime de inelegibilidades visa assegurar garantias de dignidade e genuinidade ao acto eleitoral e, simultaneamente, evitar a eleição de quem, pelas funções que exerce  ( ou outras razões que retiram a imparcialidade ) se entende que não deve representar um órgão autárquico. 

As inelegibilidades estão actualmente previstas nos artigos 6º e 7º da lei orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto.

Mais especificamente,  a alínea d), do n º 1 do artigo 7 º da referida lei orgânica prescreve o seguinte:

« Os funcionários dos órgãos das autarquias locais ou dos entes por estas constituídos ou em que detenham posição maioritária que exerçam funções de direcção, salvo no caso de suspensão obrigatória de funções desde  a data de entrega da lista de candidatura em que se integrem.».

Sobre este preceito a PGR no seu Parecer n º 112/2002, publicado no DR, n º 261, de 11/11/2003, concluiu sobre esta matéria o seguinte:

Esta inelegibilidade atinge tanto os funcionários ( transpondo para as actuais leis, qualquer tipo trabalhador  com emprego público, a que se aplique a lei n º 12-A/2008) como  qualquer trabalhador  das entidades constituídas pelas autarquias locais ou em que estas detenham posição maioritária, independentemente da natureza jurídica do vínculo ( público ou privado ), desde que se trate de subordinação jurídica de carácter profissional e permanente e exerçam funções de direcção .

Devem excluir-se, segundo o mesmo parecer, das inelegibilidades os titulares dos órgãos sociais, dado que em relação  a estes não há vínculo de subordinação jurídica( «  a sociedade não tem sobre o administrador um poder de direcção, com a intensidade característica da relação laboral» ), tendo aliás o Tribunal Constitucional concluído que os membros dos  conselhos de administração de empresas públicas municipais, cuja nomeação e exoneração é da competência da câmara municipal, com um mandato de quatro anos, coincidente com o dos titulares dos órgãos autárquicos, não se encontram numa relação de subordinação jurídica no âmbito da empresa pública, gozando antes da autonomia perante a empresa, que permite diferenciar dos trabalhadores subordinados).

No que respeita à interpretação de funções de direcção em entes em que as autarquias locais detenham posição maioritária, entende o Parecer da PGR que estamos  citar, que se deve entender que exercem funções de direcção também os  trabalhadores das empresas municipais, participadas, entidades fundacionais ou institucionais ou de associações de municípios que tenham  a responsabilidade de superintender, coordenar ou chefiar a actividade de um ou mais sectores, serviços ou departamentos na directa dependência dos órgãos de administração ou de gestão».

É, assim, para nós, inequívoco, que as funções de director-geral numa empresa são funções de direcção, pelo que pretendendo-se que as mesmas sejam exercidas por um membro de uma assembleia municipal dum município que detém nessa empresa uma participação de 48% o referido eleito , se as aceitar, coloca-se numa situação superveniente de inelegibilidade.

 Por outro lado, para  a existência desta inelegibilidade é suficiente que se exerçam funções de direcção numa empresa participada maioritariamente pela autarquia, isto é, não é necessário que a autarquia detenha a maioria do capital mas apenas que seja maioritária.

E tal entende-se bem se atendermos que na ratio das inelegibilidades está « preservar  a independência  do exercício de cargos electivos autárquicos e, por outro, preservar e garantir a independência e imparcialidade do poder local»4, ora essa  mesma ratio justifica  a existência dessa inelegibilidade também quando a autarquia é apenas maioritária mas não detenha a maioria do capital social, dado que são os mesmos os valores que se pretende proteger.

 

Como se sabe as inelegibilidades supervenientes ( isto é situações de  inelegibilidade criadas após a eleição ) são uma causa de perda de mandato, de acordo com a alínea b) do n º 1 do artigo 8 º da lei n º 27/96, de 1 de Agosto.
 

