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Conselho Intermunicipal; artigo 105º da Lei 75/2013; deliberações

 

Solicita o Primeiro Secretário Executivo Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal da …, por seu ofício de 16/11/2016, referência n.º ... , a emissão de parecer sobre a seguinte questão:

No sentido de dar seguimento a algumas atividades da CIM Região de … têm surgido dúvidas no que diz respeito à sua concretização relacionadas com a ligação entre a CIM Região de … e os municípios que a constituem, pelo que solicitamos o V. parecer remetendo o documento em anexo com algumas considerações.

 

O aludido documento, remetido em anexo ao ofício, contém as seguintes considerações:

No sentido de dar seguimento a algumas atividades da Comunidade Intermunicípal da Região … têm surgido algumas dúvidas respeitantes à sua concretização relacionadas com a ligação entre a CIM … e os municípios que a constituem, que passamos a identificar e para as quais vimos pedir a Vossa análise e parecer

A saber:

De acordo com o artigo 105° da Lei n.º 75/2013 de 12 de setembro na sua atual redação,

"Artigo 105. - Deliberações

1 - As deliberações dos órgãos das entidades intermunicipais vinculam os municípios que as integram.

2 – As deliberações do conselho metropolitano e do conselho intermunicipal consideram-se aprovadas quando os votos favoráveis dos seus membros correspondam, cumulativamente, a um número igual ou superior ao dos votos desfavoráveis e à representação demais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da área metropolitana ou da comunidade intermunicipal.

3 - Para efeitos do número anterior, considera-se que o voto de cada membro é representativo do número de eleitores do município de cuja câmara municipal seja presidente."

Desta forma as deliberações do conselho intermunicipal consideram-se aprovadas quando:

os votos favoráveis dos seus membros correspondam,

cumulativamente,

a um numero igual ou superior ao dos votos desfavoráveis

e à

representação de mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da comunidade intermunicipal.

De acordo com os dados publicados no Diário da República, 2.ª série, de 1 de março de 2016, o n.º de eleitores em 31/12/2015 era 419 113.

 

[mapa não transcrito]

 

A - Atendendo ao exposto, para que uma deliberação do Conselho Intermunicipal vincule os municípios que integram a CIM …

1.° O n.º de votos favoráveis tem de ser igual ou superior ao n.º de votos desfavoráveis;

e cumulativamente

2.° Os municípios que votem favoravelmente têm de representar 50%+1 dos eleitores, ou seja têm de corresponder a 209 558 eleitores.

Esta é uma dedução correta?

 

B - Desta forma, hipoteticamente, se estiverem presentes municípios suficientes para existir quórum de funcionamento e de deliberação, se os municípios presentes não representarem 50%+1 e se não existirem votos desfavoráveis isto significa que não vinculam os municípios que não estiveram presentes? Se sim, então como atuar para que esta vinculação ocorra?

 

C - Hipoteticamente, se estiverem presentes municípios suficientes para existir quórum de funcionamento e de deliberação, se os municípios presentes não representarem 50%+1 e se existirem votos desfavoráveis, mas em menor n.º ao dos favoráveis isto significa que não vinculam esses municípios?

 

D - No caso de estarem preenchidas as duas premissas, n.º de votos favoráveis igual ou superior ao n.º de votos desfavoráveis e os municípios que votam favoravelmente representam 50%+1 dos eleitores (ou mais), as deliberações vinculam todos os municípios que constituem a CIM.

1 - Se porventura o assunto que foi deliberado envolver uma competência para a qual o Presidente de Câmara não se encontra habilitado, como fazer?

  1. a) Levar a reunião de Câmara para deliberação?
  2. b) Levar à 1a reunião de Câmara para ratificação do ato?
  3. c) E se a proposta não for aprovada?

2 - Estando todas as questões de competência salvaguardadas, como articular as deliberações da CIM com o cumprimento da Lei dos compromissos, nomeadamente quando não existam fundos disponíveis?

  

Apreciando

  1. Do pedido

Como resulta do exposto, são colocadas pela CIM … diversas questões sobre diferentes aspectos do processo de deliberação em alguns dos órgãos das entidades intermunicipais e efeitos dessas deliberações relativamente aos municípios integrantes.

Para maior facilidade e clareza, as mesmas serão respondidas depois de breve excurso pelo quadro normativo aplicável.

 

  1. Análise

2.1. Do quadro normativo

Vejamos, antes do mais, o que sobre as questões em apreço se disciplina na lei e nos estatutos da CIM.

2.1.1. Quadro legal

As questões colocadas encontram regulação em diversas normas legais do RJAL. Vejamos.

Diz o artigo 104.º do RJAL, sob a epígrafe Funcionamento, que

O funcionamento das entidades intermunicipais regula-se, em tudo o que não esteja previsto na presente lei, pelo regime jurídico aplicável aos órgãos municipais

Já o artigo 105.º do RJAL, epigrafado Deliberações, dispõe o seguinte:

1 - As deliberações dos órgãos das entidades intermunicipais vinculam os municípios que as integram.

2 - As deliberações do conselho metropolitano e do conselho intermunicipal consideram-se aprovadas quando os votos favoráveis dos seus membros correspondam, cumulativamente, a um número igual ou superior ao dos votos desfavoráveis e à representação de mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da área metropolitana ou da comunidade intermunicipal.

3 - Para efeitos do número anterior, considera-se que o voto de cada membro é representativo do número de eleitores do município de cuja câmara municipal seja presidente.

Por sua vez, o n.º 1 do artigo 83.º do RJAL diz que

A assembleia intermunicipal é constituída por membros de cada assembleia municipal, eleitos de forma proporcional…

 e o n.º 1 do artigo 88.º do mesmo diploma que

O conselho intermunicipal é constituído pelos presidentes das câmaras municipais dos municípios que integram a comunidade intermunicipal.

sendo que, nos termos do n.º 1 do artigo 101.º,

O mandato dos membros (…) do conselho intermunicipal coincide com o que legalmente estiver fixado para os órgãos das autarquias locais.

2.1.2. Quadro estatutário

Os Estatutos da Comunidade Intermunicipal da Região de …[1] abordam igualmente esta matéria, disciplinado alguns dos seus aspectos do seguinte modo.

No artigo 9.º, n.º 1, com a epígrafe quórum da reunião, estipulam tais Estatutos que

As reuniões dos órgãos da CIM-… apenas terão lugar quando esteja presente a maioria do número legal dos seus membros

Já no n.º 1 do artigo 10.º, artigo intitulado de Deliberações os Estatutos prevêem para aos mesmos órgãos colegais que

As deliberações dos órgãos da CIM-… são tomadas à pluralidade de votos, estando presente a maioria legal dos seus membros, exceto as deliberações de alteração de estatutos, para as quais é exigida uma maioria qualificada, nos termos destes estatutos.

