RGEU; âmbito de aplicação; licença de utilização; exigência; isenção

A Câmara Municipal de ..., por ofício n.º ..., de ..., solicita-nos a emissão de parecer jurídico que responda à seguinte questão:

Pretendendo o Município emitir certidão que isente de licença de utilização as edificações construídas em data que o RGEU – D.L. n.º 38 382, de 7 de Agosto de 1951 – e o D.L. n.º 166/70, de 15 de Abril lhes não era aplicável, por ausência de deliberação municipal que tornasse extensível estes regimes a todo o Concelho de ... (e não somente dentro do perímetro urbano e das zonas rurais de proteção fixadas para as sedes do concelho…) tendo em atenção as deliberações da Assembleia Municipal (7 de Janeiro de 1987 e 16 de Novembro de 1993), pergunta-se quais as datas a considerar e os procedimentos a seguir?

Assim, temos a informar:

É consabido que só com o Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) passou a ser exigível o licenciamento municipal das edificações - art.º 1º :

“ A execução de novas edificações ou de quaisquer obras de construção civil, reconstrução, ampliação, alteração, reparação ou demolição de edificações e obras existentes, e bem assim os trabalhos que impliquem alteração da topografia local, dentro de perímetro urbano e das zonas rurais de proteção fixadas para as sedes do concelho e para as demais localidades sujeitas por lei a plano de urbanização e expansão, subordinar-se-ão às disposições do presente regulamento”. Realçado nosso.

Para que se aplicasse o RGEU à restante área do Concelho, teria que o Município torná-lo extensível por deliberação municipal e, em todos os casos, às edificações de caráter industrial ou de utilização coletiva – artigo único do artigo 1º do RGEU.

Também se sabe que o D. L. n.º 166/70, de 15 de Abril, (licenciamento de obras particulares) não alterou esta exigência.

Ou seja, teremos em primeiro lugar que saber a partir de que data, no Município de ..., foi aplicado o RGEU a todo o concelho. 

E, se ao abrigo da vigência do D.L. n.º 166/70 existiu tal deliberação?

Resulta da leitura, não da deliberação da Assembleia Municipal de 1993 (que confunde licença de utilização com licença de construção, que só se pode exigir a primeira quando se concedeu a segunda) mas das deliberações deste órgão com data de Dezembro de 1986 e de Janeiro de 1987, que o RGEU/D.L n.º 166/70 passou, então, a vigorar para todo o concelho de ....

Dito de outro modo, a partir de Janeiro de 1987, no Concelho de ..., qualquer edificação nova, reconstruída, alterada ou ampliada e ainda aquelas mencionadas no art.º 1º do RGEU (exceto as isentas pelo Regulamento) estaria sujeita a licença municipal.
Isto no pressuposto que até Janeiro de 1987, não exista deliberação municipal ou Regulamento de extensão que tenha tornado extensivo o licenciamento municipal a todo o território municipal.

Do conteúdo das atas da Assembleia Municipal, a n.º sete de Dezembro de 1986, tem na sua ordem de trabalhos sob o ponto 9, “Discussão e Votação do Regulamento Sobre Licenciamento de Obras e Loteamentos Urbanos”, tendo este ponto transitado para a sessão da Assembleia Municipal de 7 de Janeiro de 1987, ata n.º 8, que aprovou o referido Regulamento.

Do conteúdo e conjugação das diversas normas do Regulamento, que não do texto da deliberação, é nosso entendimento que se pretendeu efetuar a referida extensão de licenciamento municipal a todas as edificações do concelho, exceto daquelas que estão isentas pelo Regulamento.

E, a partir do Regime Jurídico do Licenciamento Municipal de Obras Particulares, D.L n.º 445/91, de 15 de Outubro que entrou em vigor 90 dias após a sua publicação, a licença de construção e a licença de utilização foi exigível para todas as edificações em todo o território nacional, exceto as isentas, independentemente da existência ou não de deliberação municipal de extensão ou de Regulamento.

Aqui chegados, desde que os particulares comprovem a data da construção/isenção, após a instrução do procedimento administrativo tida por necessária para estes efeitos, assim também lhes será emitida a competente certidão.


A Chefe de Divisão de Apoio Jurídico


(Rosa Maria Casalta Batanete)

By |2023-10-23T14:03:18+00:0021/09/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em RGEU; âmbito de aplicação; licença de utilização; exigência; isenção

Aposentadas; senhas de presença; O.E. 2011; opção de remuneração; eleitos locais

A Câmara Municipal de ..., solicita através do ofício n.º ..., de ..., a emissão de parecer jurídico quanto à questão de saber o seguinte:

Nos termos do n.º 1 do art.º 9º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro, na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, determina-se: 

“ Nos casos em que os titulares de cargos políticos em exercício de funções se encontrem na condição de aposentados, pensionistas, reformados ou reservistas devem optar ou pela suspensão do pagamento da pensão ou pela suspensão da remuneração correspondente ao cargo político desempenhado.”

Atendendo, que tem vindo a ser entendido por parte da doutrina que o abono da senha de presença assume a natureza de remuneração pelo exercício daquele cargo, pergunta-se se tal abono pode ser pago aos membros da assembleia cumulativamente com a pensão/aposentação/ reforma ou se aqueles membros terão que fazer a opção conforme a norma supra mencionada, e consequentemente não se proceder ao pagamento da senha de presença no caso do eleito local ter optado pela pensão/aposentação/reforma.


Assim, temos a informar:

A Lei n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro que alterou o regime relativo a pensões e subvenções dos titulares de cargos políticos e o regime remuneratório dos titulares de cargos executivos das autarquias locais estabelecia no seu art.º 9º, sob a epígrafe “Limites às cumulações: 

“1 - Nos casos em que os titulares de cargos políticos em exercício de funções se encontrem na condição de aposentados, pensionistas, reformados ou reservistas, independentemente do regime público ou privado que lhes seja aplicável, é-lhes mantida a pensão de aposentação, de reforma ou a remuneração na reserva, sendo-lhes abonada uma terça parte da remuneração base que competir a essas funções, ou, em alternativa, mantida a remuneração devida pelo exercício efectivo do cargo, acrescida de uma terça parte da pensão de aposentação, de reforma ou da remuneração na reserva que lhes seja devida. 
2 - O limite previsto no número anterior não se aplica às prestações de natureza privada a que tenham direito os respectivos titulares, salvo se tais prestações tiverem resultado de contribuições ou descontos obrigatórios. 
3 - A definição das condições de cumulação ao abrigo do n.º 1 é estabelecida em conformidade com declaração do interessado, para todos os efeitos legais.” 
Ora, a redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, não altera a génese do preceito no que respeita ao conceito de remuneração, correspondente ao cargo político desempenhado.

Na redação originária permitia-se, assim, que os aposentados, pensionistas, reformados e reservistas, titulares de cargos políticos em exercício de funções conservassem a aposentação/pensão/reforma com a terça parte da remuneração base que competia a tais funções, ou, em alternativa, que mantivessem a remuneração devida pelo exercício efetivo do cargo, acrescida de 1/3 de parte da aposentação/pensão/reforma.
Perante a nova redação, não é possível a cumulação de qualquer uma destas remunerações, apenas podendo o titular do cargo político optar por qualquer uma delas.

Para efeitos da Lei n.º 52-A/2005, o art.º 10º, elenca os titulares de cargos políticos, circunscrevendo os seus efeitos aos eleitos locais, em regime de tempo inteiro – alínea f) do preceito.

Mas, perante tal determinação, imposta pelo novo artigo 9º, surge a questão de quais os titulares de cargos políticos das autarquias que são abrangidos? Todos? E que remunerações correspondem ao cargo político desempenhado?

É, consabido que esta medida de alteração ao artigo 9º da Lei n.º 52-A/2005, insere-se no conjunto de medidas adicionais de redução de despesa com vista à consolidação orçamental, prevista no Programa de Estabilidade e Crescimento para 2010 a 2013.

As remunerações dos eleitos locais, regem-se por estatutos próprios, EEL, aprovados pela Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, com a redação dada pela Lei n.º 52-A/2005 que a republicou, e quanto aos titulares das juntas de freguesia, na Lei n.º 11/96, de 18 de Abril.

E, consideram-se eleitos locais, para efeitos de tal lei, os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias.
Como se sabe, estes eleitos podem desempenhar as suas funções em regime de permanência, em regime de meio tempo e em regime de não permanência.

E, é nesta especificidade de desempenho que poderemos encontrar a resposta à questão que nos é colocada.

Senão vejamos.

Não temos duvidas que os eleitos locais em regime de permanência a tempo inteiro estão abrangidos pelo artigo 9º da Lei n.º 52-A/2005, atendendo ao prescrito pela alínea f) do seu artigo 10º.

Dúvidas nos surgem é se os eleitos locais em regime de não permanência e que, por força do art.º 10º da Lei n.º 29/87, apenas têm direito a uma senha de presença por cada reunião ordinária ou extraordinária do respetivo órgão e das comissões que compareçam e participem, estejam abrangidos por este dispositivo legal.

Melhor explicitando, será que as senhas de presença, para efeitos do citado artigo 9º, estão incluídas no conceito e expressão «remuneração correspondente ao cargo político desempenhado»?

Mais, e será que o desempenho de funções em regime de não permanência consubstancia em si mesmo o desempenho de uma atividade profissional que por tal facto deve ser remunerada?

