Impedimentos, quorum.

A Câmara Municipal do ..., através de um ofício de ..., solicitou-nos um pedido de parecer sobre  a questão mencionada em epígrafe, mais concretamente, se um vereador poderia participar numa votação em que a Câmara Municipal o iria designar para o Conselho de Administração duma empresa municipal.

Sobre a questão temos a informar:


A questão de direito subjacente ao problema jurídico que nos foi presente respeita a impedimentos.


Os impedimentos são um corolário do princípio constitucional da imparcialidade - artigo 266º nº 2 da CRP « Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé».
 A garantia da imparcialidade implica o estabelecimento de impedimentos aos titulares de órgãos e agentes da administração pública.
 Assim, os impedimentos são um dos corolários do princípio da imparcialidade e implicam a proibição dos órgãos e agentes da administração tomarem decisões sobre assuntos em que estejam pessoalmente interessados, de forma directa ou indirecta, bem como de celebrarem ou tomarem parte em contratos celebrados com a administração. Com os impedimentos o titular do órgão fica impedido de actuar não por razões abstractas que se prendam ao próprio cargo mas por razões concretas que respeitam à própria pessoa que ocupa um determinado cargo e aos interesses que ele possa ter naquela decisão.
 Os casos de impedimento estão consagrados no artigo 44º do CPA e são os seguintes:
« Nenhum titular de órgão ou agente da Administração Publica pode intervir em procedimento administrativo ou em acto ou em contrato de direito público ou privado da Administração Pública nos seguintes casos:
- a) Quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;
- b) Quando , por si ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse o seu cônjugue, algum parente ou afim em linha recta ou até ao 2º graus da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;
- c) Quando, por si ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse em questão semelhante à que deva ser decidida, ou quando tal situação se verifique em relação a pessoa abrangida pela alínea anterior;
 - d) Quando tenha intervindo no procedimento como perito ou mandatário ou haja dado parecer sobre a questão a resolver;
- e) Quando tenha intervindo no procedimento como perito ou mandatário o seu cônjuge, parente ou afim em linha recta ou até ao segundo grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;
- f) Quando contra ele, seu cônjuge ou parente em linha recta esteja intentada acção judicial proposta por interessado ou pelo respectivo cônjuge;
 - g) Quando se trate de recurso de decisão proferida por si, ou com a sua intervenção, ou proferida por qualquer das pessoas referidas na alínea b) ou com intervenção destas; »


2- Um dos problemas que se formulam a respeita dos impedimentos é sobre a taxatividade ou não deste elenco legal de impedimentos considerando a doutrina1 que as hipóteses elencadas constituem as únicas causas de impedimentos.
Outra das questões respeita ao conceito de intervenção constante do corpo da norma , ou seja, se a proibição de intervir em procedimento administrativo ou em acto ou contrato abrange apenas a fase final , a decisão, ou se abrange todo o iter procedimental. Entende também a doutrina que o conceito de intervenção não se deve cingir apenas à fase da decisão mas deve também abranger todos os procedimentos de instrução da mesma bem os actos de execução da decisão « o que é perfeitamente compreensível, dado ser na fase de instrução que o órgão recolhe os dados essenciais da decisão e ser o momento em que mais sentido faz a exigência de uma ponderação objectiva, isenta e imparcial dos factos e interesses envolvidos».2 A norma exceptua os actos de mero expediente dado que estes não podem ser influenciados pela pessoa que os pratica.
3- Quando se verifique causa de impedimento relativamente a qualquer eleito local deve o mesmo comunicar o facto ao presidente do respectivo órgão podendo, também, qualquer interessado requerer a declaração do impedimento, até ser proferida a decisão definitiva ou praticado o acto. Por último, refira-se que compete ao presidente do órgão conhecer da existência do impedimento e declará-lo, excepto se se tratar de impedimento do próprio presidente em que a decisão sobre o incidente compete ao próprio órgão colegial, sem intervenção do presidente. Assim, o Presidente da Câmara só deve aceitar e declarar os casos de impedimento que se circunscrevam às várias hipóteses do artigo 44º do CPA. Tal significa que os vereadores da Câmara Municipal não se podem auto declarar impedidos dado que tal representa uma clara violação das regras constantes do CPA sobre impedimentos.

Ora, no caso em análise, o vereador em causa estava efectivamente impedido de participar na votação, dado que nele tinha interesse directo, alínea a) do artigo 44 º do CPA, competindo ao Presidente da Câmara declarar o impedimento, de acordo com as normas que citámos.
Os actos ou contratos em que tiverem intervindo titulares de órgão os agente impedido são anuláveis nos termos gerais de direito.
.
Note-se que, nos termos da alínea i), do n º 1 do artigo 64 º da lei n º 169/99, de 18/09, na redacção dada pela lei n º 5-A/2002, de 11/01, compete á Câmara Municipal nomear e exonerar o conselho de administração das empresa públicas municipais, como era o caso da empresa em questão. Acrescente-se que de acordo com o n º 8 do mesmo artigo podem ser nomeados membros da Câmara para este órgão, desde que exerçam funções não remuneradas ( n º 1 do artigo 47 º da lei n º 53-F/2006, de 29/12 ( lei do sector empresarial local).

II- No que respeita ao problema do quorum temos a referir o seguinte: As normas genéricas sobre a organização administrativa constantes do CPA prevalecem sobre quaisquer disposições especiais, excepto se houver ressalva expressa em contrário ou houver diminuição dos direitos dos particulares ( nºs 6 e 7 do artigo 2º do CPA). Assim a regra do nº 1 do artigo 22º deste Código que estabelece que os órgãos colegiais só podem, em regra, deliberar quando esteja presente a maioria do número legal dos seus membros com direito a voto prevalece sobre o nº 1 do artigo 89º da lei nº 169/99, de 18/09, que não refere que o quorum se afere pelos membros com direito a voto. Significa, assim, que «o apuramento do quorum faz-se não em relação a todos os membros do órgão colegial, mas em relação aos membros com direito a voto (excluindo portanto os impedidos)»3. O quorum deverá, assim, ser apenas aferido pelos membros com direito a voto pelo que os membros impedidos são excluídos dessa contagem.
Consideramos, no entanto, que sendo a Câmara um órgão colegial deverá haver, para que exista quorum, um número mínimo de membros que permita a colegialidade,


 
1. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2 ª edição, pag. 245 e sgt.
 
2. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2 ª edição, pag. 246.
 
3. Diogo Freitas do Amaral, João Caupers, João Martins Claro, João raposo, Pedro Siza Vieira, Vasco Pereira da Silva , Código Do Procedimento Administrativo Anotado, pag. 70.

 

Maria José L. Castanheira Neves

(Directora de serviços de Apoio Jurídico e á Administração Local)

By |2023-10-23T14:49:24+00:0022/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Impedimentos, quorum.

Dirigentes, posição remuneratória, carreira de origem.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., e no ofício n.º ..., de ..., ... da Câmara Municipal de ..., este último remetido em anexo ao ofício n.º ..., de ..., da Direcção-Geral das Autarquias Locais, sobre o assunto referenciado em epígrafe, cumpre tecer as seguintes considerações:

Pelas ilações que permite retirar, e não obstante a relativa inutilidade em casos como o submetido à nossa apreciação, inutilidade decorrente do facto de o trabalhador já estar posicionado no último escalão de assessor principal desde 1 de Setembro de 2003, escalão que, como todos os outros foram substituídos por posições e níveis remuneratórios a partir de 31 de Dezembro de 2008, como é sabido, será oportuno salientar que, em Reunião de Coordenação Jurídica realizada entre a Secretaria de Estado da Administração Local, a Direcção Geral das Autarquias Locais, a Inspecção-Geral da Administração do Território, o Centro de Estudos de Formação Autárquica, as Direcções Regionais da Administração Local das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, a DRAPL – Madeira e a DROAP – Açores, realizada em 27 de Setembro de 2006, foi aprovada a solução interpretativa uniforme que, tendo sido superiormente homologada, e incidindo sobre os efeitos da suspensão da contagem do tempo de serviço prevista na Lei n.º 43/2005, de 29 de Agosto, na carreira de origem dos titulares de cargos dirigentes, seguidamente se transcreve:
“Não determinando o n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 43/2005, de 29 de Agosto, a não contagem do tempo de serviço para efeitos de promoção, mas tão-só para efeitos de progressão, o tempo de serviço prestado em funções dirigentes entre 30 de Agosto de 2005 e 31 de Dezembro de 2006” (ou numa leitura actualizada, até 31 de Dezembro de 2007, por força da Lei n.º 53-C/2006, de 29 de Dezembro) “conta para efeitos de preenchimento dos módulos de tempo necessários à promoção na carreira prevista no artigo 29.º do Estatuto do Pessoal Dirigente (Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro), aplicável à administração local por força do n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 93/2004, de 20 de Abril” (sublinhámos e intercalámos).