Porém, especificamente quanto ao Conselho Intermunicipal, o n.º 2 do mesmo artigo 10.º dispõe que

As deliberações do conselho intermunicipal excetuam-se do disposto no n.º 1, considerando-se aprovadas quando os votos dos seus membros correspondam cumulativamente:

  1. a) A um número igualou superior ao dos votos desfavoráveis;
  2. b) À representação de mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da CIM Região de …

O critério para determinação deste aludido universo total de eleitores encontra-se no n.º 3 do mesmo artigo, onde se considera

(…) que o voto de cada membro é representativo do número de eleitores do município de cuja câmara municipal seja presidente.

Por seu lado, no artigo 6.º, n.º 2, dos Estatutos considera-se que

Os membros da assembleia intermunicipal e do conselho intermunicipal são eleitos locais provenientes dos municípios que integram a CIM-…

e que, de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo,

A qualidade de membro dos órgãos referidos (…) é indissociável da qualidade de membro dos órgãos municipais.

No que toca à duração do mandato dos titulares dor órgãos da CIM, o n.º 1 do artigo 6.º, n.º 2, dos Estatutos dispõe que

O mandato dos membros dos órgãos da CIM-… terá a duração do mandato municipal

acrescentando o artigo 7.º que

Os membros dos órgãos da CIM-… servem pelo período do mandato e mantém‑se em funções até serem legalmente substituídos.

2.2. Alcance das disposições jurídico-regulamentares

Do cotejo e leitura conjugada – como, naturalmente, se impõe – das transcritas normas legais e regulamentares, é possível alcançar diversos entendimentos sobre o seu conteúdo e alcance, relevantes para a análise e resposta às questões colocadas.

Na análise às questões e para maior concreção e facilidade, recorrer-se-á ao método de a desenvolver na resposta a cada uma das perguntas colocadas.

  1. Análise e resposta às questões

3.1. A primeira das questões colocadas

(...) para que uma deliberação do Conselho Intermunicipal vincule os municípios que integram a CIM …

1.° O n.º de votos favoráveis tem de ser igual ou superior ao n.º de votos desfavoráveis;

e cumulativamente

2.° Os municípios que votem favoravelmente têm de representar 50%+1 dos eleitores, ou seja têm de corresponder a 209 558 eleitores.

Esta é uma dedução correta?

merece as seguintes reflexões e respostas.

3.1.1. No que toca à questão de saber como se deve entender como aprovada uma qualquer deliberação do conselho intermunicipal – ou seja, quais os requisitos ou exigências de aprovação das deliberações desse órgão – é certo o que vem dito na questão colocada.

Assim, uma deliberação do conselho intermunicipal só se considera aprovada se, num primeiro momento, merecer a aprovação de um número de membros (ou seja, obtiver um número de votos) igual ou superior ao do número de membros (ou seja, do número de votos) que se manifestem contra a mesma (a desaprovam), não se considerando para o efeito eventuais abstenções (como também não são de considerar as eventuais ausências de membros) e, depois, num segundo momento, “convertendo” o número de votos favoráveis e desfavoráveis no correspondente número de cidadãos eleitores, com recurso à regra do n.º 3 do artigo 10.º dos Estatutos[2], os votos favoráveis correspondam a mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da área metropolitana ou da comunidade intermunicipal[3].

3.1.1.1. Para este segundo apuramento é, pois, necessário conhecer o número total de cidadãos eleitores de cada município integrante da CIM, obtendo, pela sua soma aritmética, o número total de cidadãos eleitores na área da CIM – ou seja, o que a lei designa por universo total de eleitores dos municípios integrantes (…) da comunidade intermunicipal.[4] Dividindo esse número por dois (ou seja em duas metades iguais, passe a tautologia), obter-se-á então o número ou valor de referência que deve ser sempre ultrapassado pelo número de eleitores correspondentes aos votos favoráveis para que a deliberação possa ser considerada aprovada. Está-se, pois, perante um duplo critério cumulativo de validação das deliberações do conselho intermunicipal[5].

Na verdade, se o primeiro desses critérios, ainda que já excludente da aprovação, tem uma natureza interna, relativa e “subjectiva”, ou seja, se refere ao sentido de voto de cada um dos membros do próprio órgão – e que se traduz no mero confronto numérico (à razão da equivalência de um presidente/membro, um voto) dos votos expressos em sentido aprobatório e não aprobatório, não relevando as abstenções – já o segundo deles é um critério externo, absoluto e objectivo, na medida em que convoca como regra indispensável de aprovação das deliberações que a votação favorável dos membros individuais corresponda a, ou represente, – por via de uma conversão dos votos singulares em eleitores, à luz do critério (ou regra de equivalência) fixado no n.º 3 do artigo 105.º do RJAL – um número de eleitores superior a mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da área metropolitana ou da comunidade intermunicipal.

Quer isto dizer que, em abstracto, podendo estar presentes a maioria dos membros (presidentes de câmara) e votando todos eles unanimemente em determinado sentido, ainda assim a deliberação pode não ser aprovada porque a soma do número de eleitores que eles representam não constitui mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da área metropolitana ou da comunidade intermunicipal. E, inversamente, estando presente apenas uma minoria dos membros, respeitado o quórum, mas representando mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da entidade intermunicipal, uma deliberação pode ser aprovada apenas com os seus votos, no caso de não se verificar oposição.

3.1.1.2. Uma questão que aqui se coloca – desde logo porque é a situação que se apresenta como implícita na questão colocada – é a de saber como se determina o valor correspondente a mais de metade do universo total de eleitores dos municípios.

3.1.1.2.1. A questão é de resposta simples quando o universo total de eleitores corresponde a um número par (por exemplo, 100.000 eleitores, p. ex.) e portanto a sua metade (50.000 eleitores) é sempre um número inteiro. Nesse caso mais de metade desse universo de eleitores corresponde ao valor de metade mais um, ou seja, 50.001 eleitores[6]. Teremos assim que, à luz deste critério, num universo de 100.000 eleitores, se os votos favoráveis corresponderem a 50.001 eleitores a deliberação será aprovada porque os votos desfavoráveis apenas poderiam corresponder, no limite, a 49.999 eleitores.

3.1.1.2.2. Já quando o número total de eleitores corresponda a um número ímpar (100.001 eleitores, p. ex.) e portanto a sua metade corresponda a um número decimal (50.000,5 eleitores), não se torna necessário adicionar um número inteiro ao resultado da divisão (cumprindo o aforismo “metade mais um”), para se obter o valor de referência. Neste caso mais de metade do universo de eleitores corresponde ao número inteiro imediatamente seguinte ao número decimal obtido na divisão. Assim, à luz deste critério, num universo de 100.001 eleitores, se os votos favoráveis corresponderem a 50.001 eleitores a deliberação será aprovada porque corresponde a um valor superior a 50.000,5 eleitores, sendo que os votos desfavoráveis apenas podem corresponder, no limite, a 50.000 eleitores[7].