Efetivamente, consideramos que a ratio da atual redação do art.º 9º da Lei n.º 52-A/2005, é precisamente não permitir a acumulação de remunerações de atividades profissionais desempenhadas por aposentados/pensionistas/reformados com a própria pensão de aposentação ou reforma.

A expressão prevista no n.º 1 do art.º 9º da Lei n.º 52-A72005, na sua atual redação «remuneração correspondente ao cargo político desempenhado», conforme se pode ler no Parecer da PGR n.º 10/2011, publicado no D.R, 2ª Série, de 28 de Setembro, “…corresponde exatamente à expressão «remuneração base que competir a essas funções» contida na versão inicial do preceito. Ela corresponde à retribuição correspetiva do exercício de funções.
A «remuneração correspondente» ao cargo ou às funções refere-se, pois, à remuneração base legalmente prevista para o cargo desempenhado, podendo ainda abranger um conjunto de prestações que, abonadas de forma regular, se fundam diretamente na prestação funcional e, por isso, se configuram como correspetivas das funções exercidas.”

Ou seja, então, a remuneração correspondente ao cargo desempenhado, está interligado com outro conceito que temos aqui que trazer à colação, sob pena de o que o legislador pretendeu ficar aquém do alcançado.

Se esta remuneração está ou não indexada ao exercício de uma atividade profissional pública.

Salvo melhor opinião, consideramos que o intuito do legislador foi abranger os titulares de cargos políticos em exercício de funções decorrentes de uma atividade profissional pública e neste contexto terem que optar por uma ou por outra.

E, esta perspetiva é toda ela alicerçada não só no fundamento teleológico das incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos, como nos restantes preceitos que compõem o nosso sistema atualista de aposentação/pensão/reforma relacionado, necessariamente, com uma atividade profissional. 

Tome-se atenção ao que ficou escrito, com este propósito nos Pareceres da PGR n.ºs 54/90, e em especial no n.º 120/2005, publicado no D.R, 2ª Série, de 07/08/2006.

“…cumpre averiguar se o desempenho de funções autárquicas numa junta de freguesia integra o exercício de actividade profissional pública.

Esta indagação convoca toda a reflexão que este Conselho tem empreendido, em anteriores ocasiões, para caracterizar o conceito de «actividades profissionais» ou de «funções profissionais», quer no quadro da Lei n.º 9/90 (artigo 2º alínea a)), quer da Lei n.º 64/93 (artigo 4º, n.º2).

Note-se, neste ponto, que a Lei nº 9/90 usou a locução «actividades profissionais» por contraposição a «actividades (…) de função pública» e numa perspectiva de exercício remunerado, pelo que aquela se reportava a actividades profissionais privadas remuneradas, enquanto a Lei nº 64/93 adoptou genericamente a designação «funções profissionais», sem distinguir entre sector público e sector privado, e com o intuito expresso de abranger tanto o exercício remunerado como o não remunerado ([64]). Em todo o caso, o que se discorreu sobre o conceito de «actividades profissionais» é facilmente transponível para o de «funções profissionais».

Vejamos o que, a este propósito, se escreveu no Parecer nº 54/90: 
«Actividade profissional é aquela que respeita ao exercício de uma profissão. 
O conceito “profissão” corresponde ao termo latino “professio”, que deriva do infinitivo do verbo latino “profiteri”, com o significado de manifestar ou exprimir o modo de vida ou o género de trabalho exercido por uma pessoa. O conceito de “profissão traz consigo a ideia do exercício de um ofício, (…) ou cargo, com habitualidade” (-). 
(…) 
O conceito “profissão”, independentemente da perspectiva de análise – económica, sociológica, filosófica, psicológica ou outra –, tem evoluído, a par da permanente transformação da realidade sócio-económica, no sentido de cada vez maior abertura. 
A actividade profissional já não é apenas aquela que é quotidianamente exercida no tempo pleno institucionalizado, com o escopo de provisão às necessidades de existência do respectivo agente. À condição profissional basta a realização regular de trabalho, enquadrada em determinado posto ou função, no âmbito de consecução de certo objectivo final. 
(…) 
A averiguação relativa à aplicação daquele conceito em cada caso passa pela análise, à luz de critérios indiciários que tenham em linha de conta, além do mais, a relevância/ /irrelevância, a regularidade/irregularidade, a estabilidade/ /instabilidade do exercício da actividade desenvolvida em paralelo com a que é própria do cargo político ou do alto cargo público, a existência/inexistência e a natureza da contrapartida remuneratória, o enquadramento/desenquadramento face a certo conjunto organizativo dirigido a um escopo final determinado ou relativo a certo título socialmente institucionalizado, a conexão/desconexão de cargos, a exigência/inexigência de específica qualificação.
 
Já no Parecer nº 128/96, analisando a expressão «funções profissionais» do artigo 4º da Lei nº 64/93 (que alude a exercício remunerado e não remunerado), afirma-se o seguinte: 
«Independentemente de se cuidar de saber se a expressão é, em si, absolutamente rigorosa, o que se afigura patente é que através dela o legislador se terá querido reportar a actividades regulares, habituais, por contraposição a actividades esporádicas ou ocasionais.»

Diremos que, com esse Parecer nº 128/96 – conforme se salientou no Parecer nº 24/98, que procede a uma síntese dos anteriores contributos teóricos –, «se acentuou a linha de progressiva abertura do conceito, numa visão que desligou “profissão”, necessariamente, de “remuneração”, e a associou, sim, à ideia de “actividade permanente, estável”».

Mas apesar da sedimentação de critérios desenvolvida neste Conselho, há que reconhecer – como também o fez o citado Parecer nº 24/98 – que «[a] flexibilidade do conceito implica a insuficiência de um único critério válido de profissionalidade, e exige a ponderação, no caso concreto, da concorrência dos vários parâmetros antes assinalados». 

A uma tal ponderação, no presente caso, nos passamos a dedicar.

 Poderão, então, as funções de membro de junta de freguesia (como, v.g., as correspondentes aos cargos de presidente ou secretário) ser qualificadas como exercício de actividade profissional pública?

Recorde-se que, em geral, os autarcas podem exercer as suas funções em regime de permanência ou de não permanência – e, na primeira situação, em regime de tempo inteiro ou de meio tempo. E o mesmo vale para os membros de junta de freguesia, como resulta dos artigos 26º a 28º da Lei nº 169/99 e 5º a 8º da Lei nº 11/96. 
Vimos também como hoje o conceito de «actividade profissional» se encontra desligado de uma ideia de modo de vida duradouro: basta que exista uma certa habitualidade ou estabilidade; basta o desempenho regular em posto de trabalho ou cargo, integrado numa estrutura finalística, independentemente de a respectiva actividade ser ou não realizada como meio de vida.

Ora, se se pode dizer que as funções autárquicas – por serem funções a prazo certo, fixado em quatro anos ([65])([66]) – revestem um carácter temporário, não duradouro, não deixa de ser exacto que, enquanto dura o concernente mandato, o mesmo é susceptível de ser exercido numa lógica de continuidade e de regularidade. 

Tal sucede, claramente, quando o mandato é executado em regime de permanência, seja a tempo inteiro, seja a tempo parcial – aí há regularidade e habitualidade, correspondendo-lhe, aliás, a percepção de uma remuneração proprio sensu. Mas o desempenho do cargo já se afigura irregular e descontínuo quando os membros da autarquia não exerçam o mandato em regime de permanência – nesse caso, a sua participação nas tarefas autárquicas será pouco mais que ocasional, o que explica a não atribuição de uma verdadeira remuneração (mas antes de uma compensação para encargos ou de senhas de presença). Na primeira situação poderá falar-se de «actividade profissional», mas já não na segunda. 

Em reforço deste entendimento pode apontar-se a letra do nº 3 do artigo 2º do Estatuto dos Eleitos Locais, que prevê, no seu proémio, que «[o]s membros de órgãos executivos que não exerçam as respectivas funções em regime de permanência ou de meio tempo serão dispensados das suas actividades profissionais, mediante aviso antecipado à entidade empregadora» ([67]). Note-se que, segundo este preceito, os autarcas em regime de não permanência são dispensados «das suas actividades profissionais» e não das suas outras actividades profissionais – o que sugere que o legislador não vê, nesse caso, a função autárquica como uma verdadeira «actividade profissional».

Este argumento foi aduzido, aliás, no já referenciado Parecer nº 24/98. Aí discutia-se a possibilidade de cumulação entre um cargo equiparado a director-geral, a que estava vedado o exercício de «quaisquer outras funções profissionais, remuneradas ou não», e o cargo de vereador de câmara municipal em regime de não permanência. E entendeu-se que este cargo, exercido nesse específico regime, não correspondia ao desempenho de uma «função profissional», com a seguinte argumentação:

«O “Estatuto dos Eleitos Locais” refere que (…) [o vereador em regime de não presença (…). 
Dispensado “das suas actividades profissionais”, e não, sublinhe-se, das suas outras atividades profissionais.
 
Ora, face a este quadro de actividade como vereador, em que se atenta no grau de relevância, de regularidade e estabilidade do cargo, no tipo de remuneração, e até na não exigência de qualificação específica, é que cremos que se não está perante qualquer “função profissional”.» 