Do entendimento transcrito parece-nos resultar a inevitável conclusão de que o tempo de serviço ali identificado não podia ser considerado para efeitos de progressão nos escalões tanto das carreiras em geral quanto das carreiras de origem dos titulares de cargos dirigentes, por tal decorrer directamente da lei.

Mas, a colocar-se a questão de saber por que princípios se deverá reger o reconhecimento do direito à carreira neste caso, dir-se-á que, conforme decorre do n.º 3 do respectivo art.º 25.º, com a publicação e entrada em vigor da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, que aprovou o Orçamento de Estado para 2010, o reconhecimento do direito à carreira de origem dos actuais dirigentes é o que decorre do regime constante do “artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, alterada pelas Leis n.ºs 51/2005, de 30 de Agosto, e 64-A/2008, de 31 de Dezembro,” aplicada à administração local pelo Decreto-lei n.º 93/2004, de 20 de Abril, na redacção do Decreto-lei n.º 104/2006, de 7 de Junho, regime que se mantém “aplicável aos titulares dos cargos dirigentes actualmente designados, ainda que em substituição ou em gestão corrente, até ao fim do respectivo prazo, nele não incluindo eventuais renovações posteriores” (sublinhámos), preceito este que foi expressamente revogado pelo n.º 2 da primeira norma citada.

E, compulsando o referido art.º 29.º, na redacção a que ali se alude, constata-se prescrever aquele o seguinte:
“1 - O exercício continuado de cargos dirigentes por períodos de três anos, em comissão de serviço, em substituição ou em gestão corrente, confere ao respectivo titular o direito à alteração para a ou as posições remuneratórias imediatamente seguintes da respectiva categoria de origem, correspondendo uma alteração a cada período.
2 - … .
3 - Quando, no decurso do exercício do cargo dirigente, ocorra uma alteração do posicionamento remuneratório na categoria de origem em função da reunião dos requisitos previstos para o efeito na lei geral, ou alteração de categoria ou de carreira, para efeitos de cômputo dos períodos referidos no n.º 1, releva apenas, sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tempo de exercício subsequente a tais alterações.
4 - Quando a alteração de categoria ou de carreira pressuponha a reunião de requisito relativo a tempo de serviço, no cômputo dos períodos referidos no n.º 1, só não releva o tempo de exercício de cargos dirigentes que tenha sido tomado em consideração no procedimento que gerou aquela alteração.
5 - O direito à alteração de posicionamento remuneratório é reconhecido, a requerimento do interessado, por despacho do dirigente máximo do órgão ou do serviço de origem,” (cfr. art.º 15.º do Decreto-lei n.º 93/2004) “precedido de confirmação dos respectivos pressupostos pela secretaria-geral ou pelo departamento ministerial competente em matéria de recursos humanos.
6 - A remuneração pelo novo posicionamento remuneratório tem lugar desde a data da cessação do exercício do cargo dirigente” (salientámos e intercalámos).

Mas, como aliás se encontra indiciado no n.º 3 do preceito transcrito, o direito aqui consagrado não pode deixar de ser autonomizado e articulado com o direito que, mercê da intervenção dos mecanismos legais da avaliação de desempenho na carreira de origem (que não como dirigente, nos termos do SIADAP 2), possa desencadear em sede de mudança de posicionamento remuneratório por aplicação dos artigos 46.º a 48.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro – abreviadamente, LVCR –, adaptada à Administração Local pelo Decreto-lei n.º 209/2009, de 3 de Setembro, ambos na actual redacção.

E, na perspectiva da indispensável intervenção dos mecanismos legais da avaliação de desempenho na carreira de origem, no contexto em apreço, pertinente se nos afigura chamar à colação o disposto no art.º 30.º do Decreto Regulamentar n.º 18/2009, de 4 de Setembro [diploma que aplicou o sistema integrado de avaliação do desempenho da administração pública (SIADAP), criado pela Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro, à administração local], quando prescreve:
“1 - … .
2 - Aos trabalhadores cujo desempenho em 2008 e 2009 não tenha sido avaliado por não aplicação efectiva da legislação em matéria de avaliação do desempenho é atribuído um ponto por cada ano.
3 - Aos trabalhadores referidos no número anterior é aplicável o disposto nos n.ºs 9 a 11 do artigo 113.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.”

Ora, prescrevem os preceitos para onde aqui se faz remissão o seguinte:
“9 - Em substituição dos pontos atribuídos nos termos da alínea d) do n.º 2 e dos n.os 5 a 7, a requerimento do trabalhador, apresentado no prazo de cinco dias úteis após a comunicação referida no número anterior, é realizada avaliação através de ponderação curricular, nos termos previstos no sistema de avaliação de desempenho dos trabalhadores da Administração Pública, aplicado com as necessárias adaptações, por avaliador designado pelo dirigente máximo do órgão ou serviço.
10 - As menções propostas nos termos do número anterior são homologadas pelo dirigente máximo do órgão ou serviço e por ele apresentadas ao respectivo membro do Governo para ratificação, visando a verificação do equilíbrio da distribuição das menções pelos vários níveis de avaliação, em obediência ao princípio da diferenciação de desempenhos, bem como o apuramento de eventuais responsabilidades dos titulares dos cargos dirigentes para os efeitos então previstos no n.º 2 do artigo 4.º da Lei n.º 15/2006, de 26 de Abril.
11 - Após a ratificação referida no número anterior, é atribuído, nos termos do n.º 6 do artigo 47.º, o número de pontos correspondente à menção obtida referido ao ano ou anos relativamente aos quais se operou a ponderação curricular (destacámos).

E se a simples leitura dos preceitos transcritos nos permite, sem mais, proceder ao enquadramento da avaliação na carreira de origem relativamente aos anos de 2008 e 2009, pertinente será, quanto à avaliação dos anos de 2004 a 2007, transcrever o entendimento conjunto divulgado pelas Direcção-Geral das Autarquias Locais e Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público acerca da relevância, no âmbito do SIADAP, do trabalho prestado desde 2004:

“Tendo em vista a melhor compreensão do regime legal relativo à relevância das avaliações de desempenho na alteração do posicionamento remuneratório dos trabalhadores da administração local previstas na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro (LVCR), sem prejuízo e, em complemento das orientações jurídicas anteriores, vêem a DGAEP e a DGAL informar o seguinte:
1. A relevância do trabalho prestado, desde o ano de 2004, pelos trabalhadores da administração local que não foram objecto de avaliação encontra-se salvaguardada, para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório, pelo n.º 7 do artigo 113.º, da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
A estes trabalhadores que não foram objecto de avaliação do desempenho desde 2004, deverá o órgão competente da autarquia atribuir um ponto por cada ano não avaliado.
2. Aos trabalhadores a quem tenha sido atribuída avaliação nos anos 2004 e 2005, de acordo com o regime previsto no Decreto-Regulamentar n.º 45/88, de 16 de Dezembro, nos termos da Lei n.º 15/2006, de 26 de Abril, o órgão competente da autarquia deverá atribuir dois pontos aos trabalhadores com as menções ou níveis de avaliação máximos mais elevados (Muito Bom), até ao limite de 25 % do total dos trabalhadores, conforme alínea b) do n.º 4 do artigo 113.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
Aos restantes 75% dos trabalhadores dever-lhes-á ser atribuído um, zero ou um ponto negativo de acordo com as regras gerais previstas no art.º 113.º.”