3.1.1.2.3. Este critério pretende, ainda que indirectamente, fazer depender a aprovação de medidas que possam afectar ou reflectir-se sobre a população de uma determinada entidade intermunicipal não apenas da vontade individual dos presidentes das câmaras municipais que as votem favoravelmente, mas também de uma validação à luz de uma dimensão populacional dada pela representatividade de cada um deles no universo intermunicipal, fazendo corresponder a cada um o número de eleitores do respectivo município - de modo a evitar que a vontade pessoal dos presidentes possa levar à aprovação de decisões que, afinal, correspondam, representativamente, apenas a uma minoria da população (verdadeiramente, dos eleitores) dessa entidade intermunicipal.

3.1.1.3. Uma outra questão prende-se em saber como se determina o universo total de eleitores dos municípios, ou seja qual é esse universo ou, dito de outro modo, a que universo de eleitores se refere a lei quando o invoca.

Por outras palavras e mais concretamente trata-se de saber a quais eleitores se refere a lei: se aos eleitores constantes dos cadernos eleitorais que serviram em eleições anteriores – e nesse caso, em quais delas – se aos eleitores que constam do mapa que, anualmente, no dia 1 de Março de cada ano a DGAI[8] publica na 2ª série do Diário da República com o numero de cidadãos eleitores inscritos no recenseamento eleitoral por circunscrição de recenseamento[9].

A lei não contém indicação imediata que oriente uma resposta rápida. Porém contém indícios suficientes, face à sua previsão quanto à constituição e funcionamento dos órgãos das entidades intermunicipais. 

Assim, afigura-se que estando em causa órgãos cuja composição constitui uma emanação directa e imediata dos resultados eleitorais autárquicos no que tange às eleições municipais[10]; que a duração do mandato dos membros dos órgãos colegiais intermunicipais de composição baseada na representação dos órgãos autárquicos se encontra incindivelmente ligada à duração do seu mandato enquanto membros destes últimos[11]; e que mesmo o próprio secretariado executivo intermunicipal, cuja composição não é emanação imediata de resultados eleitorais autárquicos[12], tem o seu mandato ou, mais propriamente, a duração desse mandato, ligada ao ciclo eleitoral autárquico, deve entender-se que, tal como nas autarquias que a integram e cuja composição dos seus órgãos foi ditada pelos eleitores constantes dos cadernos eleitorais das respectivas eleições autárquicas, devem também ser estes os eleitores a considerar para efeitos de segundo critério de aprovação das deliberações do conselho intermunicipal – e não quaisquer outros mapas ainda que mais actualizados, pois que a composição orgânica municipal e intermunicipal assenta no ciclo eleitoral autárquico, sendo este o determinante, designadamente em termos de (número de) eleitores, para a composição dos seus órgãos.

Sendo assim, como o é, não faz sentido utilizar para efeitos de determinação do universo total de eleitores dos municípios ao nível das entidades intermunicipais, mapas de recenseamento outros que não os cadernos eleitorais que basearam a eleição autárquica da qual resultou a eleição dos membros do conselho intermunicipal – pois que nem esses mapas têm qualquer efeito ao nível municipal, designadamente quanto aos seus órgãos (ou mais propriamente à composição desses órgãos, com reflexo nas suas decisões), nem faria sentido que anualmente pudesse haver uma alteração desse universo, pois que tal poderia conduzir, no limite, a que fossem adiadas ou antecipadas votações no seio do conselho intermunicipal, na expectativa (ou certeza) da mudança do número de eleitores, determinante de eventuais alterações da correlações de forças, com reflexo na aprovação ou reprovação de deliberações no seu seio.

Tal como nos órgãos autárquicos deve vigorar quanto aos órgãos intermunicipais um princípio de estabilidade assente no ciclo eleitoral, igualmente extensível à determinação do universo de eleitores autárquicos – a menos que a lei, expressa e inequivocamente, venha dispor de forma diversa.

3.2. A segunda e a terceira questões são do seguinte teor

B - Desta forma, hipoteticamente, se estiverem presentes municípios suficientes para existir quórum de funcionamento e de deliberação, se os municípios presentes não representarem 50%+1 e se não existirem votos desfavoráveis isto significa que não vinculam os municípios que não estiveram presentes? Se sim, então como atuar para que esta vinculação ocorra?

C - Hipoteticamente, se estiverem presentes municípios suficientes para existir quórum de funcionamento e de deliberação, se os municípios presentes não representarem 50%+1 e se existirem votos desfavoráveis, mas em menor n.º ao dos favoráveis isto significa que não vinculam esses municípios?

e pela conexão das hipóteses colocadas merecem resposta conjunta.

3.2.1. Essa resposta alcança-se facilmente quanto à primeira delas, se se atender a que nenhuma deliberação do conselho intermunicipal se pode considerar aprovada se não reunir cumulativamente os requisitos para o efeito: ser votada favoravelmente (votos a favor) por um número de conselheiros igual ou superior ao dos que votaram desfavoravelmente (votos contra), desconsiderando as abstenções, e, depois, que o número de cidadãos eleitores dos municípios cujos presidentes votaram favoravelmente corresponda a um número superior à metade do universo de eleitores que exista na comunidade intermunicipal.

Caso não se verifique qualquer um destes critérios a deliberação em causa não se considera aprovada pelo que não produz efeitos jurídicos, nem os municípios têm que ou podem adoptá-la com base na sua votação. Quer isto dizer que uma tal deliberação não vincula desde logo os municípios não presentes. Mas também não vincula os municípios presentes, mesmo que a tenham votado favoravelmente.

O que significa que nessa circunstância uma tal deliberação não foi aprovada e dela não se podem extrair efeitos jurídicos, designadamente vinculativos, quaisquer que eles sejam, ao nível da comunidade intermunicipal enquanto ente jurídico e entidade supramunicipal, bem como ao nível dos municípios enquanto seus membros constitutivos.

3.2.2. O critério utilizado e a resposta dada à segunda questão serve igualmente como critério a usar e resposta para a terceira questão.

Na verdade, também na hipótese colocada se verifica uma situação de não aprovação de uma deliberação, pela não verificação simultânea das condições legais para que se possa considerar uma dada deliberação como aprovada.

E, não estando aprovada à luz dos critérios (de ambos os critérios) legalmente previstos, a deliberação não se considera aprovada, com todas as consequências jurídicas de tal advenientes: não vincula nenhum dos municípios (quer seja presente quer ausente da votação, quer o seu presidente haja votado a favor quer contra) nem produz efeitos quanto a eles, do mesmo modo que não produz efeitos jurídicos na esfera da comunidade intermunicipal nem a vincula juridicamente.