 

Em conclusão:

• No caso concreto que nos foi apresentado não se equaciona a nomeação do membro da assembleia municipal para o órgão de administração da sociedade anónima em causa ( sociedade integrada no sector empresarial local ) mas sim a atribuição de  funções de director-geral, que nós interpretámos como funções de dirigente nessa empresa e não como a integração no órgão de administração da sociedade anónima.
• Assim sendo, não se trata de um problema de  incompatibilidade, dado que não se pretende nomear o membro da assembleia municipal para o órgão de administração da empresa do sector empresarial local mas sim atribuir-lhe funções dirigentes na empresa, funções essas que não estão abrangidas por qualquer incompatibilidade, dados os termos do nº 1 deste  art. 3 º do Estatuto dos Eleitos Locais ( EEL ) ( os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas).                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
• Quanto à específica incompatibilidade dos membros das assembleias municipais relativamente a empresas do sector empresarial local, a lei só prevê essa incompatibilidade no que respeita aos gestores públicos e a funções executivas, não estando essa hipótese equacionada, de acordo com os dados que nos foram fornecidos pela Câmara Municipal.
• Exercem funções de direcção os  trabalhadores das empresas municipais, participadas, entidades fundacionais ou institucionais ou de associações de municípios que tenham  a responsabilidade de superintender, coordenar ou chefiar a actividade de um ou mais sectores, serviços ou departamentos na directa dependência dos órgãos de administração ou de gestão.
• As funções de director-geral numa empresa são funções de direcção, pelo que pretendendo-se que as mesmas sejam exercidas por um membro de uma assembleia municipal dum município que detém nessa empresa uma participação de 48% o referido eleito, se as aceitar, coloca-se numa situação superveniente de inelegibilidade.

• As inelegibilidades supervenientes ( isto é situações de  inelegibilidade criadas após a eleição ) são uma causa de perda de mandato, de acordo com a alínea b) do n º 1 do artigo 8 º da lei n º 27/96, de 1 de Agosto.

 

Maria José L. Castanheira Neves
(Directora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local)

1. Lei nº 29/87, de 30/06, com as alterações introduzidas  pelas leis  97/89, de 15/12, 1/91, de 10/01, 11/91, de 17/05, 11/96, de 18/04, 127/97, de 11/12, 50/99, de 24/06, e 86/2001, de 10/08, 22/2004, de 17/06, e 52-A/2005, de 10/10.

2. J. J. Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, anotada, Coimbra Editora., pag 948.

3. Marcel Waline, Inélegibilité et incompatibilité, Revue du droit public et de la science politique, nº 3, 1966.

4. Duarte Silva, « As inelegibikidades nas eleições autárquicas» , a Jurisprudência do Tribunal Constituciobnal, Aequitas Editorial Notícias, Lisboa, 1993, pag. 174, citado no Parecer da PGR n º 112/2002, publicado no DR, n º 261, de 11/11/2003.

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Sector empresarial local, membro da assembleia municipal, funções de direcção.

Sector empresarial local, membro da assembleia municipal, funções de direcção.

Solicitou-nos a Câmara Municipal de …, através do seu ofício n º …, de …, um parecer jurídico sobre a questão mencionada em epígrafe, ou seja, se as funções de direcção (cargo de director-geral) que se pretendem atribuir a um membro da assembleia municipal de Ansião, município maioritário numa empresa do sector empresarial local, são ou não funções executivas nessa mesma empresa e, se a resposta for positiva, se se enquadram numa situação de incompatibilidade.

Sobre a questão formulada teremos de abordar sobre duas perspectivas, isto é, se o caso apresentado se configura ou não como incompatibilidade ou como inelegibilidade (hipótese não equacionada pelo município de Ansião mas que deve ser suscitada).
No entanto, previamente, teremos que mencionar o regime jurídico do exercício do cargo dos membros das assembleias municipais.

I
Os membros das assembleias municipais são eleitos locais em regime de não permanência, de acordo com o Estatuto dos Eleitos Locais.
Os Eleitos Locais são, de acordo com o artigo 1º do estatuto dos eleitos,1 os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias.
Estes eleitos podem desempenhar funções em regime de permanência, em regime de meio tempo e em regime de não permanência.
Os presidentes das Câmaras Municipais, os presidentes das Juntas de Freguesia , em regime de tempo inteiro, e os vereadores a tempo inteiro são classificados inequivocamente em regime de permanência ( artigo 2º do referido estatuto ).
Os membros das assembleias deliberativas quer dos municípios quer das freguesias bem como os vereadores e os vogais das juntas que não estejam nem em regime de tempo inteiro nem em regime de meio tempo são considerados em regime de não permanência.
 