Como bem se depreendeu, deste douto parecer, também nós propendemos para o entendimento de que o legislador da Lei do Orçamento para 2011, ao alterar o art.º 9º da Lei n.º 52-A/2005, mais não quis do que abranger todos aqueles cargos políticos em exercício de funções, funções estas que integram o exercício de uma atividade profissional pública.

O mesmo é dizer para o que aqui interessa, que os eleitos locais em regime de não permanência, visto que não exercem qualquer atividade profissional pública, não estão abrangidos pelo art.º 9º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro, na redação introduzida pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, não só porque este tipo de eleitos não se encontra incluído nos titulares de cargos políticos elencados no artigo 10º deste diploma, mas também porque o referido artigo 9º respeita a cumulação de remunerações derivadas do exercício de uma atividade profissional remunerada.



A Chefe de Divisão de Apoio Jurídico


(Rosa Maria Casalta Batanete)

By |2023-10-23T14:04:43+00:0018/09/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Aposentadas; senhas de presença; O.E. 2011; opção de remuneração; eleitos locais

LOE/2012; redução de efectivos; cessação de acordo de cedência de interesse público e de comissão de serviço; regresso ao serviço de origem.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal de ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre-nos esclarecer o seguinte:

Numa perspectiva estritamente jurídica, em que, naturalmente, não cabe a análise dos critérios de contabilização e controle de efectivos que, no âmbito do SIIAL, são utilizados, relevará salientar o disposto no artigo 58.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro – abreviadamente, LVCR – aplicada à administração local pelo Decreto-lei n.º 209/2009, de 3 de Setembro, ambos na actual redacção, quando prescreve:
“1 - Há lugar à celebração de acordo de cedência de interesse público quando um trabalhador de entidade excluída do âmbito de aplicação objectivo da presente lei deva exercer funções, ainda que a tempo parcial, em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável e, inversamente, quando um trabalhador de órgão ou serviço deva exercer funções, ainda que no mesmo regime, em entidade excluída daquele âmbito de aplicação.
2 - O acordo pressupõe a concordância escrita do órgão ou serviço, do membro do Governo respectivo, da entidade e do trabalhador e implica, na falta de disposição em contrário, a suspensão do estatuto de origem deste.
3 - A cedência de interesse público sujeita o trabalhador às ordens e instruções do órgão ou serviço ou da entidade onde vai prestar funções, sendo remunerado por estes com respeito pelas disposições normativas aplicáveis ao exercício daquelas funções.
4 - O exercício do poder disciplinar compete à entidade cessionária, excepto quando esteja em causa a aplicação de penas disciplinares expulsivas.
5 - Os comportamentos do trabalhador cedido têm relevância no âmbito da relação jurídica de emprego de origem, devendo o procedimento disciplinar que apure as infracções disciplinares respeitar o estatuto disciplinar de origem.
6 - O trabalhador cedido tem direito:
a) À contagem, na categoria de origem, do tempo de serviço prestado em regime de cedência;
b) A optar pela manutenção do regime de protecção social de origem, incidindo os descontos sobre o montante da remuneração que lhe competiria na categoria de origem;
c) A ocupar, nos termos legais, diferente posto de trabalho no órgão ou serviço ou na entidade de origem ou em outro órgão ou serviço.
7 - No caso previsto na alínea c) do número anterior, o acordo de cedência de interesse público caduca com a ocupação do novo posto de trabalho.
8 - O acordo pode ser feito cessar, a todo o tempo, por iniciativa de qualquer das partes que nele tenham intervindo, com aviso prévio de 30 dias.
9 - Não pode haver lugar, durante o prazo de um ano, a cedência de interesse público para o mesmo órgão ou serviço ou para a mesma entidade de trabalhador que se tenha encontrado cedido e tenha regressado à situação jurídico-funcional de origem.
10 - No caso previsto na primeira parte do n.º 1, o exercício de funções no órgão ou serviço é titulado através da modalidade adequada de constituição da relação jurídica de emprego público.
11 - As funções a exercer em órgão ou serviço correspondem a um cargo ou a uma carreira, categoria, actividade e, quando imprescindível, área de formação académica ou profissional.
12 - Quando as funções correspondam a um cargo dirigente, o acordo de cedência de interesse público é precedido da observância dos requisitos e procedimentos legais de recrutamento.
13 - O acordo de cedência de interesse público para o exercício de funções em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável tem a duração máxima de um ano, excepto quando tenha sido celebrado para o exercício de um cargo ou esteja em causa órgão ou serviço, designadamente temporário, que não possa constituir relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado, casos em que a sua duração é indeterminada.
14 - No caso previsto na alínea b) do n.º 6, o órgão ou serviço ou a entidade comparticipam:
a) No financiamento do regime de protecção social aplicável em concreto com a importância que se encontre legalmente estabelecida para a contribuição das entidades empregadoras;
b) Sendo o caso, nas despesas de administração de subsistemas de saúde da função pública, nos termos legais aplicáveis.
15 - Quando um trabalhador de órgão ou serviço deva exercer funções em central sindical ou confederação patronal, ou em entidade privada com representatividade equiparada nos sectores económico e social, o acordo pode prever que continue a ser remunerado, bem como as correspondentes comparticipações asseguradas, pelo órgão ou serviço.
16 - No caso previsto no número anterior, o número máximo de trabalhadores cedidos é de quatro por cada central sindical e de dois por cada uma das restantes entidades.”

Numa perspectiva algo diferente, mas de idêntico sentido no que ao objectivo que se pretende demonstrar diz respeito, valerá realçar o disposto no n.º 2 do artigo 28.º do Estatuto do Pessoal Dirigente aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, na redacção republicada pela Lei n.º 64/2011, de 22 de Dezembro, adaptado à Administração Local pela Lei n.º 49/2012, de 29 de Agosto (cfr., artigo 1.º), quando estabelece:
“O pessoal dirigente conserva o direito ao lugar de origem e ao regime de segurança social por que está abrangido, não podendo ser prejudicado na sua carreira profissional por causa do exercício daquelas funções, relevando para todos os efeitos no lugar de origem o tempo de serviço prestado naquele cargo.” 

Servem os trechos realçados para significar que, quer num como noutro caso, e salvo melhor opinião, tanto a certeza do regresso ao serviço de origem quanto a garantia de que o exercício de funções em postos de trabalho diferentes dos originários assumiriam relevância jurídica, para todos os efeitos, aquando do regresso, se configuravam como direitos pré-existentes à constituição das situações temporárias de desempenho de funções em regime de cedência de interesse público, num caso, e de comissão de serviço, no outro, sendo que qualquer deles se sustenta e legitima pela prossecução do interesse público.

Terá sido, aliás, a ponderação deste enquadramento, e, certamente, do interesse público subjacente a ambos os casos, que terá levado a autarquia, e, a nosso ver, bem, a conservar, no respectivo mapa de pessoal, a previsão dos postos de trabalho que os trabalhadores originariamente ocupavam.

Daí que, neste contexto, e reiteramos, numa perspectiva estritamente jurídica, não se compreenda muito bem como poderá o regresso dos trabalhadores em apreço ser passível de, no âmbito do SIIAL, ser reportado como entrada de pessoal, situação que, em nossa opinião, só a respectiva entidade gestora poderá clarificar.


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)


NOTA: Na sequência do alvitrado na parte final do presente parecer e caso não resulte qualquer clarificação, sempre se poderá prestar a informação no âmbito do SIIAL, fazendo-se acompanhar de nota explicativa que suporte o entendimento da Câmara.

By |2023-10-23T14:08:00+00:0014/09/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em LOE/2012; redução de efectivos; cessação de acordo de cedência de interesse público e de comissão de serviço; regresso ao serviço de origem.

Faltas por procriação medicamente assistida; qualificação; efeitos.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal de ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre-nos esclarecer o seguinte:

Analisando os argumentos aduzidos na informação dos serviços, em defesa da sustentação da 2.ª conclusão ali proposta, e subsequente aplicação do regime constante do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, não nos eximimos de chamar à colação alguns aspectos.

Concedendo, de bom grado, que o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – abreviadamente, RCTFP – aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, tenha sido elaborado com base no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que não no Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro (que aprovou um novo Código do Trabalho – artigo 1.º – e revogou expressamente a Lei n.º 99/2003 – alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º), não deixa de assumir particular importância a circunstância de nenhum dos dois primeiros diplomas citados lançar mão ou fazer qualquer referência, ainda que ligeira, em qualquer dos seus preceitos, ao conceito de procriação medicamente assistida.

Por outro lado, tendo este conceito sido introduzido na versão originária do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, no artigo 249.º – cujo início de vigência determinou a sujeição dos trabalhadores da administração pública ao regime da maternidade e paternidade plasmado nos seus artigos 33.º a 65.º, inclusive, por força do artigo 22.º da Lei n.º 59/2008, que aprovou o RCTFP – mal se compreenderia que o legislador não aproveitasse o ensejo para enquadrar e conferir relevância ao referido conceito. Certamente não o terá pretendido.