O direito à alteração do posicionamento remuneratório é reconhecido mediante requerimento do interessado, devendo a alteração de posicionamento remuneratório reportar-se à data da cessação de funções dirigentes, se resultar do reconhecimento do direito à carreira, ou a 1 de Janeiro do ano em que se encontrem reunidos os requisitos, na sequência da avaliação de desempenho/ponderação curricular na carreira de origem.

Em face do exposto, parece-nos poder concluir-se, salvo melhor opinião, que será da adopção dos procedimentos e princípios acima referenciados que haverá de discorrer-se, afinal, se o trabalhador em causa reunirá ou não os requisitos para, à luz do disposto nos art.ºs 46.º a 48.º da LVCR, beneficiar de alterações de posicionamento remuneratório, para o que a avaliação de desempenho/ponderação curricular dos anos em causa poderão ser determinantes.

O que se nos afigura absolutamente inviável é a pretensão de aplicar os princípios reguladores, ao tempo, da progressão nos escalões num universo jurídico em que pontificava o n.º 1 do art.º 119.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para o ano de 2008, quando prescrevia que “a partir de 1 de Janeiro de 2008, a progressão nas categorias opera-se segundo as regras para alteração do posicionamento remuneratório previstas em lei que, na sequência da Resolução do Conselho de Ministros n.º 109/2005, de 30 de Junho, defina e regule os novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, produzindo efeitos a partir daquela data” (salientámos).

Assim, e por tudo quanto se aduziu, o trabalhador em causa terá direito a progredir para a 13.ª posição remuneratória a partir de 1 de Janeiro de 2009 – na perspectiva de a ponderação curricular lhe permitir somar 10 pontos entre 2004 e 2008, inclusive – ou a partir de 1 de Janeiro do ano em que os perfaça.


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)

By |2023-10-23T14:50:57+00:0018/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Dirigentes, posição remuneratória, carreira de origem.

Fornecimento de refeições escolares, contratos públicos, código da contratação pública

A Câmara Municipal de ..., em seu ofício refª ..., de ..., solicita parecer jurídico que esclareça a questão que se segue.

A Câmara Municipal tem a incumbência de assegurar a gestão dos refeitórios dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico e comparticipar no apoio aos alunos no domínio da acção social escolar; ao abrigo do disposto das alíneas b) e d) do nº3 do artigo 19º da Lei nº 159/99, de 14.9, conjugado com o disposto no D.L. 399-A/84, de 28.12, e ainda da alínea l) do nº1 do artigo 64º do D.L. 169/99, de 18.9.

Atentas essas competências, pergunta o órgão, em suma, se o fornecimento de refeições escolares a alunos dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico, podem ser assegurado através de protocolos de colaboração com o agrupamento de escolas de Arganil e instituições de solidariedade social.


Sobre o assunto, cumpre-nos informar:

O D.L. 169/99, de 18.9, no seu artigo 64º, estabelece as competências da câmara municipal no âmbito do “apoio a actividades de interesse municipal”, sendo que uma delas, de acordo com o nº4), alínea d), é “deliberar em matéria de acção social escolar, designadamente no que respeita a alimentação, alojamento e atribuição de auxílios económicos a estudantes”.

O artigo 67º, por sua vez, estabelece quais as competências, de entre as previstas no artigo 64º, que podem ser objecto de “protocolos de colaboração com entidades terceiras”.

Verifica-se, assim, da leitura do artigo 67º, que podem ser celebrados protocolos com terceiros relativamente às competências mencionadas nas alínea l) do nº1, j) e l) do nº2 e b) e b) e c) do nº4 do artigo 64º. Não está, pois, previsto que possam ser celebrados protocolos relativos à competência prevista na alínea d) do nº4, a alimentação, alojamento e atribuição de auxílios económicos a estudantes, aquela que é alvo da presente consulta.

Mais aproveitamos para informar, finalmente, que, atento o valor em causa – “cerca de € 200.000.000”, apresentado como o “somatório dos referidos protocolos” – deve ser aberto procedimento de Concurso Público para o fornecimento das refeições, nos termos da alínea a) do nº1 do artigo 20º do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo D.L. 18/2008, de 29.1, alterado pelo D.L. 278/2009, de 2.10.

 

Divisão de Apoio Jurídico

(António Ramos)

By |2023-10-23T14:50:04+00:0018/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Fornecimento de refeições escolares, contratos públicos, código da contratação pública

Alteração a loteamento, oposição escrita, formas de notificação,

Em referência ao vosso ofício n º ..., de ..., e ao assunto mencionado em epígrafe, temos a informar:

O regime jurídico da alteração às licenças de loteamento encontra-se regulado no artigo 27 º do RJUE, mais especificamente nos n ºs 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8 do referido artigo.

Questiona-nos a Câmara Municipal sobre a correcta interpretação legal de uma dessas disposições deste regime de alterações, mais concretamente, sobre o n º 3 do artigo que prescreve o seguinte:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 48 º, a alteração da licença de operação de loteamento não pode ser aprovada se ocorrer oposição escrita da maioria dos proprietários dos lotes constantes do alvará, devendo, para o efeito, o gestor do procedimento proceder à sua notificação para pronúncia no prazo de 10 dias».

É nosso entendimento que o legislador, através destes mecanismos, consagrou uma forma de protecção dos terceiros adquirentes dos lotes de um loteamento relativamente às alterações às mesmas propostas por outros interessados.
Como já afirmámos  «a oposição não significa a existência de qualquer causa de indeferimento das referidas no artigo 24 º. Se estas existirem no momento em que se aprecia o pedido de alteração, o órgão municipal tem que indeferir o pedido; …se não existirem, os proprietários dos lotes põem opor-se à norma, visto que a sua aquisição de lotes se fundamentou em determinados condicionalismos que


não pretendem que sejam alterados, mesmo que estejam em conformidade com a lei».
O direito de oposição deriva, assim, da protecção dos proprietários dos lotes, que não do interessado que requereu a alteração ao loteamento, possibilitando que a maioria dos mesmos se oponha à alteração de um loteamento, mesmo que essa alteração esteja em conformidade com os PMOT e com todas as demais regras urbanísticas aplicáveis à área em causa, dado considerar-se que merece protecção e garantia o facto de os mesmos terem adquirido os lotes no pressuposto de determinadas prescrições vigentes aquando dessa mesma aquisição.
Não havendo oposição escrita, deverá a alteração ser deferida se cumprir todos os trâmites legais aplicáveis. Está, assim, correcta a interpretação legal constante do ofício da Câmara: a oposição escrita não é um requisito da instrução da  alteração à licença de  loteamento, muito pelo contrário, ela consubstancia-se, se existir, numa causa de indeferimento da alteração pedida.


No que respeita á notificação consideramos que a mesma deve ser efectuada de acordo com o artigo 70 º Código do Procedimento Administrativo (CPA), admitindo-se, no entanto, para situações complexas com um elevado número de interessados que se possa realizar essa notificação por edital, nos termos dos procedimentos de massas.
A alínea d) do artigo 70 º do CPA possibilita a notificação por edital em dois tipos de situações: (1) se os interessados forem desconhecidos ou (2) em tal número que torne inconveniente outra forma de notificação.
Ora, é evidente que não se pode considerar que exista um elevado número de proprietários de lotes quando forem mais de 10 ( podem ser 11…),  não se

 

podendo enquadrar esta situação como  um procedimento de massas, pelo que consideramos que o modo de notificação estabelecido pelo vosso regulamento não está conforme com o CPA.