3.3. A quarta e última questão é do seguinte teor:

D - No caso de estarem preenchidas as duas premissas, n.º de votos favoráveis igual ou superior ao n.º de votos desfavoráveis e os municípios que votam favoravelmente representam 50%+1 dos eleitores (ou mais), as deliberações vinculam todos os municípios que constituem a CIM.

1 - Se porventura o assunto que foi deliberado envolver uma competência para a qual o Presidente de Câmara não se encontra habilitado, como fazer?

  1. a) Levar a reunião de Câmara para deliberação?
  2. b) Levar à 1a reunião de Câmara para ratificação do ato?
  3. c) E se a proposta não for aprovada?

2 - Estando todas as questões de competência salvaguardadas, como articular as deliberações da CIM com o cumprimento da Lei dos compromissos, nomeadamente quando não existam fundos disponíveis?

Esta é uma questão múltipla que implica diversas respostas.

3.3.1. Num primeiro ponto há que sublinhar que câmara municipal (ou câmaras municipais) e (a respectiva) entidade intermunicipal (área metropolitana ou comunidade intermunicipal) constituem entidades jurídica e organicamente distintas, detentoras de diferentes atribuições – as dos municípios elencadas no artigo 23.º e as das entidades intermunicipais nos artigos 67.º (áreas metropolitanas) e 81.º (comunidades intermunicipais), todos do RJAL – e com poderes (competências) próprios, distintos e conferidos por lei.

Para a prossecução da sua acção as entidades intermunicipais são dotadas de órgãos próprios, com a composição definida na lei. Nas comunidades intermunicipais[13], ao lado de órgãos colegiais (assembleia intermunicipal e secretariado executivo intermunicipal) cuja constituição assenta numa eleição ainda que de entre diferentes universos eleitorais, outros há cuja composição resulta de uma inerência[14].

Na verdade, no caso do conselho intermunicipal, órgão deliberativo[15] da comunidade intermunicipal, a sua composição é obtida por inerência de cargo: o conselho intermunicipal é constituído pelos presidentes das câmaras municipais dos municípios que integram a comunidade intermunicipal[16], sendo que ao exercício de tais funções não corresponde qualquer remuneração[17]. Quer isto dizer que não se torna necessária qualquer operação ou acto destinado a encontrar os titulares desses órgãos, pois que eles se encontram já pré-determinados pela e na lei, quando esta indica o cargo cujos titulares serão igualmente os membros desse órgão.

Podemos assim dizer, em resumo, que o presidente de câmara de um dado município é titular simultâneo de dois cargos ou seja, desempenha simultaneamente as funções de presidente da câmara municipal no seu município, aí exercitando os poderes e competências do cargo no âmbito municipal, ao mesmo tempo que, por ser presidente da câmara, é também conselheiro intermunicipal por inerência, ou seja membro do órgão deliberativo da respectiva comunidade intermunicipal, no qual exercitará os poderes próprios desse cargo ou função.

A vinculatividade, ou não vinculatividade, para um dado município das deliberações do conselho intermunicipal não depende, assim, do facto de o respectivo presidente estar, ou não, municipalmente mandatado para votar em determinado sentido, mas resulta única e exclusivamente da lei, quando diz que as deliberações dos órgãos das entidades intermunicipais vinculam os municípios que as integram[18] (todos eles quer tenham estado presentes na votação quer não e, estando, as tenham, ou não, aprovado) conquanto sejam aprovadas pelos votos favoráveis dos seus membros correspondentes, cumulativamente, a um número igual ou superior ao dos votos desfavoráveis e à representação de mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes (…) da comunidade intermunicipal[19].

3.3.2. Quanto à questão de saber como articular as deliberações da CIM com o cumprimento da Lei dos compromissos, nomeadamente quando não existam fundos disponíveis ela apenas pode merecer uma resposta genérica, pois que potencialmente abrange diversíssimas circunstâncias que impedem uma resposta única.

Certo é que, em primeira linha, uma tal questão terá que ser resolvia em cada município à luz do quadro legal que, a cada momento, seja aplicável, bem como no contexto da própria comunidade intermunicipal.

As comunidades intermunicipais assentam no pressuposto básico, em matéria de funcionamento e acção, de uma consensualização de objectivos e decisões, de modo a verificar-se um funcionamento harmónico. Evidentemente que o desenvolvimento da sua acção não pode ser irrazoavelmente obstaculizado por um ou vários dos seus membros em desacordo. Mas é precisamente para evitar tentativas de hegemonia, positiva ou negativa, que a lei prevê o já referido duplo critério cumulativo de aprovação das deliberações do conselho intermunicipal (órgão deliberativo), as quais constituem as suas decisões fundamentais, na medida em que representam o imediato exercício das suas competências no quadro das suas atribuições.

Porém, mau grado isso, o que parece também evidente é que a vinculatividade ou o acatamento das deliberações do conselho intermunicipal (e, em geral, da comunidade intermunicipal) não podem fazer incorrer os municípios integrantes em violação de lei, pois que não é razoável pensar que para levar avante a sua missão, uma comunidade intermunicipal, por via das suas decisões, “obrigue” os seus membros (municípios) a ter que praticar ilegalidades para as poder acatar.

  

 