Por último, tendo o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, sido alterado, por diversas vezes, em datas posteriores à da entrada em vigor daquele Código – nomeadamente, pelo Decreto-lei n.º 89/2009, de 09 de Abril de 2009, pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, pelo Decreto-lei n.º 124/2010, de 17 de Novembro e pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro – e tendo o próprio Código de Trabalho sido, também, objecto de alterações várias, sem que o legislador tenha lançado mão do conceito no âmbito da administração pública, afigura-se-nos não subsistirem argumentos jurídicos bastantes para sustentarem a 2.ª conclusão aventada na informação dos serviços, razão por que, cremos, deverá ser adoptada a primeira das conclusões ali enunciadas, isto é, serem as faltas dadas por procriação medicamente assistida qualificadas como faltas por doença do trabalhador, com as necessárias e legais consequências.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal de ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre-nos esclarecer o seguinte:

Analisando os argumentos aduzidos na informação dos serviços, em defesa da sustentação da 2.ª conclusão ali proposta, e subsequente aplicação do regime constante do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, não nos eximimos de chamar à colação alguns aspectos.

Concedendo, de bom grado, que o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – abreviadamente, RCTFP – aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, tenha sido elaborado com base no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que não no Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro (que aprovou um novo Código do Trabalho – artigo 1.º – e revogou expressamente a Lei n.º 99/2003 – alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º), não deixa de assumir particular importância a circunstância de nenhum dos dois primeiros diplomas citados lançar mão ou fazer qualquer referência, ainda que ligeira, em qualquer dos seus preceitos, ao conceito de procriação medicamente assistida.

Por outro lado, tendo este conceito sido introduzido na versão originária do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, no artigo 249.º – cujo início de vigência determinou a sujeição dos trabalhadores da administração pública ao regime da maternidade e paternidade plasmado nos seus artigos 33.º a 65.º, inclusive, por força do artigo 22.º da Lei n.º 59/2008, que aprovou o RCTFP – mal se compreenderia que o legislador não aproveitasse o ensejo para enquadrar e conferir relevância ao referido conceito. Certamente não o terá pretendido.

Por último, tendo o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, sido alterado, por diversas vezes, em datas posteriores à da entrada em vigor daquele Código – nomeadamente, pelo Decreto-lei n.º 89/2009, de 09 de Abril de 2009, pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, pelo Decreto-lei n.º 124/2010, de 17 de Novembro e pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro – e tendo o próprio Código de Trabalho sido, também, objecto de alterações várias, sem que o legislador tenha lançado mão do conceito no âmbito da administração pública, afigura-se-nos não subsistirem argumentos jurídicos bastantes para sustentarem a 2.ª conclusão aventada na informação dos serviços, razão por que, cremos, deverá ser adoptada a primeira das conclusões ali enunciadas, isto é, serem as faltas dadas por procriação medicamente assistida qualificadas como faltas por doença do trabalhador, com as necessárias e legais consequências.

Não obstante se nos afigurar ser este o entendimento que parece decorrer directamente da interpretação das normas legais citadas, achamos não dever deixar de, atentas as preocupações manifestadas no pedido de parecer, transcrever o entendimento da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público, sobre a matéria:
“As faltas “em observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida” devem ser qualificadas como faltas justificadas “por motivo não imputável ao trabalhador”;

- Assim, no caso das trabalhadoras em funções públicas, consoante a modalidade de relação jurídica de emprego público constituída – nomeação ou contrato de trabalho em funções públicas – e, consequentemente, o regime jurídico que, nesta matéria, lhes seja aplicável, as faltas em causa enquadram-se, respetivamente, na alínea x) do n.º 1 do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31/03, ou na alínea d) do n.º 2 do artigo 185.º do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP);

- Com efeito, resultando essas faltas de observância de prescrição médica, e, nessa medida, tendo por fundamento uma situação que, não lhe sendo imputável, impedirá o cumprimento pela trabalhadora do seu dever de assiduidade ou o dificulta em termos que afastam a sua exigibilidade, afigura-se ser aquele o enquadramento normativo mais adequado;

- Em abono do presente entendimento e tendo em conta a unidade do sistema jurídico, veja-se o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 249.º do Código do Trabalho (sob a epígrafe “Faltas justificadas”), anexo à Lei n.º 7/2009, de 12/02, na qual são referidas, a título exemplificativo, algumas das situações passíveis de ser qualificadas como faltas justificadas motivadas por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador, mencionando-se expressamente, entre outras, a “observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida”;

- Considerando, assim, a referida qualificação, e atento o disposto no n.º 4 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31/03, e nos n.ºs 1 e 2 (a contrario) do artigo 191.º do RCTFP (sem prejuízo do disposto no n.º 3 deste último artigo e respetivos efeitos), entende esta Direcção-Geral que as faltas justificadas das trabalhadoras em funções públicas em observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida não determinam a perda de remuneração.”


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)


NOTA: A interpretação da DGAEP, atende à unidade do sistema jurídico e à interpretação sistemática que essa unidade impõe.
By |2023-10-23T14:09:27+00:0011/09/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Faltas por procriação medicamente assistida; qualificação; efeitos.

Remunerações; redução; faltas por doença; remuneração de exercício e descontos obrigatórios; cálculo.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., dos Serviços Municipalizados ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre tecer as seguintes considerações:

Como é sabido, por força do disposto no artigo 19.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (abreviadamente, RCTFP), na parte relevante, “os … trabalhadores a integrar no regime de protecção social convergente mantêm-se sujeitos às normas que lhes eram aplicáveis à data de entrada em vigor da presente lei em matéria … de doença” (n.º 2), sendo que, “até à regulamentação do regime de protecção social convergente, os trabalhadores referidos no número anterior mantêm-se sujeitos às demais normas que lhes eram aplicáveis à data de entrada em vigor da presente lei, designadamente as relativas à manutenção do direito à remuneração, justificação, verificação e efeitos das faltas por doença …” (n.º 3).

O mesmo é dizer que, por força dos preceitos transcritos, nos vemos remetidos para o que sobre a matéria se encontra regulado nos artigos 29.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de Março, de que decorre, nos termos do n.º 2 do preceito, que “salvo nos casos de internamento hospitalar, as faltas por doença determinam a perda do vencimento de exercício” [numa leitura atualista, remuneração de exercício, no montante de um sexto da remuneração base diária, multiplicado pelo número de dias de ausência, e não “30 sextos”(?) – cfr., artigos 70.º e 85.º da Lei n.º 12-A/2008, abreviadamente, LVCR] “apenas nos primeiros trinta dias de ausência, seguidos ou interpolados, em cada ano civil.”

Ocorre, porém, que mercê das reduções remuneratórias introduzidas pelo artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, mantido em vigor pelo n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2012, não pode deixar de fazer-se uma interpretação corretiva do conceito de remuneração base, tal como está definido no artigo 70.º da LVCR, sob pena de, não o fazendo, se estarem a penalizar duplamente os trabalhadores que sofreram as aludidas reduções, penalização que o legislador terá expressamente afastado.

Neste sentido, basta pensar que os descontos obrigatórios e facultativos elencados no artigo 77.º da LVCR incidem, atualmente, sobre as remunerações ilíquidas efetivamente atribuídas aos trabalhadores e não sobre as remunerações base decorrentes da tabela remuneratória única aprovada pelo Decreto Regulamentar n.º 14/2008, de 31 de Julho, conjugada com a Portaria n.º 1553-C/2008, de 31 de Dezembro.

Com vista à realização daquele desiderato, curou o legislador de instituir as referidas reduções remuneratórias, em função da remuneração auferida, acautelando, entre outros, dois aspetos:
- Que nenhum trabalhador ficaria, como consequência da redução remuneratória, a auferir um montante ilíquido inferior a 1500€ (n.º 5 do artigo 19.º);
- Que todos e quaisquer descontos passariam a incidir sobre o montante ilíquido da remuneração a atribuir, apurado após efetuada a redução prevista no preceito [alínea d) do n.º 4 do art.º 19.º].

Daí a nossa asserção de que o conceito de remuneração base não pode deixar de ter em consideração a intervenção deste preceito no que à determinação do respetivo montante ilíquido diz respeito.

Consequentemente, o cálculo da remuneração de exercício, para efeitos de aplicação do artigo 29.º e seguintes do Decreto-lei n.º 100/99, não pode deixar de tomar como referência o montante ilíquido da remuneração a atribuir, depois de apurado por intervenção da redução, a saber, 1/6 de 2445.62€, no caso em apreço, o mesmo se devendo dizer, mutatis mutandis, para todos os descontos obrigatórios (de que a quota para a CGA é exemplo) e facultativos que, por lei, devam incidir sobre a remuneração base. 


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)

By |2023-10-23T14:14:41+00:0006/09/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Remunerações; redução; faltas por doença; remuneração de exercício e descontos obrigatórios; cálculo.

RCTFP; licença sem vencimento de longa duração; regresso ao serviço; regime aplicável.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Junta de Freguesia de ..., sobre o assunto referenciado em epígrafe, cumpre tecer as seguintes considerações:

Com a entrada em vigor, em 1 de Janeiro de 2009, do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – abreviadamente, RCTFP – aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, deu-se, também, início à vigência, na sua plenitude, dos novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas – abreviadamente, LVCR – constantes da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, aplicável à administração local pelo Decreto-lei n.º 209/2009, de 3 de Setembro, o que implicou, como se sabe, a elaboração de listas de transição dos trabalhadores do anterior para o novo regime de carreiras e vínculos, sendo líquido que a referida transição teve que abranger, necessariamente, e louvando-nos no entendimento sustentado pela Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público, a que aderimos, todos os trabalhadores do órgão ou serviço, incluindo aqueles que aí não exercessem funções, designadamente, que se encontrassem numa das seguintes situações: 
- exercício de funções dirigentes, no mesmo ou em outro órgão ou serviço; 
- exercício de funções em outro órgão, serviço ou entidade ao abrigo de um instrumento de mobilidade geral; 
- exercício de funções em Gabinetes Governamentais; 
- exercício de funções em organismos internacionais e comunitários; 
- exercício de actividade sindical; 
- licença (salientámos). 