 
1. Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes, Fernanda Maçãs, Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, Comentado – 2ª edição, Almedina,, pag. 282 e sgt.

 

Maria José L. Castanheira Neves


(Directora de Serviços de Apoio Jurídico e á Administração Local)

By |2023-10-23T14:51:49+00:0016/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Alteração a loteamento, oposição escrita, formas de notificação,

Regulamentos; Públicação, Diário da República

A Câmara Municipal de ..., em seu ofício nº ..., de ..., solicita parecer jurídico que esclareça se é obrigatória a publicação em Diário da República do seu Regulamento de Resíduos Sólidos Urbanos, e se deve o mesmo ser ainda publicitado em jornal de expansão regional e nos lugares de estilo do concelho.


Sobre o assunto, informamos:

Os únicos regulamentos municipais para os quais está expressamente prevista, como obrigatória, a publicação em Diário da República – 2ª série -, são os “regulamentos municipais de urbanização e ou de edificação, bem como regulamentos relativos ao lançamento e liquidação das taxas e prestação de caução que, nos termos da lei, sejam devidas pela realização de operações urbanísticas”, de acordo com o artigo 3º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE).

O Código de Procedimento Administrativo (CPA), por sua vez, nada dispõe em termos gerais sobre a matéria, limitando-se, no seu capítulo referente aos regulamentos, no artigo 118º, a dispor que o projecto de regulamento deverá ser publicado na 2ª série do Diário da República, para apreciação pública e recolha de sugestões, nos termos e definir em legislação própria, a qual, no entanto, não entrou ainda em vigor.

Para os demais regulamentos municipais, para além daquele referido no artigo 3º do RJUE – incluindo aquele que é objecto da presente consulta - deve observar-se o que dispõe a Lei nº 169/99, de 18.9 – Lei das Autarquias Locais, na sua actual redacção - concretamente o seu artigo 91º, referente à “Publicitação das deliberações”.

De acordo com esta norma, as deliberações dos órgãos autárquicos, aqui abrangendo aprovação de regulamentos, deve ser publicitado em Edital, afixado nos lugares de estilo, e ainda em boletim do município e em jornais regionais editados na área do município.

Finalmente, sendo matéria regulamentar específica de taxas, deverá ainda, cumulativamente, seguir-se o que estabelece a Lei nº 53-E/2006, de 29.12 - que regula as relações jurídico-tributárias geradoras da obrigação de pagamento de taxas ás autarquias locais - especificamente, no que respeita à publicidade, o disposto no artigo 13º, que determina que as autarquias locais disponibilizem os respectivos regulamentos “quer em formato de papel em local visível nos edifícios das sedes e assembleias respectivas, quer na sua página electrónica”.

A página electrónica das autarquias é, presentemente, aliás, o meio mais eficaz de publicitar qualquer acto ou deliberação dos órgãos do município, não só pela sua facilidade de consulta, como pelo acesso cada vez mais generalizado a esse meio de comunicação pelo público, sendo assim aconselhável o seu uso para esse fim, ainda quando o mesmo não seja obrigatório por lei.


NOTA: A publicação de regulamentos municipais no Diário da República depende de prévia exigência  de leis especiais nesse sentido  , como é referido neste parecer.
O município pode optar por incluir no regulamento as taxas que lhe respeitam ou por possuir uma tabela autónoma para as taxas em geral. Se forem incluídas neste regulamento o mesmo tem de ser aprovado pela assembleia municipal, dado a aprovação de taxas ser da competência deste órgão municipal.

 

Divisão de Apoio Jurídico

(António Ramos)

 

By |2023-10-23T14:52:42+00:0012/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Regulamentos; Públicação, Diário da República

SIADAP, Membros de Gabinete de Apoio Pessoal.

Tendo em atenção o exposto no ofício n.º ..., de ..., da Câmara Municipal de ..., relativo ao assunto referenciado em epígrafe, cumpre-nos informar do seguinte:

Prescreve o art.º 30.º do Decreto Regulamentar n.º 18/2009, de 4 de Setembro, diploma que adaptou o SIADAP – sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública – aprovado pela Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro, à administração local, o seguinte:
“1 - A avaliação do desempenho referente ao ano de 2009 efectua-se de acordo com o sistema de avaliação do desempenho aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 6/2006, de 20 de Junho.
2 - Aos trabalhadores cujo desempenho em 2008 e 2009 não tenha sido avaliado por não aplicação efectiva da legislação em matéria de avaliação do desempenho é atribuído um ponto por cada ano.
3 - Aos trabalhadores referidos no número anterior é aplicável o disposto nos n.ºs 9 a 11 do artigo 113.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.”

Assim, e sem prejuízo da necessária eventual actualização de leitura imposta pelo preceito transcrito, permitimo-nos transcrever, a propósito da avaliação de desempenho dos anos de 2004 e seguintes, o entendimento conjunto perfilhado pela Direcção-Geral das Autarquias Locais e pela Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público acerca da relevância, no âmbito do SIADAP, do trabalho prestado desde 2004:

“Tendo em vista a melhor compreensão do regime legal relativo à relevância das avaliações de desempenho na alteração do posicionamento remuneratório dos trabalhadores da administração local previstas na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro (LVCR), sem prejuízo e, em complemento das orientações jurídicas anteriores, vêem a DGAEP e a DGAL informar o seguinte:
1. A relevância do trabalho prestado, desde o ano de 2004, pelos trabalhadores da administração local que não foram objecto de avaliação encontra-se salvaguardada, para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório, pelo n.º 7 do artigo 113.º, da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
A estes trabalhadores que não foram objecto de avaliação do desempenho desde 2004, deverá o órgão competente da autarquia atribuir um ponto por cada ano não avaliado.
2. Aos trabalhadores a quem tenha sido atribuída avaliação nos anos 2004 e 2005, de acordo com o regime previsto no Decreto-Regulamentar n.º 45/88, de 16 de Dezembro, nos termos da Lei n.º 15/2006, de 26 de Abril, o órgão competente da autarquia deverá atribuir dois pontos aos trabalhadores com as menções ou níveis de avaliação máximos mais elevados (Muito Bom), até ao limite de 25 % do total dos trabalhadores, conforme alínea b) do n.º 4 do artigo 113.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
Aos restantes 75% dos trabalhadores dever-lhes-á ser atribuído um, zero ou um ponto negativo de acordo com as regras gerais previstas no art.º 113.º.”

No tocante à avaliação de desempenho dos membros que integram os gabinetes de apoio pessoal dos eleitos locais, e reiterando uma leitura actualista, sempre se dirá que a matéria em apreço foi já objecto de discussão e análise em Reunião de Coordenação Jurídica entre a Secretaria de Estado da Administração Local; a Direcção Geral das Autarquias Locais; a Inspecção-Geral da Administração do Território; o Centro de Estudos de Formação Autárquica; as Direcções Regionais da Administração Local das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional; a DRAPL – Madeira e a DROAP – Açores, realizada na DGAL em 14 de Julho de 2006, tendo-se concluído, por maioria, “que os funcionários providos em regime de comissão de serviço nos gabinetes de apoio pessoal dos eleitos locais não estão sujeitos ao SIADAP durante o exercício dessas funções, uma vez que o exercício de funções nesses gabinetes é feito na qualidade de agentes políticos e não de funcionários – vide n.º 6 do art.º 74.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro (estabelece o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias), o qual remete para o Decreto-lei n.º 262/88, de 23 de Julho (estabelece a composição, a orgânica e o regime dos gabinetes dos membros do Governo).

Mais entenderam que haverá lugar, oportunamente, a suprimento da avaliação mediante adequada ponderação do currículo profissional relativamente ao período que não foi objecto de avaliação para efeitos de apresentação a concurso de promoção ou progressão nos escalões, nos termos do artigo 18.º e 19.º do Decreto Regulamentar n.º 19-A/2004”, ou, actualmente, nos termos do artigo 43.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro, atentos os critérios constantes do Despacho Normativo n.º 4-A/2010, de 8 de Fevereiro, e, numa leitura adaptativa, para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório.