Concluindo

  1. Uma deliberação do conselho intermunicipal só se pode considerar aprovada se, num primeiro momento, merecer a aprovação de um número de membros (ou seja, obtiver um número de votos) igual ou superior ao do número de membros (ou seja, do número de votos) que se manifestem contra a mesma (a desaprovam), não se considerando para o efeito eventuais abstenções (como também não são de considerar as eventuais ausências de membros) e, depois, num segundo momento, “convertendo” o número de votos favoráveis e desfavoráveis no correspondente número de cidadãos eleitores, com recurso à regra legal e estatutariamente prevista para o efeito, aqueles votos (favoráveis) correspondam a mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes da área metropolitana ou da comunidade intermunicipal.
  2. A determinação do valor correspondente a mais de metade do universo total de eleitores dos municípios deve ser feita do seguinte modo:
    1. Quando o universo total de eleitores corresponda a um número par (por exemplo, 100.000 eleitores, p. ex.) e portanto a sua metade (50.000 eleitores) seja sempre um número inteiro, mais de metade desse universo de eleitores corresponde ao valor de metade mais um, ou seja, 50.001 eleitores.
    2. Quando o número total de eleitores corresponda a um número ímpar (100.001 eleitores, p. ex.) e portanto a sua metade seja um número decimal (50.000,5 eleitores), não se torna necessário adicionar um número inteiro ao resultado da divisão (cumprindo o aforismo “metade mais um”), pois que nesse caso mais de metade do universo de eleitores corresponde ao número inteiro imediatamente seguinte ao número decimal obtido na divisão – ou seja 50.001 eleitores.
  3. Para efeitos do anteriormente referido, deve entender-se que, tal como nas autarquias que a integram e cuja composição dos seus órgãos foi ditada pelos eleitores constantes dos cadernos eleitorais das respectivas eleições autárquicas, devem também ser estes os eleitores a considerar para efeitos de segundo critério de aprovação das deliberações do conselho intermunicipal e não quaisquer outros constantes de mapas ainda que mais actualizados, pois que a composição orgânica municipal e intermunicipal assenta no ciclo eleitoral autárquico, sendo este o determinante, designadamente em termos de (número de) eleitores, para a composição dos seus órgãos.
  4. Nenhuma deliberação do conselho intermunicipal se pode considerar aprovada se não reunir cumulativamente os requisitos legalmente previstos para o efeito conforme referido na conclusão A
  5. Uma deliberação não aprovada não produz efeitos jurídicos, nem os municípios têm que ou podem adoptá-la com base no facto de os eus presidentes a terem votado enquanto conselheiros intermunicipais – ou seja, uma tal deliberação não vincula desde logo os municípios não presentes como também não vincula os municípios presentes, mesmo aqueles cujos presidentes a tenham votado favoravelmente.
  6. A vinculatividade, ou não vinculatividade, para um dado município, das deliberações do conselho intermunicipal da comunidade intermunicipal a que pertença, não depende, do facto de o respectivo presidente estar, ou não, municipalmente mandatado para votar em determinado sentido, mas resulta, única e exclusivamente, da lei, quando nesta se diz que as deliberações dos órgãos das entidades intermunicipais vinculam os municípios que as integram (todos eles, quer tenham estado presentes na votação quer não e, estando, as tenham, ou não, aprovado) conquanto sejam aprovadas pelos votos favoráveis dos seus membros correspondentes, cumulativamente, a um número igual ou superior ao dos votos desfavoráveis e à representação de mais de metade do universo total de eleitores dos municípios integrantes (…) da comunidade intermunicipal.
  7. A vinculatividade ou o acatamento das deliberações do conselho intermunicipal (e, em geral, de todos os órgãos da comunidade intermunicipal) não podem fazer incorrer os municípios que a integram em violação de lei, pois que não é razoável pensar que para levar avante a sua missão, uma comunidade intermunicipal, por via das suas decisões, “obrigue” os seus membros (municípios) a ter que praticar ilegalidades para as poder acatar.

  

Salvo semper meliori judicio

   

Ricardo da Veiga Ferrão

(Jurista. Técnico Superior)

 

[1] Os Estatutos da Comunidade Intermunicipal da Região de … foram aprovados em reunião de 14 de Janeiro de 2014 da respectiva Assembleia Intermunicipal, sendo publicados em Diário da República (2.ª serie) pelo Aviso n.º …, de ….

[2] Que corresponde à regra do n.º 3 do artigo 105.º do Regime Jurídico das Autarquias Locais (RJAL), aprovado, como seu anexo, pela Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, e alterado pela Lei n.º 25/2015, de 30 de Março, Lei n.º 69/2015, de 16 de Julho, e Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março.

[3] Artigo 105.º, n.º 3, do RJAL.

Em sentido idêntico ao do texto, vd. o Acórdão do TCA Sul de 24/4/2014, consultável em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf?OpenDatabase.

[4] Artigo 105.º, n.º 2, do RJAL

[5] Em face da previsão destes critérios cumulativos quase se poderá sustentar que seria dispensável nas reuniões do conselho intermunicipal a exigência de quórum de deliberação e até mesmo de funcionamento.

[6] Porque os eleitores correspondem sempre a unidades, não havendo fracções ou décimas de eleitor.

[7] Porque, tal como já se disse na nota anterior, os eleitores correspondem sempre a unidades, não havendo fracções ou décimas de eleitor.

[8] Agora Secretaria Geral da Administração Interna – Administração Eleitoral (SGAI-AE), por sucessão nas atribuições da extinta DGAI.

[9] Artigo 67.º do Regime Jurídico do Recenseamento Eleitoral, constante da Lei n.º 13/99, alterada pelas Lei n.º 3/2002, de 8 de Janeiro, Lei Orgânica n.º 4/2005, de 8 de Setembro, Lei Orgânica n.º 5/2005, de 8 de Setembro, e Lei n.º 47/2008, de 27 de Agosto.

[10] Assim, e referindo-se aqui apenas os órgãos das comunidades intermunicipais cuja composição represente uma emanação da composição dos órgãos municipais dos concelhos que as integram, temos que a assembleia intermunicipal é constituída por membros das assembleias municipais eleitos de forma proporcional [sublinhado nosso] (artigo 83.º, n.º 1, do RJAL) e que o conselho intermunicipal é constituído pelos presidentes das câmaras municipais dos municípios que integram a comunidade intermunicipal (artigo 88.º, n.º 1, do RJAL).

[11] O mandado dos membros do conselho intermunicipal (que são presidentes das câmaras) coincide com o que legalmente estiver fixado para os órgãos das autarquias locais (artigo 101.º, n.º 1, do RJAL).

[12] Nos termos do artigo 84.º, al. c), do RJAL, observados os procedimentos previstos no artigo 94.º do RJAL, o secretariado executivo intermunicipal é eleito pela assembleia intermunicipal.

[13] O que vai de ser dito sobre comunidades intermunicipais vale igualmente para as áreas metropolitanas, na medida em que, nestas, também o conselho metropolitano é constituído pelos presidentes das câmaras municipais dos municípios que integram a área metropolitana (artigo 69.º, n.º 2, do RJAL).

[14] MarcelLo Caetano, Manual de Direito Administrativo, tomo II, 10.º ed., 5.º reimp., 1994, pag. 654, caracteriza a inerência como a investidura obrigatória num cargo por disposição legal, em virtude do exercício de outro cargo.

Por seu lado, diz-nos João Alfaia, Dicionário Jurídico da Administração Pública, vol. I, 2.ª ed. 1990, pag. 166, entrada “acumulação”, a respeito das inerências que trata-se dos casos em que a lei declara inerentes as funções de dois cargos, não recebendo o funcionário, titular de ambos, qualquer abono pelo desempenho do cargo (inerente).

[15] Verdadeiramente um dos (dois) órgãos deliberativos da comunidade intermunicipal, já que também a assembleia intermunicipal tem essa mesma natureza.

[16] Artigo 88.º, n.º 1, do RJAL.

[17] Artigo 88.º, n.º 3, do RJAL. Sobre a inexistência de remuneração das funções de conselheiro intermunicipal facto que caracteriza tal desempenho como uma clara inerência de funções, vd. o que fica referido na nota 12 anterior.

[18] Artigo 105.º, n.º 1, do RJAL.

[19] Artigo 105.º, n.º 2, do RJAL.