Vem o aduzido a propósito de que, já aquando da aludida transição, os trabalhadores que se encontravam no gozo de licença sem vencimento de longa duração, quer como consequência da aplicação do disposto no artigo 47.º quer ao abrigo dos regimes previstos nos artigos 78.º e seguintes do Decreto-lei n.º 100/99, de 31 de Março, terão transitado, na situação de licença sem remuneração, não já com o conteúdo das normas citadas, mas com o conteúdo decorrente da LVCR e do RCTFP, nomeadamente, dos artigos 234.º e 235.º.

Veja-se, a este título, o entendimento sustentado pela Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público, na FAQ 161, que seguidamente se transcreve:
“16. Os trabalhadores que tenham atingido os limites máximos de faltas por doença e que não tenham requerido a sua apresentação à junta médica da Caixa Geral de Aposentações devem considerar-se automaticamente na situação de licença sem vencimento de longa duração?
O disposto no artigo 47.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de Março, deve ser objecto de interpretação actualista, atendendo a que as licenças sem vencimento previstas no seu artigo 73.º deixaram de pautar-se pelo que nele se estabelece no que toca aos trabalhadores em regime de contrato de trabalho em funções públicas. Passaram, efectivamente, as licenças a ter a respectiva sede legal nos artigos 234.º e 235.º do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP). Assim, e embora as faltas por doença dos trabalhadores naquele Regime continuem transitoriamente a reger-se pelo Decreto-Lei n.º 100/99 (cfr. artigo 19.º, n.º 3, da mencionada lei), a referida interpretação actualista implica que tenha que se entender que, uma vez atingidos os limites de 18 ou 36 meses consecutivos de faltas por doença fixados, respectivamente, nos seus artigos 38.º e 47.º, sem que tenham requerido, no prazo de 30 dias, a sua apresentação à citada junta médica, devem os mesmos considerar-se automaticamente em licença sem remuneração, ao abrigo dos artigos 234.º e 235.º do RCTFP” (salientado nosso). 

Posto isto, não se estranhará que se adopte idêntica interpretação actualista no que às licenças constituídas ao abrigo do disposto nos n.ºs 3, 4 e 5 do citado artigo 47.º, donde nos permitimos inferir que, caso queira regressar ao serviço, a trabalhadora:
- Tem direito à ocupação de um posto de trabalho no órgão ou serviço nas licenças de duração inferior a um ano, nas licenças para acompanhamento de cônjuge colocado no estrangeiro, para o exercício de funções em organismos internacionais e noutras licenças fundadas em circunstâncias de interesse público (situação que aqui não se verifica – n.º 4 do art.º 235.º do RCTFP); 
- Nas restantes situações de licença, constituídas antes ou depois de 1 de Janeiro de 2009, (no presente caso, bem depois de 2009), a regressar ao seu posto de trabalho ou, se o seu posto de trabalho se encontrar ocupado, a aguardar a previsão, no mapa de pessoal, de um posto de trabalho não ocupado, podendo candidatar-se a procedimento concursal para outro órgão ou serviço para o qual reúna os requisitos exigidos (n.º 4 do art.º 235.º do RCTFP). 

Acrescente-se, por último, numa resposta implícita às questões suscitadas em matéria de prazos e limites temporais de duração da licença, que, nos termos do n.º 7 do artigo 47.º do Decreto-lei n.º 100/99, e sem que se revele contrariado por qualquer preceito do RCTFP, “o regresso ao serviço do funcionário que tenha passado a qualquer das situações de licença previstas na alínea b) do n.º 1 não está sujeito ao decurso de qualquer prazo”, (cfr., n.º 4 do artigo 234.º do RCTFP).


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)


1. http://www.dgap.gov.pt/index.cfm?OBJID=b8a129f3-8eb7-4b56-932f-f084b9abab44&ID=22000000
By |2023-10-23T14:17:49+00:0017/08/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em RCTFP; licença sem vencimento de longa duração; regresso ao serviço; regime aplicável.

Projecto de arquitectura; 143 º RJIGT;

A Câmara Municipal de ..., em seu ofício refª ..., de ..., solicita parecer jurídico que esclareça, em suma, o que se deve entender por “situação juridicamente consolidada”, nos termos e para os efeitos do artigo 143º do regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial (RJIGT) - aprovado pelo D.L. 380/99, de 22.9, na sua redação atual - pretende-se concretamente saber se o ato de aprovação do projeto de arquitetura se pode enquadrar nesse conceito.

A consulta foi suscitada pela seguinte questão colocada ao município:
“Os projetos que forem submetidos a apreciação para aprovação do Município de ... durante a vigência do atual PDM e que ainda não se encontrem totalmente aprovados, leia-se, que aguardem pareceres de entidades externas e/ou tenham somente a arquitetura aprovada aquando da discussão pública, são posteriormente reanalisados com base no instrumento em vigor (atual PDM) à data da sua submissão, ou de acordo com a nova proposta de PDM?”

Recorde-se que estabelece o RJIGT, no seu artigo 143º - “Dever de indemnização” - e citamos, o seguinte:
“1 – As restrições determinadas pelos instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares apenas geram um dever de indemnizar quando a compensação nos termos previstos na secção anterior não seja possível.
2 – São indemnizáveis as restrições singulares às possibilidades objetivas de aproveitamento do solo, preexistentes e juridicamente consolidadas, que comportem uma restrição significativa na sua utilização de efeitos equivalentes a uma expropriação”. (sublinhado nosso)


Sobre o assunto, julgamos importante citar a autora Fernanda Paula Oliveira, também referenciada pelo município, em comentário ao Acórdão do STA de 5.5.1998, na parte em que, analisando a questão da natureza jurídica do ato de aprovação municipal do projeto de arquitetura, defende que “(…)” a apreciação do projeto de arquitetura é o momento certo para a câmara municipal verificar do cumprimento de uma série de condições exigidas por lei (…) que ficam definitivamente decididas tornando-se, por isso, o ato, em relação a tais aspetos, constitutivo de direitos para o requerente do licenciamento (no sentido de que ele tem o direito a que esses aspetos não voltem a  ser postos em causa no decurso do procedimento) e vinculativo para a câmara municipal no momento da decisão final. Por este motivo, a aprovação do projeto de arquitetura tem uma função estabilizadora típica dos atos administrativos”1. (sublinhado nosso)

Mais adiante, diz a autora que, “Se após a junção dos projetos das especialidades a Administração pudesse voltar a reapreciar questões anteriormente decididas a propósito do projeto de arquitetura para, com base nelas, indeferir a licença de construção, tal atitude poria em risco os princípios da proteção da confiança, da segurança jurídica e até da boa fé (…).Desta forma, a aprovação do projeto de arquitetura só poderá ser alterada ou eliminada através dos regimes de revogação dos atos administrativos constitutivos de direitos”.

Esta posição veio a ser reiterada por Fernanda Paula Oliveira, juntamente com Dulce Lopes, em “Direito do Urbanismo, Casos Práticos Resolvidos”:
“A parte inicial do procedimento de licenciamento de obras incide, pois, exclusivamente, sobre o projeto de arquitetura, visando verificar o cumprimento, por parte deste das normas, designadamente de planeamento que estejam em vigor na zona”. Com a aprovação do projeto de arquitetura, continua, “a Administração aprecia uma série de condições exigidas por lei que ficam, assim, definitivamente decididas, tornando-se, por isso, aquele ato, relativamente a estas, constitutivo de direitos (pelo menos do direito a que estas questões não voltem a ser postas em causa e discutidas no decurso do procedimento de licenciamento se aquela apreciação for válida) e sendo, também por isso, vinculativo para a câmara municipal na deliberação final”2. (sublinhado nosso).

Este é o entendimento que julgamos mais acertado e que, por isso, adotamos, respondendo à dúvida diretamente colocada, devendo notar-se, que a posição da jurisprudência se tem vindo, entretanto, a aproximar à da defendida pelas autoras citadas, sendo disso exemplo o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de Maio de 2001 (processo 46227), referido na última obra citada, ou ainda, mais recentemente, o Acórdão do Tribunal Administrativo do Sul de 25.03.2010 (processo 01460/06), onde já é feita referência a essas obras.