No que respeita ao regime de incompatibilidades o exercício cumulativo de actividades públicas ou privadas deixou de ser considerado incompatível com o exercício de funções autárquicas, dado o que  estabelecia o artigo 6 º  da Lei nº 64/93, de 26/08.
As incompatibilidades são um corolário do princípio constitucional da imparcialidade – artigo 266º nº 2 da CRP – e significam a impossibilidade de acumular simultaneamente dois cargos ou funções por a lei considerar em abstracto, independentemente da pessoa em concreto que os acumula, que essa acumulação é susceptível de pôr em causa a isenção e imparcialidade exigida ao cargo.

A PGR , no parecer nº 100/82, de 27/07/82, menciona que « as incompatibilidades visam proteger a independência das funções » e  Vital  Moreira e Gomes Canotilho2 referem que o sistema das incompatibilidades visa garantir não só o princípio da imparcialidade da Administração mas também o princípio da eficiência ( boa administração ).
Efectivamente, o nº1 do art. 6º da Lei nº 64/93, de 26 de Agosto, repristinado na sua redacção originária pela Lei nº 12/98, de 24 de Fevereiro, estabelecia que “ Os presidentes e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas ”.
A norma deste artigo deve, presentemente, ser lida à luz do que ora se dispõe, sobre a matéria, no Estatuto dos Eleitos Locais, após as alterações nele introduzidas pela Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro. Em reunião de coordenação jurídica realizada em 18/10/2005, entre a DGAL, as CCDR , a DRAPL Madeira e a DROAP Açores, ao abrigo do despacho n º 6695/2000, publicado no DR,  II série, n º  74, de 28/03/2000, concluiu-se o seguinte:
« Os números 1 e 2 do artigo  3 º da lei n º 29/87, de 30/06, alterada pela lei n º 52-A/2005, de 10/10, revogaram tacitamente os n ºs 1 e 2 do artigo 6 º da lei n º 64/93, de 26/08, dado que contêm a mesma redacção, com excepção da expressão « a tempo inteiro ou parcial » expressa no revogado n º 1».
É o seguinte o texto dos números 1 e 2 deste artigo 3 º:
«1-Os presidente e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas.
2- O disposto no número anterior não revoga os regimes de incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais.»

Posto isto, resulta claro do nº 1 deste  art. 3 º do Estatuto dos Eleitos Locais ( EEL )que os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas.
Permite assim a lei, neste artigo, a acumulação dos cargos de eleitos, mesmo em regime de permanência, com o exercício de outras actividades, sejam públicas ou privadas, dado que não se faz qualquer distinção quanto à sua natureza.
No entanto o sistema legal vigente excepciona duas situações sobre as quais não permite a referida acumulação:
Quando as funções públicas a acumular correspondam a titulares de órgãos de soberania, de cargos políticos ou de altos cargos públicos, uma vez que são cargos exercidos em regime de exclusividade (arts. 1º, 2º e 4º da Lei nº 64/93);