De salientar, por último, que o despacho referido no pedido de parecer é aplicável, apenas, “aos órgãos e serviços da administração central, directa e indirecta, do Estado.”


O técnico superior

(José Manuel Martins Lima)

By |2023-10-23T14:53:24+00:0011/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em SIADAP, Membros de Gabinete de Apoio Pessoal.

Senhas de presença, eleitos da freguesia, membros da assembleia municipal

Em referência ao vosso..., recebido em ..., sobre o assunto mencionado em epígrafe, temos a informar:

Nos termos do nº 1 do art.º 10º do Estatuto dos Eleitos Locais “Os eleitos locais que não se encontrem em regime de permanência ou de meio tempo têm direito a uma senha de presença por cada reunião ordinária ou extraordinária do respectivo órgão e das comissões a que compareçam e participem”.

Por sua vez, estipula o nº 2 do art.º 24º do mesmo Estatuto que “Os encargos derivados da participação dos presidentes das juntas de freguesia nas reuniões das assembleias municipais são suportados pelo orçamento dos municípios respectivos”.

Da conjugação normativa dos referidos preceitos resulta, por um lado, que os presidentes das juntas de freguesia têm direito a senhas de presença enquanto membros da assembleia municipal e, por outro, que tais encargos são suportados pelo orçamento dos respectivos municípios.

Esta solução legislativa fundamenta-se no facto de os presidentes da junta participarem nas sessões da assembleia municipal por direito próprio, isto é, na qualidade de elementos integrantes da assembleia municipal, por força do disposto na al. c) do nº 1 do art.º 38º da Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 5-A/2002, de 11 de Janeiro, e não na qualidade de presidentes do órgão executivo da junta.

Repare-se que as senhas de presença constituem um meio de compensar e estimular o empenhamento dos titulares de cargos autárquicos nas reuniões do órgão em que participam.

Face ao exposto, somos de concluir que o Presidente da Junta de Freguesia em causa, enquanto membro integrante da Assembleia Municipal, tem direito a receber senhas de presença pela sua participação nas sessões dessa Assembleia.


Maria José L. Castanheira Neves


(Directora de Serviços de Apoio Jurídico e á Administração Local)

By |2023-10-23T14:54:47+00:0010/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Senhas de presença, eleitos da freguesia, membros da assembleia municipal

RJUE, audiência prévia, competências, notificações

A Câmara Municipal de ..., em seu ofício ..., de ..., solicita parecer jurídico que esclareça, e citamos, “a que serviço compete a elaboração das notificações em sede de audiência prévia e subsequentes mandados de demolição/reposição”, nos termos do artigo 106º RJUE, “bem como as demais notificações para exercício do direito de audiência dos interessados”.

Motiva a presente consulta o facto de haver entendimentos diversos sobre o assunto de dois serviços do município e de, ao que nos apercebemos, o Regulamento Orgânico da Câmara Municipal de Aveiro não ser claro nessa matéria.


Sobre o assunto, informamos:

O direito de audiência prévia dos interessados decorre já, como princípio geral da actividade da Administração Pública, do artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), diploma que nesse artigo e nos seguintes regula ainda o correspondente procedimento administrativo.

A “elaboração das notificações”, alvo directo da presente consulta, é matéria de procedimento instrutório, sendo que as notificações são os veículos de comunicação dos actos administrativos – no caso, decisões de demolição e reposição - aos interessados.

Sobre o assunto, estabelece ainda o CPA, no seu artigo 86º, nº1, que “a direcção da instrução cabe ao órgão competente para a decisão, salvo o disposto nos diplomas orgânicos dos serviços ou em preceitos especiais”, dispondo ainda que essa competência, ou para diligências instrutórias específicas, podem ser delegadas pelo órgão decisor em subordinados seus (nº2 e 3), e que nos órgão colegiais a competência para a direcção da instrução pode ser delegada a membros do órgão ou a agente dele dependente (nº4).


Estabelece assim, em suma, o CPA, como princípio geral, que a direcção da instrução cabe ao órgão competente para a decisão, salvo o disposto em norma especial.

Ora, a matéria de que tratamos, está já exaustivamente tratada em diplomas que regulam especialmente a matéria em causa, sendo aí que devemos buscar resposta à dúvida colocada.

Em primeira linha, e porque tratamos de competências de órgãos autárquicos, devemos procurar essas disposições especiais na Lei das Autarquias Locais (LAL) – aprovada pela Lei 169/99, de 18.09, com as últimas alterações introduzidas pela Lei 5-A/2002, de 11.01.

Assim, de acordo com o seu artigo 68º, compete ao presidente da câmara “embargar e ordenar a demolição de quaisquer obras, construções ou edificações efectuadas por particulares ou pessoas colectivas, sem licença ou com inobservância das condições dela constantes, dos regulamentos, das posturas municipais ou de medidas preventivas, de normas provisórias, de áreas de construção prioritária, de áreas de desenvolvimento urbano prioritário e de planos municipais de ordenamento do território plenamente eficazes”. (nº2, alínea m).

Estabelece depois o artigo 69º, no seu nº2, que “o presidente da câmara pode delegar ou subdelegar nos vereadores o exercício da sua competência própria ou delegada”.

Ainda quanto a delegação de competências, dispõe o artigo 70º que “o presidente da câmara ou os vereadores podem delegar ou subdelegar a sua competência no dirigente máximo da respectiva unidade orgânica”, em determinadas matérias do nº2 do artigo 6º, entre as quais não está, no entanto, as medidas de tutela da legalidade urbanística prevista na sua alínea m) (demolição de obras sem licença, ou em violação de licença ou norma regulamentar).

Conjugando as disposições acima referidas, temos assim, em conclusão, que tanto a decisão de “demolição da obra e reposição do terreno” do artigo 106º do RJUE, como a correspondente “audiência prévia”, do seu nº3, são da competência do presidente da câmara, só podendo ser delegadas nos vereadores e não nos dirigentes dos seus serviços orgânicos.

 

Divisão de Apoio Jurídico

(António Ramos)

By |2023-10-23T14:56:21+00:0009/11/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em RJUE, audiência prévia, competências, notificações

Delegação de competências, Presidente da Câmara Municipal e Vereadores

Em referência ao vosso ofício n º ..., de ..., e à questão mencionada em epígrafe, temos  a informar:


Questionou-nos a Câmara Municipal de Celorico da Beira sobre a necessidade de o Presidente da Câmara delegar as suas competências próprias, de forma a possibilitar que os vereadores possam praticar os actos e demais procedimentos incluídos nessas competências.

De facto, o princípio da legalidade, constante do CPA, determina que só se podem exercer as competências que legalmente tenham sido cometidas aos respectivos órgãos. Tal significa que se entende este princípio «nos quadros da conformidade» e não nos da compatibilidade.1
A corrente doutrinária que defende a tese da conformidade baseia-se no artigo 3º do CPA, dado estar lá referido que « por um lado essa actuação se realiza em  obediência à lei e , sobretudo, está lá dito claramente que ela se confina  nos limites dos poderes que lhe são atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos»,2 ou seja, segundo os autores citados, não só haverá uma conformidade da actuação administrativa em relação ás normas de competência e de fins mas também quanto à forma e conteúdo dos poderes atribuídos.

Assim sendo, de acordo com o princípio da legalidade, as competências (« conjunto de  poderes funcionais que a lei confere aos órgãos das pessoas colectivas públicas para a prossecução das atribuições destas » Vital Moreira, Direito Administrativo, texto policopiado, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,  pag. 135),  são definidas  pela lei ou por regulamento, são irrenunciáveis e inalienáveis, sem prejuízo do disposto quanto à  delegação de poderes  e à substituição ( n º 1 do artigo 29 º do CPA).
Tal significa que um órgão com determinadas competências conferidas pela lei, não pode renunciar às mesmas mas pode delegá-las, se existir previsão legal para tal, ou fazer-se substituir.