Tenha-se em atenção, aliás, que, atualmente, na elaboração e revisão de planos municipais de ordenamento do território, deve atender-se às seguintes orientações resultantes de reunião sobre essa e outras matérias entre as várias CCDRC, a DGOTDU e o gabinete do SEOTN, no dia 9 de Julho de 2009.
Os planos municipais de ordenamento do território podem estabelecer regimes transitórios distintos das regras do plano para os compromissos existentes que decorram de actos determinados, ou seja, aprovações do projecto de arquitectura, informações prévias favoráveis e mesmo alienações em hasta pública, desde que especificado o seu objecto, fim e prazo.
Nestes casos, o plano tem que ser obrigatoriamente acompanhado de relatório e ou planta com a indicação de todos os compromissos assumidos e salvaguardados pelo plano, nos termos da alínea c) do ponto 1 da Portaria nº 138/2005, de 2 de Fevereiro, sob pena de violação do princípio da ponderação, uma vez que apenas a sua identificação permite ao planeador ponderá-los e optar (planear) pela sua salvaguarda, bem como permite às entidades que se pronunciam sobre o plano e aos particulares conhecerem de que realidade estamos a falar.
Em suma, permite-se um regime excecional transitório para preexistências que decorram de atos determinados, incluindo aprovações do projeto de arquitetura, para além de informações prévias favoráveis e mesmo alienações em hasta pública.

Em conclusão, respondendo diretamente à questão colocada pela Câmara Municipal, um projeto de arquitetura que tenha obtido aprovação pelo município, não pode ser reanalisado com base em normas de plano municipal de ordenamento do território entradas em vigor em data posterior à data do ato, sob pena de indemnização, nos termos do artigo 143º do RJIGT.


Divisão de Apoio Jurídico

(António Ramos)

1. In Cadernos de Justiça Administrativa, nº13, Janeiro/Fevereiro 1999 (CEJUR), pag. 54.

2. In Direito do Urbanismo, Casos Práticos Resolvidos, Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes, 2010, Almedina, pag. 162 e segs.

By |2023-10-23T14:18:38+00:0016/08/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Projecto de arquitectura; 143 º RJIGT;

RCTFP; jornada contínua; dispensas para amamentação ou aleitação.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal de ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre tecer as seguintes considerações:

O horário de trabalho delimita o período de trabalho diário e semanal, determinando as horas do início e do termo do período normal de trabalho diário, bem como dos intervalos de descanso, sendo que o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – abreviadamente, RCTFP, contendo os respectivos “Regime” e “Regulamento”– aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, não regulamenta os horários de trabalho (não os enumera ou tipifica), permitindo à entidade empregadora pública fixar os horários de trabalho que, em concreto, forem mais adaptados às suas necessidades e às dos trabalhadores (artigos 121.º, e 132.º a 141.º do “Regime” – anexo I) e mantém os limites máximos dos períodos normais de trabalho que, em 31 de Dezembro de 2008, vigoravam genericamente na Administração Pública, a saber, 7 horas de trabalho por dia e 35 horas de trabalho por semana, correspondendo o trabalho a tempo completo ao período normal de trabalho semanal (35 horas), constituindo este o regime regra dos trabalhadores integrados nas carreiras gerais (artigos 126.º e 129.º a 131.º do “Regime” – anexo I).

E, para além do que expressamente se encontra previsto no RCTFP, haverá que ter em conta, no que à adopção de horários de trabalho diz respeito, o regime constante do Acordo Colectivo de Trabalho n.º 1/2009, publicado em 28 de Setembro, relativo às carreiras de regime geral, que foi objecto de extensão através do Regulamento de Extensão n.º 1-A/2010, publicado em 2 de Março, onde se encontram tipificados e regulados alguns tipos de horário de trabalho, nomeadamente, o horário flexível, a jornada contínua, a isenção de horário de trabalho e o trabalho nocturno, entre outros aspectos atinentes à duração e organização do trabalho, cada um deles com pressupostos e especificidades próprias, mas todos eles devidamente enquadrados e articulados com o conceito de horário de trabalho completo.

Atente-se que, no que toca à jornada contínua, é a própria regulamentação legal a qualificar o intervalo de 30 minutos de descanso como tempo de trabalho (n.º 1 da Cláusula 8.ª do Acordo Colectivo de Trabalho n.º 1/2009).

Ora, e consequentemente, em ordem a articular o regime legal das dispensas para aleitação e/ou amamentação consagrado no artigo 47.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro – aplicável por força do disposto no art.º 22.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, é absolutamente irrelevante o regime de horário de trabalho a que, concretamente, o trabalhador se encontra sujeito (horário flexível, jornada contínua, com isenção de horário de trabalho, horário de trabalho nocturno, trabalho por turnos, etc.), conquanto corresponda ao cumprimento de um horário de trabalho completo, como neste caso ocorre.

Por isso é que, nos termos do disposto no artigo 47.º, acima referido, “se qualquer dos progenitores trabalhar a tempo parcial, a dispensa diária para amamentação ou aleitação é reduzida na proporção do respectivo período normal de trabalho, não podendo ser inferior a 30 minutos” (n.º 5), sendo que, “na situação referida no número anterior, a dispensa diária é gozada em período não superior a uma hora e, sendo caso disso, num segundo período com a duração remanescente, salvo se outro regime for acordado com o empregador” (n.º 6).


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)   

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Acumulação de funções privadas

Tendo em atenção o exposto ... n.º ..., de ..., do Município de ..., sobre o assunto referenciado em epígrafe, tendo já esta CCDRCentro emitido parecer sobre a mesma questão, passa-se a transcrever parcialmente o mesmo, devido à sua atualidade e pertinência;

“A questão colocada envolve a análise da incompatibilidade da acumulação de funções públicas e privadas por trabalhadores inseridos em carreiras do regime geral.

A incompatibilidade aparece ligada a uma ideia de impossibilidade de exercício simultâneo de dois cargos ou funções. 
O que está em causa em causa na incompatibilidade é a garantia da imparcialidade da actuação administrativa como valor abstracto. É a própria lei que exclui a possibilidade de acumulação (ou a sujeita a autorização prévia) por suspeitar, em abstracto, dos desvios em favor de outras actividades privadas ou públicas dos fins por que se deve pautar o exercício das actividades públicas, independentemente da pessoa que se trata e do interesse que ele tem ou deixe de ter em qualquer decisão. A incompatibilidade não tem, pois, a ver com casos concretos, com procedimentos determinados (sobre incompatibilidades e impedimentos vide Mário Esteves de Oliveira...., Código do Procedimento Administrativo, vol. I, pág. 299 e ss).

Ora, após estabelecer no n.º 1 do artigo 25.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que “a existência de incompatibilidades e de impedimentos contribui para garantir a imparcialidade no exercício de funções públicas” e, no seu art.º 26.º, que “as funções públicas são, em regra, exercidas em regime de exclusividade”, prescreve o n.º 1 do art.º 28.º, também, deste diploma, que “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o exercício de funções não pode ser acumulado com o de funções ou actividades privadas” (salientado nosso).

E, em respeito pelo disposto nos números seguintes, encontram-se excepcionadas da impossibilidade de acumulação, com ou sem autorização superior, “...funções ou actividades privadas desde que as mesmas não sejam concorrentes ou similares com as funções públicas desempenhadas e que com estas sejam conflituantes” (n.º 2 do art.º 28.º), designadamente, quando, “tendo conteúdo idêntico ao das funções públicas desempenhadas, sejam desenvolvidas de forma permanente ou habitual e se dirijam ao mesmo círculo de destinatários” (n.º 3 do art.º 28.º).

Para além das referidas, podem ainda ser acumuladas, pelo trabalhador ou por interposta pessoa, funções ou actividades privadas que:
a) Não sejam legalmente consideradas incompatíveis com as funções públicas; 
b) Não sejam desenvolvidas em horário sobreposto, ainda que parcialmente, ao das funções públicas; 
c) Não comprometam a isenção e a imparcialidade exigidas pelo desempenho das funções públicas; 
d) Não provoquem algum prejuízo para o interesse público ou para os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

Por outro lado, serão de salientar, como absolutamente incompatíveis, a prestação de “serviços no âmbito do estudo, preparação ou financiamento de projectos, candidaturas ou requerimentos que devam ser submetidos à sua apreciação ou decisão ou à de órgãos ou unidades orgânicas colocados sob sua directa influência” e/ou a participação em “actos ou contratos em cujo processo de formação intervenham órgãos ou unidades orgânicas colocados sob sua directa influência” (n.ºs 1 e 2 do art.º 30.º), tipificando, os n.ºs 3 e 4 do preceito, as situações da existência de interesse directo ou indirecto do trabalhador geradoras da aludida incompatibilidade.

Excluídas as funções ou actividades privadas feridas de incompatibilidade absoluta, logo insuprível por autorização superior, e atente-se, desempenhadas “pelo trabalhador ou por interposta pessoa”, acima elencadas, vemo-nos reposicionados, quanto a outros tipos de funções ou actividades privadas, no campo da incompatibilidade relativa, em que a concessão de autorização superior para acumular funções assume particular relevância (vide, quanto a esta matéria, o disposto no art.º 29.º da referida lei).”

Quanto ao exercício de atividades privadas por certos trabalhadores de um Município, convirá dar a conhecer para este efeito, que sobre essa questão foi aprovada, por unanimidade, a seguinte conclusão em reunião de coordenação jurídica:

«Pelas razões aduzidas no presente parecer os técnicos superiores, engenheiros e arquitectos (sejam estagiário, providos em lugar do quadro ou comissão de serviço) não podem elaborar projectos de obras que sejam submetidos a licenciamento pela Câmara Municipal na qual exercem funções.