Quando as funções a exercer correspondam a cargos ou actividades profissionais relativamente aos quais outras leis estabeleçam regimes de incompatibilidades ou impedimentos de acumulação com as referidas funções autárquicas (art. nº2 do artigo 3 º do actual EEL).
Ora, o artigo 47 º, n º 2, da lei do sector empresarial local, lei n º 53-F/2006, de 29/12, estabelece uma incompatibilidade entre o exercício simultâneo de mandato em assembleia municipal e de funções executivas nas empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas detidas ou participadas pelo município no qual foi eleito.
Ora, quando esta norma se refere a funções executivas nas empresas municipais  está a referir-se  ao exercício de funções de gestor  público.
Há, assim, que determinar o estatuto o estatuto do gestor público, previsto no decreto-lei n º 71/2007, de 27/03, aplicável subsidiariamente por remissão do n º 4 do artigo 47 º lei n º 53-F/2006, de 29/12.
Gestor público é quem seja designado para órgão de gestão ou de administração das empresas públicas ( e por aplicação subsidiária do n º 4 do artigo 47 º lei n º 53-F/2006, de 29/12, quem seja designado para os órgãos de gestão ou de administração de empresas do sector empresarial local)
Ora, no caso concreto que nos foi apresentado não se equaciona a nomeação do membro da assembleia municipal para o órgão de administração da sociedade anónima em causa ( sociedade integrada no sector empresarial local ) mas sim a atribuição de  funções de director-geral, que nós interpretámos como funções de dirigente nessa empresa e não como a integração no órgão de administração da sociedade anónima.
Assim sendo, não se trata de um problema de  incompatibilidade, dado que não se pretende nomear o membro da assembleia municipal para o órgão de administração da empresa do sector empresarial local os eleitos locais mas sim atribuir-lhe funções dirigentes na empresa, funções essa que não estão abrangidas por qualquer incompatibilidade, dados os termos já citados do nº 1 deste  art. 3 º do Estatuto dos Eleitos Locais ( EEL ) ( os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas). Quanto à específica incompatibilidade dos membros das assembleias municipais relativamente a empresas do sector empresarial local, a lei só prevê essa incompatibilidade no que respeita aos gestores públicos e a funções executivas, não estando essa hipótese equacionada, de acordo com os dados que nos foram fornecidos pela Câmara Municipal.
II
Mas para além das incompatibilidades devemos, ainda, verificar, se as funções que pretendem atribuir  ao membro da assembleia municipal estão  ou não incluídas  nas inelegibilidades dos eleitos locais actualmente vigentes.
As inelegibilidades são, também, um corolário do princípio constitucional da imparcialidade – artigo 266º nº 2 da CRP – e determinam a impossibilidade de candidatura às eleições locais e a própria perda de mandato, se ocorrerem após a eleição, e constituem um obstáculo dirimente da regular eleição do atingido.3

Segundo a PGR, parecer nº19/87, publicado no DR nº 90, II série, de 18/04/88, a existência de um regime de inelegibilidades visa assegurar garantias de dignidade e genuinidade ao acto eleitoral e, simultaneamente, evitar a eleição de quem, pelas funções que exerce  ( ou outras razões que retiram a imparcialidade ) se entende que não deve representar um órgão autárquico. 

As inelegibilidades estão actualmente previstas nos artigos 6º e 7º da lei orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto.

Mais especificamente,  a alínea d), do n º 1 do artigo 7 º da referida lei orgânica prescreve o seguinte:

« Os funcionários dos órgãos das autarquias locais ou dos entes por estas constituídos ou em que detenham posição maioritária que exerçam funções de direcção, salvo no caso de suspensão obrigatória de funções desde  a data de entrega da lista de candidatura em que se integrem.».

Sobre este preceito a PGR no seu Parecer n º 112/2002, publicado no DR, n º 261, de 11/11/2003, concluiu sobre esta matéria o seguinte:

Esta inelegibilidade atinge tanto os funcionários ( transpondo para as actuais leis, qualquer tipo trabalhador  com emprego público, a que se aplique a lei n º 12-A/2008) como  qualquer trabalhador  das entidades constituídas pelas autarquias locais ou em que estas detenham posição maioritária, independentemente da natureza jurídica do vínculo ( público ou privado ), desde que se trate de subordinação jurídica de carácter profissional e permanente e exerçam funções de direcção .

Devem excluir-se, segundo o mesmo parecer, das inelegibilidades os titulares dos órgãos sociais, dado que em relação  a estes não há vínculo de subordinação jurídica( «  a sociedade não tem sobre o administrador um poder de direcção, com a intensidade característica da relação laboral» ), tendo aliás o Tribunal Constitucional concluído que os membros dos  conselhos de administração de empresas públicas municipais, cuja nomeação e exoneração é da competência da câmara municipal, com um mandato de quatro anos, coincidente com o dos titulares dos órgãos autárquicos, não se encontram numa relação de subordinação jurídica no âmbito da empresa pública, gozando antes da autonomia perante a empresa, que permite diferenciar dos trabalhadores subordinados).

No que respeita à interpretação de funções de direcção em entes em que as autarquias locais detenham posição maioritária, entende o Parecer da PGR que estamos  citar, que se deve entender que exercem funções de direcção também os  trabalhadores das empresas municipais, participadas, entidades fundacionais ou institucionais ou de associações de municípios que tenham  a responsabilidade de superintender, coordenar ou chefiar a actividade de um ou mais sectores, serviços ou departamentos na directa dependência dos órgãos de administração ou de gestão».