Quanto à delegação das competências próprias do presidente da Câmara nos vereadores ela é possível, dado  estar legalmente prevista no n º 2 do  artigo 69 º da lei n º 169/99, de  18/09, com  a redacção dada  pela lei n º 5-A/2002, de 11/01.

Efectivamente, o artigo 35 º do CPA, define delegação como acto administrativo que permite que um órgão normalmente competente para decidir sobre determinada matéria, sempre que para tal esteja habilitado por lei, transfira para outro órgão ou agente a prática de actos sobre a mesma matéria.
Esta é, obviamente, uma medida de desconcentração de poderes que segundo Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim3 se trata « de um acto pelo qual um órgão transfere para outro o poder de exercício normal de uma competência cuja titularidade lhe pertence ( primária ou originariamente ). »

São, assim , três os requisitos da delegação de poderes:
• lei de habilitação, ou seja, uma lei que preveja a possibilidade de um órgão poder delegar poderes noutro;
• a existência de dois órgãos ou de um órgão ou um agente; um órgão normalmente competente e outro eventualmente competente;
• a prática do acto de delegação propriamente dito, acto pelo qual o delegante  concretiza a delegação de poderes no delegado4.

Havendo lei habilitante para a delegação de competências em causa, o Presidente da Câmara se pretender delegar as suas competências nos vereadores terá que praticar o acto de delegação propriamente dito.

Para além da delegação, as competências do Presidente da Câmara poderão ser exercidas por substituição.
De facto, o n º 3 do artigo 57 º da lei n º 169/99, de 18/09, com a redacção dada  pela lei n º 5-A/2002, de 11/01prescreve  que « o presidente designa, de entre os vereadores, o vice-presidente, a quem, para além de  outras funções que lhe sejam distribuídas, cabe substituir o primeiro nas suas faltas e impedimentos».
O Presidente da Câmara designa, de entre os vereadores, o vice-presidente, que será o seu substituto nas suas faltas e impedimentos.
No entanto, não estamos verdadeiramente perante uma hipótese de substituição mas sim de suplência.
De acordo com Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim5, existe substituição « quando há sub-rogação de um órgão na competência doutro». Ora, neste caso, estamos dentro do mesmo órgão, só que nas situações de falta, de ausência ou de impedimento do Presidente o Vice-Presidente deve substituí-lo.
Estamos, assim, perante um caso de suplência e não de substituição.
Com este regime, e segundo os autores citados, pretende-se assegurar o princípio da continuidade do órgão e a regularidade do exercício das suas funções.
Assim, nas faltas e impedimentos do Presidente da Câmara ele deve ser substituído pelo Vice-Presidente, que exercerá, em substituição, as competências do Presidente da Câmara.

Obviamente que ao vice-presidente também poderão ser delegadas competências pelo Presidente da Câmara, dado o seu cargo de vereador. Assim, este eleito poderá actuar em suplência ou por delegação do Presidente.


  
1. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2001.
 
2. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim,  ob. cit. , pag. 89.
 
3. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, ob. cit., pag. 210.
 
4. Freitas do Amaral, ob. Cit., pag. 663.
 
5. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2001, pag. 234 º e sgts.

 

Maria José L. Castanheira Neves

(Directora de Serviços de Apoio Jurídico e á Administração Local)

By |2023-10-23T14:57:11+00:0027/10/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Delegação de competências, Presidente da Câmara Municipal e Vereadores

Contratação in house: Câmara Municipal da … e …

Foi solicitado pela Vogal Executiva da Comissão Directiva do PO Regional do Centro, ..., em ..., através da informação nº ..., de ..., um parecer jurídico sobre o enquadramento do procedimento de aquisição de serviços entre a Câmara Municipal da ... e a empresa ... na contratação in house, nos termos do disposto no nº 2 do art.º 5º do Código de Contratação Pública (CCP).

Foi prestada a seguinte informação:

 Em 07.07.2010 foi celebrado contrato entre a Câmara Municipal da ... e a empresa ..., SA, no montante de 356 840,00 €, sem IVA;
 No âmbito da candidatura a este PO, não foi apresentada a check-list de verificação da contratação pública;
 A Câmara Municipal da ..., através de ofício nº ..., de ..., invocou que “a presente contratação decorreu ao abrigo do nº 2 do art.º 5º do CCP, considerando excluída a aplicação da parte II desse diploma” e que “a referida contratação consubstancia uma contratação in house, uma vez que, sendo a entidade adjudicante a CM, detém a maioria do capital da ... SA, exerce sobre a actividade dessa entidade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços e que essa empresa desenvolve a sua actividade em benefício do Município da ...”;
 A empresa ..., SA, é é constituída por capitais públicos em 91%, dos quais o Município da ... detém 78,6%, e também por capitais privados.


Temos a informar:

 


I

Estipula o nº 2 do art. 5º do CCP, sob a epígrafe “Contratação excluída”, que “A parte segunda do presente Código também não é aplicável à formação dos contratos, independentemente do seu objecto, a celebrar por entidades adjudicantes com uma outra entidade, desde que:

a) A entidade adjudicante exerça sobre a actividade desta, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços e
b) Esta entidade desenvolva o essencial da sua actividade em benefício de uma ou de várias entidades adjudicantes que exerçam sobre ela o controlo análogo referido na alínea anterior.”

Consagra assim este normativo, a contratação in house que é aquela que resulta de contratos celebrados entre “ uma entidade pública e outra que é seu prolongamento e cuja actividade, por isso mesmo, a primeira controla, existindo entre aquela e esta uma relação de dependência jurídica”.1

Daqui decorre que para a configuração de um contrato como in house, que tem como efeito a sua exclusão da aplicação da Parte II do CCP, é necessária a verificação cumulativa dos dois requisitos enunciados na lei: o controlo análogo e a destinação essencial da actividade.

Efectivamente, para que estejamos perante uma contratação desta natureza é imperativo que, por um lado, a entidade adjudicante exerça sobre a actividade da entidade adjudicatária um controlo semelhante ao que exerce sobre os seus próprios serviços, ou seja, que exerça uma influência determinante sobre os seus objectivos e decisões e, por outro, que a entidade adjudicatária execute o essencial da sua actividade em benefício directo da entidade adjudicante.

No que respeita ao controlo análogo, poder-se-á apontar como indicadores da sua existência o referido controlo hierárquico, o financiamento maioritário e a atribuição de funções como se de delegação de competências se tratasse.

A verificação destes factores, tal como refere a doutrina2, acaba “por funcionar como índices semióticos da efectiva concorrência de um controlo análogo, bastante – desde que acompanhado, claro está, da destinação essencial da actividade da entidade adjudicatária ao abastecimento da Administração – para furtar estas relações ao confronto concorrencial e dispensando, por esta forma, as autoridades administrativas da abertura de um procedimento pré-contratual (…)”.

Como refere este autor3 o controlo análogo consiste, assim, na “existência de uma posição de sujeição ou de subordinação da entidade adjudicatária por relação à entidade adjudicante, em termos capazes de esvaziar a primeira da sua autonomia decisória por via da respectiva submissão ao poder de orientação da segunda”.

No que toca ao segundo requisito exigido e que se prende com o destino do essencial da actividade da entidade adjudicatária, a lei impõe que esta exerça em prol da entidade adjudicante a sua actividade quase em exclusividade, ou seja, que as suas funções sejam fundamentalmente realizadas em benefício da entidade adjudicante.

Neste sentido, o Tribunal de Justiça, no Acórdão Carbotermo, defende que se pode “considerar que a empresa em causa realiza o essencial da sua actividade com a autarquia que a controla (…) quando actividade desta empresa é consagrada principalmente a esta autarquia, revestindo qualquer outra actividade apenas carácter marginal” e acrescenta, no Acórdão Asemfo/Tragsa, que esse requisito considerar-se-á preenchido por uma entidade que, em média, realiza mais de 90% da sua actividade em benefício da entidade adjudicante.4

Ainda que se considere que a percentagem apontada não constitui um critério único, sempre se entenderá, rendo em conta a destinação essencial da actividade, que o volume de actividade da entidade adjudicatária deverá ultrapassar os 50%.