Estamos aqui perante um caso de incompatibilidade absoluta que, como tal, não poderá ser removida através da autorização nos artigos 7 º e 8 º do D.L. n º 413/93.
Estão ainda sujeitos ao sistema de impedimentos, que constitui uma garantia de imparcialidade da actividade administrativa, plasmada nos artigos 44 º a 51 º do Código do Procedimento Administrativo» (sublinhado nosso).»


Esta reunião de coordenação jurídica foi realizada nos dias 17 e 18 de Outubro de 1994, nos termos e para os efeitos do consignado no Despacho n º 40/93, de Sua Ex ª o Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, publicado no DR, II série, de 11/01/1994.

Significa, assim, que segundo o entendimento das entidades representadas na referida reunião existe incompatibilidade entre a atividade privada de elaboração de projetos integrados num procedimento cuja competência de aprovação pertence aos órgãos municipais e as atividades públicas dos arquitetos e engenheiros desempenhadas nessas mesmas Câmaras Municipais.

Ora, sendo a atual redação do artigo 28 º da Lei n º 12-A/2008, de 27/02, alterado pela Lei n.º 34/2010, de 2 de Setembro, igual à redação do artigo 2 º do Decreto-Lei n º 413/93, de 23/12, diploma em que se baseou a conclusão transcrita, o entendimento desta CCDRCentro é o constante da referida conclusão.

Isto é, existe incompatibilidade entre a atividade pública e a privada no que se prende com a elaboração nomeadamente, de peças, projetos, estudos, mapas, certificados, declarações de conformidade, ou de direção ou fiscalização de obras ou outros atos que respeitem a procedimento administrativo de operações urbanísticas que decorram ou tenham decorrido no Município de Albergaria – a – Velha, sempre que no âmbito da sua atividade pública ou privada, o trabalhador municipal, possa ter que intervir. 
Nestas circunstâncias, o mesmo é dizer, que existindo incompatibilidade apenas, na própria autarquia onde exerce funções públicas, poderão os trabalhadores exercê-las, porém, noutros municípios, que não o de Albergaria – a – Velha.

Quanto a trabalhadores que de todo se verifica que as funções privadas a exercer não conflituam com as funções públicas que exercem (ex: fiscal municipal – empregado de limpeza) a restrição acima referenciada não se justificará. 

Contudo, perante os preceitos que regulam a matéria importa retirar a conclusão de que deverá o Presidente da Câmara, ou quem detenha poderes delegados para o efeito (cfr. o n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 209/2009, de 3 de Setembro, diploma que aplicou a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, à administração local) decidir, com base na informação interna dos serviços municipais competentes, elaborada à luz dos princípios ínsitos nas normas aqui referenciadas e dos factos que caracterizam o pedido, se deverá ou não deferir o pedido de acumulação submetido à sua apreciação ou quais as respetivas condições, caso se mostre necessário determiná-las.


A Chefe da Divisão de Apoio Jurídico

(Rosa Maria Casalta Batanete)

By |2023-10-23T14:20:24+00:0008/08/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Acumulação de funções privadas

Trabalhador-Estudante; estatuto; frequência de aulas; regime.

Tendo em atenção o exposto por ... de ..., da Junta de Frequesia de ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre-nos esclarecer o seguinte:

Sem esquecer que, nos termos do n.º 1 do art.º 52.º do “Regime” do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – abreviadamente, RCTFP – aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, na actual redacção, se considera “trabalhador-estudante aquele que frequenta qualquer nível de educação escolar, bem como curso de pós-graduação, mestrado ou doutoramento em instituição de ensino, ou ainda curso de formação profissional com duração igual ou superior a seis meses”, prescreve o art.º 53.º do mesmo diploma o seguinte:
“1 — O trabalhador-estudante deve beneficiar de horários de trabalho específicos, com flexibilidade ajustável à frequência das aulas e à inerente deslocação para os respectivos estabelecimentos de ensino.
2 — Quando não seja possível a aplicação do regime previsto no número anterior, o trabalhador-estudante beneficia de dispensa de trabalho para frequência de aulas, nos termos previstos em legislação especial” (salientámos).

Por seu turno, e em ordem a proceder a um adequado enquadramento desta matéria, importa prestar a devida atenção ao que se encontra previsto no “Regulamento” do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado, também, pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro.

Desde logo, como condição da fruição das facilidades previstas no preceito transcrito, no art.º 88.º do “Regulamento” são impostas algumas obrigações ao trabalhador-estudante, realçando-se a de “comprovar perante a entidade empregadora pública a sua condição de estudante, apresentando igualmente o respectivo horário escolar”, e, “no final de cada ano lectivo, o comprovativo do respectivo aproveitamento escolar” bem como “o dever de escolher, de entre as possibilidades existentes no respectivo estabelecimento de ensino, o horário escolar compatível com as suas obrigações profissionais, sob pena de não poder beneficiar dos inerentes direitos” (salientámos).

Seguidamente, e como resulta do n.º 1 do art.º 89.º do “Regulamento”, o beneficio da dispensa da prestação de trabalho – 5 horas semanais, nos termos da alínea c) do n.º 1 do preceito – pressupõe que o respectivo horário escolar não comporte alternativas de frequência de aulas sem prejudicar essa mesma prestação.

Ou seja, e salvo melhor opinião, sem prejuízo das possibilidades de articulação com as “especificidades da frequência de estabelecimento de ensino” previstas no art.º 95.º do Regulamento”, a dispensa da prestação de trabalho para frequência de aulas só é passível de se impor à entidade empregadora com o acordo desta.

Por último, e merecedor de destaque, acresce que:
“1 — Sempre que a pretensão formulada pelo trabalhador-estudante no sentido de lhe ser aplicado o disposto no artigo 53.º do Regime e no artigo 89.º se revele, manifesta e comprovadamente, comprometedora do normal funcionamento do órgão ou serviço, fixa-se, por acordo entre a entidade empregadora pública, trabalhador interessado e comissão de trabalhadores ou, na sua falta, comissão intersindical, comissões sindicais ou delegados sindicais, as condições em que é decidida a pretensão apresentada.
2 — Na falta do acordo previsto na segunda parte do número anterior, a entidade empregadora pública decide fundamentadamente, informando por escrito o trabalhador interessado” (art.º 94.º do Regulamento – salientado nosso).

Decorre, assim, de tudo o exposto que a dispensa da prestação de trabalho para frequência de aulas, ao invés de se encontrar configurada como um direito passível de ser imposto, sempre, à entidade empregadora pública, é, antes, uma concessão que, atentas as circunstâncias concretas do caso, esta poderá ou não autorizar, nomeadamente, quando colida, total ou parcialmente, com a prestação de trabalho, caso em que pressupõe a existência de acordo entre as partes. 


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)

By |2023-10-23T14:21:53+00:0012/07/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Trabalhador-Estudante; estatuto; frequência de aulas; regime.

Membro do GAP; protecção na maternidade; substituição.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal de ..., sobre a matéria referenciada em epígrafe, cumpre-nos tecer as seguintes considerações:

Em reforço do reconhecimento da existência do conflito de interesses em situações como a que é enunciada no pedido de parecer, não será despiciendo chamar à colação o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 74.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na actual redacção, reguladores dos regimes de nomeação, exercício e exoneração dos membros dos gabinetes de apoio pessoal (cfr., a propósito, o artigo 10.º do Decreto-lei n.º 11/2012, de 20 de Janeiro, aplicável por força do n.º 6 do artigo 74.º do diploma citado) e a aparente necessidade da articulação dos regimes legais por estes instituídos com as normas reguladoras da protecção na maternidade e paternidade – a saber, artigos 33.º a 65.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, na actual redacção, ex-vi artigo 22.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro – de que merece realce, em reforço da aludida protecção e no contexto em apreço, o disposto no artigo 63.º quando, sob a epígrafe, protecção em caso de despedimento, prescreve:
“1 – O despedimento de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador no gozo de licença parental carece de parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.
2 – O despedimento por facto imputável a trabalhador que se encontre em qualquer das situações referidas no número anterior presume-se feito sem justa causa.
3 – Para efeitos do número anterior, o empregador deve remeter cópia do processo à entidade competente na área da igualdade de oportunidade entre homens e mulheres:
a) Depois das diligências probatórias referidas no n.º 2 do artigo 356.º, no despedimento por facto imputável ao trabalhador;
b) Depois da fase de informações e negociação prevista no artigo 361.º, no despedimento colectivo;
c) Depois das consultas referidas no n.º 1 do artigo 370.º, no despedimento por extinção de posto de trabalho;
d) Depois das consultas referidas no artigo 377.º, no despedimento por inadaptação.
4 – A entidade competente deve comunicar o parecer referido no n.º 1 ao empregador e ao trabalhador, nos 30 dias subsequentes à recepção do processo, considerando-se em sentido favorável ao despedimento quando quando não for emitido dentro do referido prazo.
5 – Cabe ao empregador provar que solicitou o parecer a que se refere o n.º 1.
6 – Se o parecer for desfavorável ao despedimento, o empregador só o pode efectuar após decisão judicial que reconheça a existência de motivo justificativo, devendo a acção ser intentada nos 30 dias subsequentes à notificação do parecer.
7 – A suspensão judicial do despedimento só não é decretada se o parecer for favorável ao despedimento e o tribunal considerar que existe probabilidade séria de verificação da justa causa.
8 – Se o despedimento for declarado ilícito, o empregador não se pode opor à reintegração do trabalhador nos termos do n.º 1 do artigo 392.º e o trabalhador tem direito, em alternativa à reintegração, a indemnização calculada nos termos do n.º 3 do referido artigo.
9 – Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1 ou 6” (salientado nosso).