By |2023-10-23T10:07:16+00:0011/01/2017|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Conselho Intermunicipal; artigo 105º da Lei 75/2013; deliberações

Renúncia; Cessação voluntária do exercício de funções de Presidente da Mesa; Assembleia de Freguesia

 

Em referência ao pedido de parecer solicitado pelo Presidente da Assembleia de Freguesia, por correio eletrónico de 7 e 13 de dezembro de 2016, sobre o assunto mencionado em epígrafe, julgamos que as questões que em concreto devemos esclarecer, baseados no teor do texto enviado, são as seguintes:

 

  1. Poderá ocorrer a cessação voluntária (erradamente designada pelo Presidente da Assembleia de Freguesia como renúncia) do exercício de funções de Presidente da Mesa, permanecendo o mesmo como membro da mesma Assembleia de Freguesia?
  2. Caso pretenda renunciar ao mandato de membro da Assembleia de Freguesia,

para além da cessação voluntária como Presidente da Assembleia de Freguesia, como deverá proceder?

 

I

 

No que respeita à primeira questão, importa referir que os membros da Mesa podem ser destituídos a qualquer momento pela maioria do número legal dos membros que compõem a Assembleia de Freguesia, contrariamente ao mandato dos mesmos enquanto membros da Assembleia.

De facto, contrariamente ao mandato dos membros da Assembleia de Freguesia que é de quatro anos, só deixando de ser eleitos se renunciarem, forem objeto da sanção de perda de mandato ou de dissolução do órgão, nestas duas últimas hipóteses por sentença de tribunal administrativo, a mesa é eleita para o período do mandato mas pode ser destituída a qualquer momento pela maioria do número legal dos membros que compõem a assembleia de freguesia (n º 2 do artigo 10 º da lei 169/99, de 18/09, na redação dada pela lei n º 5-A/2002, de 11/01).

Ocorrendo essa destituição os membros da mesa destituídos das suas funções na mesa continuam, obviamente, a ser membros de pleno direito da Assembleia de Freguesia – apenas deixam de integrar a mesa.

 

Ora, se os membros da mesa forem destituídos continuam a ser membros da Assembleia de Freguesia, não se confundindo esta destituição com renúncia.

 

A renúncia é uma das formas de cessação do mandato e consubstancia um direito de que gozam todos os eleitos locais, que depende unicamente da manifestação da vontade de renunciar, apresentada pelo eleito quer antes quer depois da instalação dos órgãos respetivos, estando legalmente consagrada no artigo 76 º da lei nº 169/99, na nova redação dada pela lei 5-A/2002, de 11/01.

A convocação do substituto deverá ser realizada no período que medeia entre a comunicação de renúncia e a primeira reunião que a seguir se realizar, onde o mesmo será instalado.

Isto é, não está legalmente prevista a renúncia ao cargo de Presidente da Assembleia de Freguesia, as renúncias respeitam aos mandatos como eleitos locais, sendo o cargo de presidente da Mesa um cargo para que se é eleito por se ter previamente adquirido a qualidade de eleito local.

 

Assim, no que respeita à possibilidade de o Presidente da mesa, «cessar», por opção própria, o exercício desse cargo para que foi eleito, não existe enquadramento legal para tal situação, como referimos, limitando-se a lei a prever e a regular apenas a hipótese de destituição por parte da Assembleia de Freguesia.

Ora, sendo um dos deveres dos eleitos locais participar nas reuniões dos órgãos para que foram eleitos, acrescentando nós, e nos cargos para que foram eleitos, entendemos, salvo melhor opinião, que a Assembleia de Freguesia deverá negar a possibilidade desta «renúncia» voluntária ao cargo de membro da Mesa da Assembleia, considerando que faz parte dos deveres dos eleitos permanecer nos referidos cargos, a menos que renunciem ou se suspendam os próprios mandatos de eleitos locais.

Ou seja, se a Assembleia de Freguesia considerar que não há enquadramento legal para que o Presidente da Assembleia cesse voluntariamente o exercício do cargo de Presidente da mesa deve comunicá-lo ao próprio, indeferindo a sua comunicação de «renúncia», que mais não é do que uma comunicação, como já afirmámos, de cessação voluntária do cargo.

No entanto, tal não impede nem que a Assembleia o destitua nem que o próprio renuncie ao seu próprio mandato de membro da Assembleia.

Se nenhuma das situações ocorrer não se irá verificar qualquer alteração na Assembleia de Freguesia.

 

  Temos, no entanto, presente que esta doutrina não colhe unanimidade, pelo que há quem entenda que o Presidente da Mesa pode cessar voluntariamente o exercício deste cargo, continuando como membro da Assembleia.

 

Competindo-nos dar apoio técnico às autarquias locais devemos informá-las dos vários entendimentos sobre as matérias em dúvida, muito embora manifestemos a nossa posição, dado que o apoio que prestamos não só é solicitado voluntariamente pelas autarquias como não as vincula nem as poderia vincular, dado o princípio da autonomia do poder local.

 

Assim neste outro entendimento, há possibilidade dos membros da mesa cessarem voluntariamente o exercício dos respetivos cargos, pelo que se tal ocorrer a substituição do Presidente da Mesa da Assembleia deve operar-se da mesma forma em que se realizou a sua eleição para a mesa.

 

Nestes termos, haverá nova eleição, eleição realizada por voto secreto pelos membros da Assembleia de Freguesia (vide o artigo 9 º da Lei n º 169/99, de 18/09, na redação dada pela lei n º 5-A/2002, de 11 de Janeiro) para eleger um novo Presidente ou uma nova mesa, consoante os termos em que estiver regulamentada a eleição da mesa no regimento da Assembleia de Freguesia, uninominal ou por listas.

 

Se estiver estipulada eleição uninominal eleger-se-á apenas o presidente da Mesa mas se a eleição prevista em regimento for a eleição por listas terão que ser apresentadas listas para a eleição da mesa, ou seja, nesse caso terá que ser eleita uma nova mesa.

 

Não podemos deixar de referir, no entanto, que  no caso que nos foi apresentado houve uma nítida confusão entre o conceito de renúncia, inerente ao mandato de eleito local e a cessação voluntária do cargo de Presidente da mesa.

 

Por último refira-se que quer a Assembleia destitua a mesa ( ou qualquer um dos membros da respetiva mesa) ou aceite  a  cessação voluntária do cargo de presidente da Assembleia, haverá  nova eleição, eleição realizada por voto secreto pelos membros da assembleia de freguesia ( vide o artigo 9 º da Lei n º 169/99, de 18/09, na redação dada pela lei n º 5-A/2002, de 11 de Janeiro) para eleger uma nova mesa ou um novo Presidente, nos termos por nós supra referidos.