Não obstante, desde que a actividade da entidade adjudicatária se destine substancialmente à entidade adjudicante, é admissível que possam ser exercidas outras actividades a título subsidiário ou complementar.

Em suma, cumpridos os dois requisitos analisados, poder-se-ia então concluir que estariam reunidas as condições necessárias para qualificar uma relação jurídica de contratação in house, todavia, além dos requisitos legais mencionados, a jurisprudência do Tribunal de Justiça tem vindo a acrescentar uma terceira restrição que diz respeito à natureza do capital da entidade adjudicatária e que poderá afastar a subsistência do requisito do controlo análogo.

Defende este Tribunal, em alguns dos seus acórdãos, que a existência de participação privada no capital social da entidade adjudicatária é motivo fundamentador para considerar inexistente uma relação in house e, nessa medida, sujeitar os respectivos procedimentos contratuais às regras de formação dos contratos.

Com efeito, decidiu o Tribunal de Justiça no Acórdão Stadt Halle que “a participação, ainda que minoritária de uma empresa privada no capital de uma sociedade no qual participa também a entidade adjudicante em causa exclui de qualquer forma que esta entidade adjudicante possa exercer sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços”.

Considerou, desta forma, o Tribunal que a simples presença de um sócio privado na entidade adjudicatária, ou seja, de capital privado na entidade controlada, subverte o interesse público subjacente à relação jurídica existente entre uma entidade pública e os seus próprios serviços.

Em comentário ao citado acórdão5 refere a doutrina que “O tribunal entendeu, portanto, que não pode subsistir uma relação in house nas hipóteses em que na empresa adjudicatária esteja presente um sócio privado, uma vês que a presença deste, por si mesma, demonstra a existência de uma actividade económica de intuito lucrativo que não pose ser confiada a terceiros prescindindo do respeito dos princípios da liberdade de concorrência”.

Note-se, aliás, que a jurisprudência comunitária vai mais longe na imposição desta restrição ao considerar que basta a mera previsão estatutária de capital privado (Acórdão Parking Brixen) e a transformação de uma sociedade de capitais integralmente públicos numa sociedade de capitais mistos, para prejudicar a qualificação de uma relação jurídica como in house (Acórdão Comissão/Áustria).

Este último acórdão justifica tal entendimento com o facto da “relação entre uma autoridade pública, que seja uma entidade adjudicante, com os seus próprios serviços se reger por considerações e exigências específicas de interesse público, enquanto que o capital privado numa empresa obedece a considerações inerentes a interesses privados e prossegue objectivos de natureza diferente”.

Como sublinha a doutrina6, a propósito do expendido, “teríamos que a lógica egoísta do lucro subjacente ao interesse privado seria absolutamente inconciliável com a lógica altruísta da satisfação de necessidades colectivas subjacentes ao interesse público, contaminando irreversivelmente a relação entre entidade adjudicante e sua entidade adjudicatária e não lhe permitindo, por isso, furtar-se ao confronto concorrencial”.

Em síntese, defende o referido Tribunal que basta a simples presença de 1% ou menos de participação privada no capital social da entidade adjudicatária para que seja posta em crise a existência de um controlo análogo exercido pela entidade adjudicante, devendo, nessa medida, ser aplicados os procedimentos pré-contratuais nas relações jurídicas levadas a cabo.

 

II

Feita a abordagem do regime jurídico da contratação in house, vejamos se no caso que em concreto nos foi colocado se verificam os requisitos constantes no nº 2 do art. 5º do CCP e na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

No caso vertente, como já referimos, está em causa um contrato celebrado entre a Câmara Municipal da ... e a empresa ..., no valor de 356 840,00 € (sem IVA), sendo esta constituída por 91% de capitais públicos, dos quais 78,6% são detidos pelo Município da ..., e por 9% de capitais privados.

Ora, face ao que antecede, dada a existência inequívoca de capital privado na Empresa ..., escusamo-nos de nos pronunciar detalhadamente sobre a verificação efectiva dos requisitos referentes ao controlo análogo e à destinação essencial da actividade.

De facto, a mera existência de participação privada no capital social da entidade adjudicatária, não obstante a sua maioria ser detida por entidades públicas, designadamente a Câmara Municipal da ..., impede, ab initio, que se qualifique a relação jurídica existente entre a Câmara e a ... como uma contratação in house.

Como vimos, o Tribunal de Justiça considera que a simples presença de 1% (ou menos) de participação privada no capital social da entidade adjudicatária é condição bastante para comprometer o interesse público característico das relações estabelecidas entre as entidades públicas e os seus próprios serviços, e, dessa forma, afastar a existência de um controlo análogo sobre a sua actividade e, consequentemente, a invocação de uma relação in house entre a entidade adjudicante e a adjudicatária.

Do exposto, é assim de concluir que a existência de capital privado no capital social da ..., ainda que minoritário face ao público, é fundamento inequívoco para que a sua relação com Câmara Municipal da ... não possa ser, ao abrigo do nº 2 do art.º 5º do CCP, qualificada como in house, ficando, nessa medida, a Câmara Municipal obrigatoriamente sujeita aos procedimentos pré-contratuais previstos no referido Código.

Desta forma, estando em causa um contrato de aquisição de serviços no valor de 356 840,00 €, a Câmara Municipal da ... deveria ter adoptado para a sua formação, nos termos da al. b) do nº 1 do art.º 20º do CCP, um concurso público ou um concurso limitado por prévia qualificação com publicidade internacional, cujo limiar comunitário é 193 000,00 €.


 
1. Jorge Andrade da Silva, Código dos Contratos Públicos, Comentado e Anotado, Almedina 2008, pág. 75
 
2. Bernardo Azevedo, Estudos de Contratação Pública - I Cedipre, Coimbra Editora - contratação in house: entre a liberdade de auto-organização administrativa e a liberdade de mercado, pág. 128
 
3. Obra citada na nota 2, pág. 126
 
4. Pedro Gonçalves, Regime Jurídico das Empresas Municipais, Almedina, pág.184
 
5. Obra citada na nota 4, pág. 182
 
6. Obra citada na nota 2, pág. 135


Apoio Jurídico ao PO Regional do Centro

(Elisabete Maria Viegas Frutuoso)

By |2023-10-23T14:58:06+00:0014/10/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Contratação in house: Câmara Municipal da … e …

Conceitos urbanísticos, edifícios em banda e geminados

A Câmara Municipal de ..., em seu ofício nº ..., de ..., solicita parecer jurídico sobre o caso que se segue.

Foi requerida a aprovação de alteração em obra de um projecto de arquitectura de uma Moradia Unifamiliar, Anexos e Muros de Vedação.

Pretende o órgão saber se das alterações propostas resulta uma construção em banda, como defendem os seus serviços técnicos, ou uma construção geminada, como sustentam a requerente, solicitando, ao mesmo tempo, uma orientação geral sobre a matéria.

A questão, para a Câmara Municipal, tem especial interesse para a verificação do cumprimento do artigo 29º do Regulamento do PDM, que estipula que,

Artº 29º

8 – A profundidade de construção em banda será no máximo de 15 metros. Para construções isoladas ou geminadas poderão admitir-se maiores profundidades desde que não sejam prejudicadas as construções adjacentes e seja cumprido o Regulamento Geral das Edificações Urbanas”.

Uma vez que o PDM, ou outro instrumento de gestão territorial em vigor para a zona, não define o que sejam construções isoladas, geminadas e em banda, teremos de buscar no D.R. 9/2009, de 29.5, a definição dos conceitos.