Ora, não nos repugnando equiparar, neste contexto, a eventual cessação da nomeação do membro do gabinete de apoio pessoal a um despedimento sujeito às limitações e prescrições enunciadas no preceito, associado aos reflexos remuneratórios negativos que produziria na sua esfera jurídica durante o período de ausência por maternidade – nomeadamente, no tocante à remuneração de referência a tomar em consideração para efeitos de cálculo dos subsídios a que tem direito (cfr., artigos 4.º e 22.º do Decreto-lei n.º 89/2009, de 9 de Abril, na actual redacção) – afigura-se-nos pertinente colmatar aquilo que, aparentemente, se configura como uma lacuna, atentos os pressupostos de facto e de direito enunciados.

Em ordem a concretizar este objectivo, sobreleva como elemento relevante o facto de as nomeações dos membros dos gabinetes de apoio pessoal serem feitas em comissão de serviço (n.º 4 do artigo 74.º da Lei n.º 169/99), ainda que com características próprias que, com as associadas à comissão de serviço do pessoal dirigente (cfr., n.º 9 do artigo 21.º da Lei n.º 2/2004, alterada e republicada pela Lei n.º 64/2011, de 22 de Dezembro, que aprovou o Estatuto do Pessoal Dirigente), não são confundíveis.

Contudo, e não obstante a inexistência de norma que, de forma expressa, permita a resolução de conflitos como aquele que nos é submetido à apreciação, não nos repugna sustentar a integração da lacuna legislativa identificada através do recurso à norma jurídica que o legislador criaria no âmbito do espírito do sistema.

Falamos, claro está, do recurso, por analogia, à norma reguladora do regime de substituição do pessoal dirigente, a saber, o artigo 27.º do Estatuto do Pessoal Dirigente, na vertente circunscrita às situações de impedimento do membro do gabinete de apoio pessoal, fundamentado na necessidade de assegurar a protecção dos valores sociais eminentes em que a maternidade e a paternidade se encontram adequadamente erigidos, sem que, simultaneamente, as funções de membro do gabinete de apoio pessoal deixem de ser asseguradas.


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)

By |2023-10-23T14:21:12+00:0012/07/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Membro do GAP; protecção na maternidade; substituição.

Garantias; caução; receção parcial; devolução parcial da caução

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal da ..., pergunta-se no pedido de parecer, se é possível proceder à libertação da caução e garantias, na percentagem da parte da obra que está em condições de ser recebida, tendo em conta que a empreitada foi efetuada ao abrigo do D.L. n.º 59/99, de 2 de Março - Regime Jurídico das Empreitas de Obras Públicas, e que se trata de uma obra de rede de águas residuais, cujo prazo de garantia já expirou e feita a vistoria, para efeitos de receção definitiva, verificou-se que uma parte da obra, relativa às redes, necessita de reparações que já foram avaliadas e assumidas pelo empreiteiro.

Sobre a questão colocada, e sem perder de vista que os pareceres emitidos pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, a solicitação das entidades autárquicas, não se revestem, nesta matéria, de uma natureza vinculativa, antes se inserem no âmbito de uma assessoria jurídica voluntária, cumpre referir que, nos termos do n.º 2, alínea a), da Portaria n.º 314/2010, de 14 de Junho, as referidas solicitações deverão ser acompanhadas de informação dos serviços “que enquadre a situação, proceda à sua análise e proponha uma solução para a questão objeto de consulta” em todo o caso, sempre se dirá:

O artigo 227º do D.L. n.º 59/99, de 2 de Março estipula:
“1- Findo o prazo de garantia e por iniciativa do dono da obra ou a pedido do empreiteiro, proceder-se-á a nova vistoria de todos os trabalhos da empreitada.
2 — Se pela vistoria se verificar que as obras não apresentam deficiências, deteriorações, indícios de ruína ou de falta de solidez pelos quais deva responsabilizar-se o empreiteiro, proceder-se-á à recepção definitiva.
3 — Serão aplicáveis à vistoria e ao auto de recepção definitiva os preceitos correspondentes da recepção provisória.” Sublinhado nosso.

Por sua vez o n.º1 do artigo 228º deste decreto-lei, refere:
“1 — Se, em consequência da vistoria, se verificar que existem deficiências, deteriorações, indícios de ruína ou de falta de solidez, de responsabilidade do empreiteiro, somente se receberão os trabalhos que se encontrem em bom estado e que sejam susceptíveis de receção parcial, procedendo o dono da obra, em relação aos restantes, nos termos previstos para o caso análogo da recepção provisória.”

E, o n.º 1 do artigo 229º, também deste diploma, determina:
“1 — Feita a recepção definitiva de toda a obra, serão restituídas ao empreiteiro as quantias retidas como garantia ou a qualquer outro título a que tiver direito e promover-se-á, pela forma própria, a extinção da caução prestada.” Sublinhado nosso.

Da conjugação dos preceitos aqui referenciados, resulta, que a resposta só possa ser uma; findo o prazo de garantia da obra e verificado pela vistoria que as obras apresentam deficiências/ deteriorações/falta de solidez, da responsabilidade do empreiteiro, somente serão recebidos os trabalhos que se encontrem em bom estado e que sejam suscetíveis de receção parcial, pois que, só quando feita a receção definitiva de toda a obra serão restituídas as quantias retidas como garantia e seu reforço e proceder-se-á à extinção da caução.

Porém, este procedimento nem sempre foi assim, como também não o é no atual regime instituído pelo Código dos Contratos Públicos.

Na verdade o D.L. 59/99, adotou o regime previsto no Decreto-Lei n.º 48871, previsto no n.º 1 do seu artigo 203º, sendo certo que quer o instituído quanto a esta matéria pelo D.L. n.º 235/2006, quer pelo D.L. n.º405/93, tinham alterações importantes que foram introduzidas por ambos os diplomas.

Recorde-se que o anterior regime ao D.L. 59/99, o D. L. n.º 405/93, impunha que não se esperasse pela receção definitiva da obra para devolver ao empreiteiro o dinheiro ou títulos que estivesse depositado em prestação da caução. Em princípio, teria de o fazer decorrido que fosse um ano sobre a receção provisória, o que daqui resultava que só o primeiro dos cinco anos de garantia da obra beneficiava de meios especiais de garantia, pois que, quanto aos restantes quatro não estava o dono de obra protegido por estas.

Ou seja, com o regime do D.L. n.º 59/99 visou-se conferir ao dono de obra uma proteção total com a caução e as deduções efetuadas nos pagamentos parciais a abranger integralmente a sua função de garantir o cumprimento das obrigações assumidas pelo empreiteiro no contrato, o que quanto a nós, coloca em causa o principio da proporcionalidade, a que o atual legislador com o CCP, já deu resposta.

O n.º 1 do artigo 229º do D.L. 59/99, é bem claro quando dispõe que “Feita a receção definitiva de toda a obra, serão restituídas ao empreiteiro as quantias retidas como garantia …”.

Aliás, como explica Jorge Andrade da Silva, “Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas” 6ª edição anotada e comentada, Editora Nova Almedina em anotação ao art.º 229º “…só com a receção definitiva da obra é que se verifica o reconhecimento por parte do dono de obra, de que o contrato foi cumprido, pelo que, só então, observado o que se dispõe no artigo seguinte no que respeita aos resultados do inquérito administrativo deixará de existir razão para que o dono de obra retenha as importâncias a que o empreiteiro tem direito ou mantenha em vigor a caução que aquele prestou. Só a aprovação pelo dono da obra do auto de receção definitiva tem a virtualidade de libertar o empreiteiro de qualquer vinculo obrigacional respeitante à obra, deixando de ter a responsabilidade pelas conservações que aquela necessite e não sendo obrigado a cumprir ordens que lhe sejam transmitidas. Portanto pode dizer-se que só se tais obrigações não existirem é que não há razão para a subsistência de, qualquer garantia prestada pelo empreiteiro, pelo que só então a sua restituição ou libertação se impõe.”

Em conclusão, face a todo o exposto, e neste contexto, entende-se que, por força do n.º 1 do art.º 229º do D.L. 59/99, de 2 de Março não poderá a Câmara Municipal proceder à libertação da caução, na proporção da receção definitiva parcial das obras que estão em condições de ser recebidas, enquanto não ocorrer a receção definitiva de toda a obra. 


A Chefe de Divisão de Apoio Jurídico

(Rosa Maria da Conceição Casalta Batanete)


NOTA: No entanto, sendo o n º 1 do artigo 229 º do DL 59/99 violador   do princípio da proporcionalidade, n º 2 do art. 5 º do CPA, se interpretado literalmente, poder-se-á considerar juridicamente adequado interpretar-se restritivamente esse preceito e entender-se que poderão ser devolvidas ao empreiteiro as quantias das garantias /cauções, em proporcionalidade com as recepções definitivas parciais que tiverem ocorrido, como aliás era referido expressamente por diplomas anteriores ao DL 59/99 e é consagrado  pelo CCP, como menciona o presente parecer.
By |2023-10-23T14:22:34+00:0011/07/2012|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Garantias; caução; receção parcial; devolução parcial da caução

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