 

II

Se, porventura, o atual Presidente da Assembleia de Freguesia pretender renunciar também ao seu mandato como membro da assembleia de Freguesia, para além de querer cessar funções como Presidente da mesa, o enquadramento legal da situação em causa será o seguinte:

 

A renúncia, com referimos, está consagrada no artigo 76º da Lei nº 169/99, de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pelo Lei nº 5-A/2002, de 11 de janeiro, é uma das formas de cessação do mandato e consubstancia um direito de que gozam todos os eleitos locais, que depende unicamente da manifestação da vontade de renunciar, apresentada pelo eleito quer antes, quer depois da instalação dos órgãos respetivos,

 

Esta manifestação de vontade é apresentada por escrito e dirigida a quem deve proceder à instalação ou ao presidente do órgão, consoante o caso, que deve convocar o membro substituto, no período que medeia entre a comunicação da renúncia e a primeira reunião que a seguir se realizar, salvo se a entrega do documento de renúncia coincidir com o ato de instalação ou reunião do órgão e estiver presente o respetivo substituto, situação em que, após a verificação da sua identidade e legitimidade, a substituição se opera de imediato, se o substituto a não recusar por escrito de acordo com o direito que ele próprio tem a renunciar.

 

A sua substituição far-se-á nos termos previstos no artigo 79º do mesmo diploma, ou seja, “pelo cidadão imediatamente a seguir na ordem da respetiva lista ou, tratando-se de coligação, pelo cidadão imediatamente a seguir do partido pelo qual havia sido proposto o membro que deu origem à vaga”.

 

No presente caso, exercendo o eleito renunciante também as funções de Presidente da mesa da Assembleia de Freguesia, a forma da sua substituição enquanto tal é a que aludimos supra, ou seja, dever-se-á  preencher proceder à eleição do novo Presidente, caso a anterior eleição tenha sido uninominal, ou de uma nova mesa, caso tenha sido por lista.

 

Note-se, porém, que enquanto não for feita a referida eleição, cabe ao 1 º secretário, nos termos previsto no nº 3 do citado artigo 10º, substituir o Presidente nas suas faltas.

 

Conclusões,

 

  1. No caso da Assembleia de Freguesia aceitar a cessação voluntária do cargo de presidente da Assembleia, haverá nova eleição, eleição realizada por voto secreto pelos membros da assembleia de freguesia ( vide o artigo 9 º da Lei n º 169/99, de 18/09, na redação dada pela lei n º 5-A/2002, de 11 de Janeiro) para eleger  um novo Presidente ou uma nova mesa, consoante os termos em que estiver regulamentada a eleição da mesa no regimento da Assembleia de Freguesia, uninominal ou por listas.

  

  1. No caso do atual Presidente da Assembleia de freguesia renunciar ao mandato de eleito local:

 

- Por força da conjugação normativa do nº 4 do artigo 76º e do nº 1 do artigo 79º da Lei nº 169/99, dever-se-á primeiramente substituir o Presidente da Assembleia enquanto membro da Assembleia de Freguesia, convocando o cidadão imediatamente a seguir na ordem da respetiva lista, o que terá lugar no período que medeia entre a comunicação da renúncia e a primeira sessão que a seguir se realizar, que poderá ser ordinária, se o referido período coincidir com a data da sua realização, ou extraordinária, caso isso não aconteça.

 

- Por força do disposto no artigo 10º da mesma lei, a mesa é eleita de entre os membros da assembleia de freguesia, pelo que a substituição do Presidente da mesa da Assembleia enquanto tal, na sequência da sua renúncia enquanto membro da assembleia, deverá seguir a mesma forma da eleição da mesa anteriormente realizada, isto é, uninominal, elegendo um novo Presidente da Assembleia, ou por lista, elegendo uma nova mesa.

  

 

Diretora de Serviços de Apoio Jurídico e à Administração Local

  

(Maria José Leal Castanheira Neves)

By |2023-10-23T09:03:45+00:0015/12/2016|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Renúncia; Cessação voluntária do exercício de funções de Presidente da Mesa; Assembleia de Freguesia

Dirigentes; procedimento concursal; experiência profissional.

 

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º …, de 15 de novembro, da Câmara Municipal de …, sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre-nos esclarecer o seguinte:

 

Reportando-nos ao solicitado através da comunicação acima referenciada, e sem perder de vista que os pareceres emitidos pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, a solicitação das entidades autárquicas, não se revestem, nesta matéria, de uma natureza vinculativa, antes se inserem no âmbito de uma assessoria jurídica voluntária, informamos de que, nos termos do n.º 2, alínea a), da Portaria n.º 314/2010, de 14 de junho, as referidas solicitações deverão ser acompanhadas de informação dos serviços “que enquadre a situação, proceda à sua análise e proponha uma solução para a questão objeto de consulta” e cumprir os requisitos previstos no n.º 5, alínea f), da Portaria n.º 528/2007, de 30 de abril, designadamente, serem subscritas pelo presidente do órgão (ou seu substituto legal).

 

De qualquer modo, sempre se dirá que prescreve o n.º 1 do artigo 12.º da Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto, na atual redação, que “a área de recrutamento para os cargos de direção intermédia de 1.º e 2.º graus é a prevista nos n.ºs 1 e 3 do artigo 20.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro …”.

 

E, compulsando a primeira das normas para onde nos vemos remetidos – o n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 2/2004 – constata-se que ali se estabelece que “os titulares dos cargos de direção intermédia são recrutados, por procedimento concursal … de entre trabalhadores em funções públicas contratados ou designados por tempo indeterminado, licenciados, dotados de competência técnica e aptidão para o exercício de funções de direção, coordenação e controlo que reúnam seis ou quatro anos de experiência profissional em funções, cargos, carreiras ou categorias para cujo exercício ou provimento seja exigível uma licenciatura, consoante se trate de cargos de direção intermédia de 1.º ou de 2.º grau, respetivamente” (elidido e destacado nossos).

 

Intentando a esquematização dos requisitos exigidos pelo preceito transcrito, diríamos que, ao tempo da formalização da candidatura a procedimento concursal para chefe de divisão, seriam aqueles os seguintes:

- Vínculo à administração pública, por tempo indeterminado;

- Licenciatura;

- Competência técnica e aptidão para o exercício de funções de direção, coordenação e controlo; e

- Quatro anos de experiência profissional em funções, cargos, carreiras ou categorias para cujo exercício ou provimento seja exigível uma licenciatura.

 

Sendo este último aquele cuja análise nos é suscitada, valerá salientar que, tendo o legislador lançado mão dos conceitos de exercício ou de provimento, por detentores de uma licenciatura, não nos restam grandes dúvidas quanto a considerar ter havido a intenção inequívoca de conferir relevância à experiência profissional obtida tanto em atividades privadas quanto em atividades de natureza pública, para o fim visado, sob pena de, a não se entender assim, se estar a fazer uma interpretação restritiva da norma, com total desrespeito pelos mais básicos elementos de interpretação e aplicação da lei, designadamente, o elemento literal e o teleológico.