No diploma, encontramos a definição dessas tipologias para as moradias, na sua Ficha 432, com a seguinte caracterização:

Geminadas, quando os edifícios se agrupam dois a dois, justapondo-se através da empena;

Em banda, quando os edifícios se agrupam em conjunto de três ou mais edifícios contíguos.

Empena, por sua vez, é “cada uma das fachadas laterais de um edifício, geralmente cega (sem janelas nem portas), através das quais o edifício pode encostar aos edifícios contíguos” (Ficha nº24)

Na Informação Técnica 41.2010/DOU, a Câmara Municipal dá exemplos do que entende por construção em banda. Um dos exemplos, aquele que precisamente é apresentado como correspondendo ao caso concreto, para além da representação gráfica – Exemplo 2 - tem a seguinte descrição:

2. Exemplo 2 – as edificações D e E definem a tipologia em banda ou geminada?
a) De acordo com as definições atrás mencionadas e informação técnica constante do processo de obras 77/08 (Doc 1 a 6) tem sido referido que se insere na tipologia de banda, apesar do contacto ser por telheiro e não pela empena do edifício principal, dado que, no terreno confinante C poderá ser edificada construção que encosta a edifício D e no terreno E existe construção que encosta ao edifício D (mas afasta ao terreno F), passando a constituir grupo de três ou mais edificações, enquadrando-se, portanto, no conceito de banda e não de geminada, razão pela qual, o edifício não poderá ter mais de 15m de profundidade (conforme consta no exemplo), de acordo com o Regulamento do PDM e RMEU;

A parte por nós sublinhada delimita de forma mais precisa a questão que se pretende ver respondida. Isto é, saber-se se a parede de um anexo, ou simples telheiro, pode ser contabilizado para o efeito.

 


Teremos, em primeiro lugar, de definir o que se entende por moradia, para efeitos da norma.

Ora, moradia, de acordo com a Ficha 32, é como se designa o fogo quando este “ocupa a totalidade do edifício, a qual adopta ainda a designação de isolada quando o edifício está completamente separado de qualquer outro edifício com excepção dos seus edifícios anexos”, sabendo-se igualmente que fogo, de acordo com a mesma ficha, e no que interessa para a situação concreta, é “a totalidade do edifício, dotada de acesso independente, constituída por um ou mais compartimentos destinados a habitação e por espaços privativos complementares”.

Anexo, ou Edifício Anexo, por seu lado, de acordo com a Ficha 22, é “o edifício destinado a um uso complementar e dependente do edifício principal”. Em nota complementar diz-se que “um edifício anexo assegura usos complementares necessários à utilização do edifício principal (por exemplo, garagem, arrecadação, etc.). O edifício anexo não tem, pois, autonomia desligada do edifício principal.”

Devemos assim concluir, da conjugação destes conceitos, que dos tais “espaços privativos complementares” que integram “a totalidade do edifício”, fazem parte os edifícios anexos, quando existam. Este entendimento é reforçado pelo facto de os anexos, como é dito na Ficha 22, não terem autonomia desligada do edifício principal. Dito de outra forma, anexos e edifício principal, constituem um conjunto edificado1.

Sendo os anexos parte da totalidade do edifício - ou seja, no caso que nos é apresentado, da moradia – quando as suas paredes laterais (quando as tenham, o que, nomeadamente no caso de simples telheiros, nem sempre acontece), ou seja, as suas empenas, encostem, de um lado, ao edifício principal, e do outro, a outra moradia, temos “moradias geminadas”. Essencial é que se preencha o outro factor que conduz a uma geminação de construções, que é existir uma continuidade edificada, sem interrupções, portanto.

Se, para além dessas, houver uma outra moradia que encoste a outra parede lateral de um desses edifícios, formando um conjunto de, pelo menos, três edifícios, temos moradias em banda.

Concluindo, se do projecto agora em causa resultar construção em banda, nos termos atrás expostos, deve ser cumprida a profundidade máxima de 15 metros imposta no nº8 do artigo 29º do Regulamento do PDM.


  
1. De acordo com a definição do Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2ª edição revista e ampliada – Editora Nova Fronteira, citada no “Projecto de Vocabulário do Ordenamento do Território, Versão de Setembro de 2004, Anexo é “prédio que, num conjunto edificado, é dependente de outro, principal, ou que o complementa”


Divisão de Apoio Jurídico

(António Ramos)

 

By |2023-10-23T14:58:59+00:0007/10/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Conceitos urbanísticos, edifícios em banda e geminados

Pé-direito, pé-direito mínimo, falsas declarações,

A Câmara Municipal de ..., em ofício com refª ..., de ..., solicita parecer jurídico que esclareça a questão que se segue.

Em 2008, foi emitida licença de construção para “adaptação de um estabelecimento comercial a estabelecimento de bebidas”.

No projecto aprovado o pé direito do estabelecimento é de 3,00 m., em cumprimento do nº3 do artigo 65º do RGEU.

Posteriormente, já após a emissão da licença de utilização para o estabelecimento, e na sequência de reclamação, verificou-se que o pé direito efectivamente construído era de 2, 50 m., inferior ao que tinha sido aprovado e contrariando a declaração do técnico responsável pela direcção técnica da obra.

Pergunta a Câmara Municipal, e citamos: “qual o enquadramento jurídico a dar e qual o procedimento a adoptar para reposição da legalidade, tendo em atenção que não é tecnicamente viável uma solução que possibilite a legalização dos trabalhos efectuados”
.

Sobre o assunto, julgamos útil, antes de mais, transcrever o seguinte entendimento sobre os números 3 e 4 do artigo 63º, exposto no Parecer DAJ 226/07, que aborda o “pé direito mínimo para estabelecimentos comerciais”

“(…)
Note-se que estas disposições se inserem no título III do RGEU que tem como epígrafe “ Condições especiais relativas à salubridade das edificações e dos terrenos de construção”. Ora, também com o objectivo de garantir a saúde dos trabalhadores, o DL 243/86, de 20 de Agosto, que aprovou o Regulamento Geral de Higiene e Segurança do Trabalho nos Estabelecimentos Comerciais, de Escritórios e Serviços, determina, na alínea c) do n.º2 do seu artigo 4.º que “O pé direito dos locais de trabalho não deve ser inferior a 3 m, admitindo-se, nos edifícios adaptados, uma tolerância até 2,70 m”.

Assim, tendo em conta que os interesses a prosseguir por ambos os regulamentos gerais não deixa de ser o da salubridade das edificações por forma a garantir a saúde de quem neles permanece, entendemos que por força do princípio da unidade do sistema jurídico (que não permite normas contraditórias) a interpretação mais defensável é a de que o pé-direito mínimo previsto no RGEU, é aplicável nas novas construções ou reconstruções (veja-se o exemplo dos artigos 53.º e 58.º), ou em profundas remodelações do edificado que envolvam a alteração deste elemento estrutural do edifício. Já nos casos de adaptação de edifícios pré-existentes, e até por força do próprio princípio da proporcionalidade, entendemos que essa dimensão poderá descer, no máximo, aos 2,70 m por ter sido considerado valor suficiente para garantir a saúde dos trabalhadores, que são quem mais tempo permanece no edificado. “

É assim nosso entendimento que no presente caso, igual àquele que era objecto do parecer atrás citado, poderá o pé direito da construção ser de 2,70 m. e não de 3,00 m.

Concluindo, e respondendo à questão directamente colocada, deverá a Câmara Municipal recorrer às medidas de tutela da legalidade urbanística previstas no RJUE, concretamente ordenando os necessários trabalhos de correcção ou alteração, nos termos do nº3 do artigo 105º, tendo já como referência, no entanto – em nome do mesmo Princípio da proporcionalidade  referido no parecer citado - o pé direito de 2,70 m., e não os 3,00 m. constantes do projecto aprovado.


Divisão de Apoio Jurídico

(António Ramos)

By |2023-10-23T14:59:39+00:0027/09/2010|Pareceres Jurídicos até 2017|Comentários fechados em Pé-direito, pé-direito mínimo, falsas declarações,

Title

Go to Top