É, assim, para nós, inequívoco, que as funções de director-geral numa empresa são funções de direcção, pelo que pretendendo-se que as mesmas sejam exercidas por um membro de uma assembleia municipal dum município que detém nessa empresa uma participação de 48% o referido eleito , se as aceitar, coloca-se numa situação superveniente de inelegibilidade.

 Por outro lado, para  a existência desta inelegibilidade é suficiente que se exerçam funções de direcção numa empresa participada maioritariamente pela autarquia, isto é, não é necessário que a autarquia detenha a maioria do capital mas apenas que seja maioritária.

E tal entende-se bem se atendermos que na ratio das inelegibilidades está « preservar  a independência  do exercício de cargos electivos autárquicos e, por outro, preservar e garantir a independência e imparcialidade do poder local»4, ora essa  mesma ratio justifica  a existência dessa inelegibilidade também quando a autarquia é apenas maioritária mas não detenha a maioria do capital social, dado que são os mesmos os valores que se pretende proteger.

 

Como se sabe as inelegibilidades supervenientes ( isto é situações de  inelegibilidade criadas após a eleição ) são uma causa de perda de mandato, de acordo com a alínea b) do n º 1 do artigo 8 º da lei n º 27/96, de 1 de Agosto.
 

 

Em conclusão:

• No caso concreto que nos foi apresentado não se equaciona a nomeação do membro da assembleia municipal para o órgão de administração da sociedade anónima em causa ( sociedade integrada no sector empresarial local ) mas sim a atribuição de  funções de director-geral, que nós interpretámos como funções de dirigente nessa empresa e não como a integração no órgão de administração da sociedade anónima.
• Assim sendo, não se trata de um problema de  incompatibilidade, dado que não se pretende nomear o membro da assembleia municipal para o órgão de administração da empresa do sector empresarial local mas sim atribuir-lhe funções dirigentes na empresa, funções essas que não estão abrangidas por qualquer incompatibilidade, dados os termos do nº 1 deste  art. 3 º do Estatuto dos Eleitos Locais ( EEL ) ( os eleitos locais, mesmo em regime de permanência, podem exercer outras actividades – públicas ou privadas – para além das que exercem como autarcas).                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
• Quanto à específica incompatibilidade dos membros das assembleias municipais relativamente a empresas do sector empresarial local, a lei só prevê essa incompatibilidade no que respeita aos gestores públicos e a funções executivas, não estando essa hipótese equacionada, de acordo com os dados que nos foram fornecidos pela Câmara Municipal.
• Exercem funções de direcção os  trabalhadores das empresas municipais, participadas, entidades fundacionais ou institucionais ou de associações de municípios que tenham  a responsabilidade de superintender, coordenar ou chefiar a actividade de um ou mais sectores, serviços ou departamentos na directa dependência dos órgãos de administração ou de gestão.
• As funções de director-geral numa empresa são funções de direcção, pelo que pretendendo-se que as mesmas sejam exercidas por um membro de uma assembleia municipal dum município que detém nessa empresa uma participação de 48% o referido eleito, se as aceitar, coloca-se numa situação superveniente de inelegibilidade.

• As inelegibilidades supervenientes ( isto é situações de  inelegibilidade criadas após a eleição ) são uma causa de perda de mandato, de acordo com a alínea b) do n º 1 do artigo 8 º da lei n º 27/96, de 1 de Agosto.

 

Maria José L. Castanheira Neves
(Directora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local)

1. Lei nº 29/87, de 30/06, com as alterações introduzidas  pelas leis  97/89, de 15/12, 1/91, de 10/01, 11/91, de 17/05, 11/96, de 18/04, 127/97, de 11/12, 50/99, de 24/06, e 86/2001, de 10/08, 22/2004, de 17/06, e 52-A/2005, de 10/10.

2. J. J. Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, anotada, Coimbra Editora., pag 948.

3. Marcel Waline, Inélegibilité et incompatibilité, Revue du droit public et de la science politique, nº 3, 1966.

4. Duarte Silva, « As inelegibikidades nas eleições autárquicas» , a Jurisprudência do Tribunal Constituciobnal, Aequitas Editorial Notícias, Lisboa, 1993, pag. 174, citado no Parecer da PGR n º 112/2002, publicado no DR, n º 261, de 11/11/2003.