 

É que, como é sabido, o tipo de experiência profissional, como a que a norma exige, longe de se constituir em exclusivo de quem exerce funções públicas, é, não raras vezes, muito mais rica, profícua e diversificada, logo, mais habilitante, quando adquirida no exercício de uma atividade privada, lógica que, ao que cremos, terá norteado o legislador no sentido de lhe conferir relevância, em ordem a propiciar a possibilidade de recrutamento de dirigentes de entre quem, tanto do setor privado quanto do setor público, revele ser o mais capaz para o desempenho de tais cargos (ao contrário do que em diplomas anteriores se consagrava quando, designadamente, só se considerava relevante a experiência adquirida após o ingresso em carreira do grupo de pessoal técnico superior – cfr., a propósito, a alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 49/99, de 22 de junho, revogada pelo artigo 38.º da Lei n.º 2/2004).

 

Em conclusão, para efeitos de candidatura a procedimentos concursais para cargos dirigentes deverá ser considerada relevante a experiência profissional adquirida no desempenho, tanto no setor público quanto no setor privado, de funções, cargos, carreiras ou categorias para cujo exercício ou provimento seja exigível uma licenciatura.

  

O técnico superior

 

(José Manuel Martins Lima)

By |2023-10-23T09:08:12+00:0024/11/2016|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Dirigentes; procedimento concursal; experiência profissional.

Procedimento concursal; recrutamento nos termos dos n.ºs 4 a 6 do artigo 30.º da LTFP.

 

 

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º …, de 16 de novembro, da Câmara Municipal de …, sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre tecer as seguintes considerações:

 

Sem desprimor pelas considerações tecidas na informação anexa ao pedido de parecer, e pese, embora, não excluirmos a possibilidade de se vir a afigurar defensável tese diversa, hipótese que salvaguardamos, pendemos para crer que não subsistirão fundamentos para sustentar o entendimento ali assumido, lançando mão de uma interpretação sistémica do artigo 30.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – LTFP – aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, como se propõe.

 

Assim, carecendo essa autarquia de proceder ao preenchimento de postos de trabalho, nada obsta a que, por deliberação do órgão executivo, proceda à abertura de procedimentos concursais (cfr., a propósito, o artigo 32.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, que aprovou o Orçamento de Estado para 2016 – LOE/2016), circunscrito a candidatos que sejam já detentores de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, para o que deverá proceder a uma prévia consulta à ECCRC, “no sentido de confirmar a existência ou não de candidatos, em reserva, que permita satisfazer as características dos postos de trabalho a ocupar, tal como definidas no mapa de pessoal” (cfr., n.º 1 do artigo 4.º da Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de janeiro, na atual redação) após o que, em caso de resposta negativa, deverá proceder à publicitação da oferta de emprego nos termos do art.º 19.º da mesma portaria, de que merece destaque a publicitação “na bolsa de emprego público (www.bep.gov.pt), através do preenchimento de formulário próprio, devendo este estar disponível para consulta no 1.º dia útil seguinte à publicação referida na alínea anterior”.

 

E pertinente será chamar, aqui, à colação o disposto no artigo 30.º e seguintes, no tocante às regras a observar em matéria de preenchimento de postos de trabalho, bem como nos artigos 92.º a 100.º da LTFP, relativamente ao recurso a instrumentos de mobilidade.

 

Por outro lado, e em ordem a proceder a um adequado enquadramento jurídico no tocante ao procedimento concursal, será pertinente fazer uma remissão para o que se encontra estabelecido no artigo 30.º, atenta a hierarquização de procedimentos concursais a que, implicitamente, procede, e nos artigos 33.º a 38.º da LTFP, no que à formação do vínculo diz respeito (cfr., também, Portaria n.º 83-A/2009, já citada).

 

É que, salvo melhor opinião, decorre do n.º 3 do artigo 30.º a imposição legal, num primeiro momento e respeitada que tenha sido a procura prévia de trabalhadores em situação de reserva, nos termos descritos, de o primeiro recrutamento ser exclusivamente dirigido a candidatos que sejam já detentores de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, consubstanciando-se, nesta particularidade, uma prerrogativa de prioridade ou de privilégio relativamente a candidatos sem aquele tipo de vínculo.

 

Depois, e nos termos do n.º 4 do preceito, ante a impossibilidade de ocupação dos postos de trabalho por trabalhadores com aquele vínculo, abre-se a possibilidade da abertura de um novo procedimento concursal, dirigido este, agora, a candidatos com vínculo de emprego público a termo ou sem vínculo de emprego público, realçando-se não ser aqui feita qualquer referência a vinculados por tempo indeterminado, situação bem diferente da que no n.º 5 do preceito é contemplada quando, em casos excecionais, devidamente fundamentados, se configura a realização de um procedimento concursal a que possam concorrer os trabalhadores com e sem vínculo de emprego público fora do caso previsto no número anterior.

 

Queremos com isto sustentar que, se o legislador tivesse pretendido incluir no universo de candidatos ao procedimento concursal previsto no n.º 4 os vinculados por tempo indeterminado, para além dos mencionados no preceito, com ou sem ordem de preferência relativamente aos restantes, certamente tê-lo-ia feito, hipótese que terá havido intenção deliberada de excluir (assim mandam as boas regras da interpretação e aplicação da lei).

 

E foi precisamente em sentido idêntico ao indiciado que o Tribunal Central Administrativo do Norte se pronunciou, em acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 1/14.1, de 25 de outubro de 2016, que, não obstante se reportar a normas da Lei n.º 12-A/2008, abreviadamente, LVCR, assume aqui particular acuidade, atenta a reposição a que, de forma quase literal, a Lei n.º 35/2014 fez de tais normas (cfr., artigo 6.º da LVCR versus artigo 30.º da LTFP).

 

Nestes termos, não nos eximimos de manifestar a nossa concordância com o entendimento perfilhado pela ANMP, constante do ofício remetido em anexo ao pedido de parecer, ou seja, o de que, nos procedimentos concursais abertos ao abrigo dos n.ºs 4 a 6 do artigo 30.º da LTFP não há qualquer prioridade de recrutamento a favor dos candidatos vinculados por tempo indeterminado em detrimento dos restantes, antes devendo ser respeitada a preferência estabelecida no n.º 1 do artigo 66.º da LTFP, a favor dos trabalhadores contratados a termo, em caso de igualdade de classificação.

  

O técnico superior

 

(José Manuel Martins Lima)

 

By |2023-10-23T09:09:23+00:0023/11/2016|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Procedimento concursal; recrutamento nos termos dos n.ºs 4 a 6 do artigo 30.º da LTFP.

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